Pilriteiro. Foto: DR

Na casa que herdei, encostado à parede do lado direito, havia um pilriteiro no qual os pássaros cantavam a alta voz, como os tenores na ópera, pois sentiam-se seguros só a preocuparem-se nos dias de férias.

O pilriteiro deve ter desaparecido, pois desde o pináculo da pandemia estava entregue aos cuidados de uma parente que, todos os anos, tem a gentileza de me oferecer e enviar uma prova do seu excelente fumeiro.

Agora que a «bolchevique» ministra da habitação ameaça ocupar casas que no seu entender são devolutas, vou ter o pretexto de voltar a onde fui feliz, como escreveu Italo Calvino, vou abrir a torneira com o fito de tentar restituir seiva ao arbusto espinhoso, não me esquecendo de acender a luz eléctrica, preenchendo a exigência da senhora Mariana que não Soror, sim forçuda arrendatária dos imóveis alheios.

As folhas dos pilriteiros em tisanas acalmam os nervos, beneficiam o coração, já os seus botões florais empregam-se para fazer geleias e doces acídulos.

Caro leitor: se quiser amenizar os receios relativos ao dito pacote habitacional, leia a poesia do ora esquecido poeta Fausto José onde encontra felizes referências a pilriteiros e passarinhos a chilrearem.

Armando Fernandes

Armando Fernandes é um gastrónomo dedicado, estudioso das raízes culturais do que chega à nossa mesa. Já publicou vários livros sobre o tema e o seu "À Mesa em Mação", editado em 2014, ganhou o Prémio Internacional de Literatura Gastronómica ("Prix de la Littérature Gastronomique"), atribuído em Paris.
Escreve no mediotejo.net aos domingos

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *