A reconstrução do passadiço de Ortiga, integrado na Rota das Pesqueiras e Lagoas do Tejo, no concelho de Mação, foi mote para uma entrevista da arquitecta paisagista Elsa Severino ao jornal O Mirante, em que fez duras acusações à Câmara Municipal, nomeadamente de se apropriar de um antigo projeto seu. Vasco Estrela refutou as acusações e diz que o que está escrito na entrevista “não corresponde à verdade”.
Elsa Severino, arquitecta paisagista com raízes familiares em Ortiga e atelier em Lisboa, terá desenvolvido há alguns anos um projeto que também incluía a construção de passadiços para a zona das Lagoas do Tejo, na margem ribeirinha da freguesia de Ortiga. Na sequência das intempéries de dezembro, que danificaram a maior parte da infraestrutura construída pelo Município poucos meses antes, a arquiteta diz que se reconstruírem os passadiços no mesmo sítio – e não no local que ela teria recomendado no seu estudo – “vai haver outro desastre”.
Também fez graves acusações perante o desenvolvimento do projeto, inaugurado em fevereiro de 2022, e que contou com apoio de fundos comunitários, através da CCDR Centro. “Estes políticos não percebem o que é o rio, o que é um caudal de uma margem viva. O estudo que havia, que aprovaram, não foi com a atual localização, não havia nenhum técnico que aprovasse a verba e eles obtiveram-na. Como é que a ministra que inaugurou a obra (Ana Abrunhosa), e a administração pública em geral, não questionaram que o que ali estava a ser feito não foi aquilo que foi aprovado? Não quis ir por aí, mas posso ir um dia”, disse, na entrevista.
E acrescentou ainda: “Se forem construir no mesmo sítio, terei de fazer uma denúncia ao Ministério da Coesão Social, à Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional e à Agência Portuguesa do Ambiente. Espero que me oiçam neste e noutros assuntos.”
A Ministra da Coesão Territorial, Ana Abrunhosa, não esteve presente na inauguração, ao contrário do que é referido pela arquiteta Elsa Severino, mas sim Isabel Damasceno, presidente da CCDR.

“Não é comigo, nem às minhas cavalitas, que vai ter projeção”, insurge-se Vasco Estrela, considerando que foi alvo de “um ataque velado” com aquela entrevista. “É uma ofensa a mim, ao meu caráter, aos políticos em geral e à população de Ortiga.”
O projeto cumprido e inaugurado em 2022 pelo Município de Mação não era o de Elsa Severino mas sim da autoria do gabinete MODO Associados – Arquitectura e Engenharia, com sede em Sardoal, conforme confirmou Vasco Estrela em sede de Assembleia Municipal no dia 27 de abril, e após ter sido confrontado com um excerto da entrevista da arquitecta.
O autarca disse ter ficado “muito surpreendido com a entrevista e o tom da mesma”, afirmando que aquela parte da entrevista “tem um conjunto de erros e mentiras”.
Perante as acusações, o presidente de Câmara não poupou a arquitecta, referindo que “nunca fez algo pelo concelho para merecer este destaque” e que estará a tentar “fazer papel de benemérita”, ao dizer que ofereceu os trabalhos que fez ao município.
“A única coisa que fez de borla foram estudos prévios”, disse Vasco Estrela, notando o ganho de vários milhares de euros em serviços prestados à autarquia, e referindo que o que é dito pela arquitecta quanto a este tema dos passadiços de Ortiga “não corresponde à verdade”.
Quanto à acusação da arquitecta, de se terem apropriado do seu antigo projeto, Vasco Estrela frisa que não aconteceu mas que, no que era proposto por Elsa Severino, “os passadiços estavam dentro do rio e outros estavam na mesma localização” dos inaugurados, e não noutros locais “mais seguros”, como agora a arquiteta veio afirmar.

O presidente de Câmara recorda que a idealização do projeto dos passadiços remonta a 2014, e admite que Elsa Severino fez “os primeiros projetos”, um deles datado de 2017, e que tinha projetado a inserção de passadiços dentro do rio. Também falou numa reformulação do projeto, com novo estudo prévio em 2018, “onde mete grande parte dos passadiços junto à linha de comboio, mas depois coloca outro tipo de passadiços, precisamente no local onde estavam”.
“E é esta senhora que vem dizer que se fizermos os passadiços no mesmo sítio vai por água abaixo e será um novo desastre… Mente, e tem desconhecimento das coisas”, referiu o autarca, mencionando ter existido um projeto de engenharia.
Perante a acusação de ter sido o projeto de Elsa Severino a ser aprovado junto da CCDR Centro, Vasco Estrela diz que “é falso”. Por outro lado, disse ter levado o projeto da MODO Associados, responsável pela sua elaboração, junto da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), em 2020, tendo sido validado pela APA e pela CCDR Centro com pareceres favoráveis.
Vasco Estrela deixou ainda indicação para o facto de recentemente ter estado com a arquitecta em causa, e de trocarem mensagens, situação que contradiz a versão da própria, em como estariam há vários anos de relações cortadas.
“A partir de agora é que as relações pessoais estão objetivamente cortadas”, afirmou o edil, disponibilizando o seu telemóvel para que os deputados municipais pudessem conferir as mensagens enviadas por Elsa Severino em anos recentes.

O tema deixou o presidente de Junta de Freguesia de Ortiga muito perturbado e desconfortável, tendo confirmado em intervenção na sessão que lhe “custou bastante” ler a entrevista, que assenta numa “mentira”, como frisou. “É uma autêntica calamidade aquilo que a senhora ali diz.”
Rui Dias (PS) apresentou toda a sua “disponibilidade para testemunhar” a favor da Câmara Municipal, “seja no tribunal, seja nos meios de comunicação” e disse que levaria o assunto à Assembleia de Freguesia de Ortiga, para esclarecer a situação junto da comunidade.
A posição do presidente de junta eleito pelo Partido Socialista mereceu reconhecimento pelo deputado José António Almeida (PSD), que aplaudiu a disponibilidade e retidão de Rui Dias perante este cenário.
Da bancada socialista, e tendo já sido presidente da direção da Liga Regional de Melhoramentos de Ortiga vários anos, a deputada Cláudia Cordeiro (PS), também de Ortiga, manifestou igualmente o seu apoio a Vasco Estrela sobre as “acusações graves” feitas na entrevista e demonstrou a sua disponibilidade para o que seja necessário no sentido de repor a verdade. O presidente de Câmara disse esperar também ter oportunidade de contar a sua versão dos factos ao jornal responsável pela publicação.
Recorde-se que Vasco Estrela disse recentemente, em entrevista ao mediotejo.net, que a autarquia irá contratar uma empresa para a remoção e recolha das partes do passadiço que ficaram depositadas ao longo da margem do Tejo e perceber o que pode ser reaproveitado.

Ainda se desconhece quando renascerá a estrutura, mas a rota pedestre continua a poder ser feita por um caminho a pé, e em segurança.
Além de uma candidatura ao Fundo de Emergência Municipal, o município pretende repensar a localização do passadiço e a passagem da Rota das Pesqueiras e Lagoas do Tejo, aprendendo a “lição” que a natureza deu em dezembro do ano passado, altura em que a cheia no Tejo e intempéries danificaram a maior parte da infraestrutura, que representou um investimento de 300 mil euros, financiado a 85% por fundos comunitários.
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