Foi a 16 de março de 2020 que um teste ao “novo coronavírus” deu pela primeira vez positivo no Médio Tejo. Sandra foi a “paciente zero” nesta região com 250 mil habitantes, e esses dias em que se sentiu “uma verdadeira E.T.”, como revelou em entrevista ao mediotejo.net, podem hoje parecer-nos longínquos mas permanecem bem presentes na memória de quem os viveu. Depois do seu caso, seguiram-se mais 65 mil. E a contagem não parou, apesar de os números da pandemia já não monopolizarem os noticiários. Só esta semana registaram-se quase 3.000 novas infeções e morreram, em média, três pessoas por dia nos concelhos do Médio Tejo.
Os números por vezes dizem-nos pouco, falam-nos numa língua fria e distante que depressa se torna monocórdica e cansativa. Depois de tantos meses de conferências de imprensa diárias e em direto nas televisões, e a consequente avalanche de notícias com a contabilização dos casos e a evolução da pandemia, penso que nenhum leitor terá dado um pulo na cadeira ao ler no parágrafo acima que foram registadas mais de 65 mil infeções na nossa região. Contudo, estamos a falar de quase um terço da população infetada – algo sem precedentes na história da saúde pública contemporânea.
Muitos milhares permanecem ainda com sequelas, sobretudo a nível respiratório e cardíaco, sendo ainda incertos os caminhos tortuosos a que a chamada “covid longa” poderá conduzir.
Entre estes 65 mil casos, 528 doentes acabaram por morrer. Sendo menos do que 1% do total, não poderá nunca dizer-se que é um número pequeno, nem este pode ser um número a que fiquemos indiferentes. Cada uma destas 528 pessoas tinha família, amigos e um futuro ainda por cumprir. E mesmo agora, com uma das taxas de vacinação mais elevadas do mundo, continuam a chorar-se vítimas da covid-19 todos os dias. No último mês morreram na região 58 doentes infetados com o SARS-CoV-2.
A nível nacional, nos últimos dois anos morreram 21 mil pessoas e, neste momento, há uma média de 33,3 mortes em 14 dias por cada milhão de habitantes – um valor superior ao limiar de 20 óbitos definido pelo Centro Europeu de Controlo de Doenças para que seja possível aliviar mais restrições, como o fim do uso de máscaras em locais fechados, por exemplo.

Em termos absolutos, Ourém foi o concelho mais afetado pela pandemia nestes últimos dois anos, com mais de 15 mil casos de covid-19 (um quarto do total da região) e o único que ultrapassou a fasquia de uma centena de óbitos. Mas concelhos mais pequenos, como Constância, Sardoal e Barquinha, viveram também momentos dramáticos, batendo por mais de uma vez recordes nacionais em percentagem da população infetada.
Na análise do mediotejo.net aos dados das últimas seis semanas, Sardoal tem o índice de incidência mais elevado, com 3.067 casos por cada 100 mil habitantes, seguindo-se Vila Nova da Barquinha (2.954) e Torres Novas (2.157).
Antes do surgimento da variante Ómicron, um concelho com mais de 240 casos por cada 100 mil habitantes teria um “risco elevado” de contágio. Acima de 480 casos, primeiro, e de 960 depois, chegaram a decretar-se confinamentos rigorosos e até cercas sanitárias. Atualmente, e apesar de ultrapassada há quase um mês a 5ª vaga da pandemia, iniciada antes do Natal, nenhum concelho está ainda abaixo dos 1.000 casos por cada 100 mil habitantes.
Além disso, a tendência de descida inverteu-se nas duas últimas semanas, verificando-se um aumento significativo de casos na região, em linha com o que está a acontecer a nível nacional e também noutros países europeus.
Em entrevista ao nosso jornal, a diretora da Unidade de Saúde Pública do Agrupamento de Centros de Saúde (ACES) do Médio Tejo, Maria dos Anjos Esperança, frisa que “o número de casos ainda é grande e o RT [índice de transmissão] ainda é elevado”, pelo que não podem ainda esquecer-se as regras básicas que aprendemos nos últimos dois anos: “A higienização de mãos e superfícies, o uso de máscara e a etiqueta respiratória, e o afastamento nalgumas situações, sobretudo em locais mais fechados.”
Se pelo gabinete da Saúde Pública passaram mais de 60 mil casos positivos de covid-19 – e ainda a vigilância ativa de milhares de contactos de pessoas infetadas e o controlo de surtos em lares de terceira idade, escolas, empresas e outras instituições –, em dois anos entraram nos Serviços de Urgência do Centro Hospitalar do Médio Tejo quase 3.000 doentes com covid-19.
Desde 16 de março de 2020, estiveram internadas 1.733 pessoas em enfermaria dedicada à covid-19 e foram admitidas 473 na unidade de Cuidados Intensivos. O serviço de Patologia Clínica fez também um esforço hercúleo, realizando mais de 250 mil testes de despistagem.
O combate à pandemia obrigou também a um significativo reforço de profissionais de saúde ao serviço do CHMT. Há atualmente mais 50 médicos face a 2020, 59 enfermeiros, 63 assistentes operacionais e 33 técnicos de diagnóstico e terapêutica.
O presidente do Conselho de Administração do CHMT, Casimiro Ramos, enalteceu nesta data simbólica os profissionais de saúde do CHMT, pela “coragem e determinação” com que enfrentaram esta pandemia. “Não vacilaram nunca e na maioria dos dias, ao longo destes dois anos, foram para lá do que era exigido pela profissão, com entrega e sacrifício.”

Casimiro Ramos considera que “os utentes do CHMT encontram hoje uma instituição mais resiliente e preparada para os desafios da saúde pública que teremos que enfrentar.” Lembrando também que “a pandemia não acabou” e mostrando “apreensão com os dados de novas infeções atuais”, entende que “o CHMT está preparado para continuar com uma robusta resposta aos doentes covid-19, intensificando, paralelamente, o esforço de recuperação da atividade não-covid em 2022.”

Na mesma linha, o diretor da Organização Mundial de Saúde frisou esta semana que a pandemia de covid-19, que já causou a morte a seis milhões de pessoas em todo mundo, “está ainda longe de acabar”. Lembrando as muitas assimetrias no acesso a cuidados de saúde a nível global, frisou que a ameaça desta doença “não acabará em nenhum lugar até que acabe em todos os lugares”.