Mostra gastronómica exalta saberes e sabores do peixe do rio em Vila Nova da Barquinha. Foto: mediotejo.net

Rui Ferreira é pintor de profissão mas desde os 18 anos que pesca e conhece o rio como a palma das suas mãos. Todos os anos aproveita a fase da desova para lançar as redes ao Tejo. Com 35 anos de experiência, diz que o rio já foi mais generoso.

Lampreia pouca ou nenhuma e mesmo o sável ainda pouco apareceu no rio, tendo expectativas que o peixe arribe até ao final de abril. O pescador confessa que muito do sável que se comercializa na região vem da Barragem do Alqueva, onde esta espécie existe em largo número.

Rui Ferreira é pescador há 35 anos. Foto: mediotejo.net

Já quanto à pesca da lampreia, Rui diz que esta espécie está a acabar, podendo mesmo um dia chegar à extinção. “Cada vez é menos. Já cheguei a apanhar 80 lampreias, até as 4 da manhã, e vendi-a a cinco euros. Agora ainda só apanhei 7 lampreias desde janeiro”, nota o pescador.

A venda, essa, está “louca”, diz o pescador. Atualmente, devido à escassez da lampreia e à muita procura, está a vender a unidade a cerca dos 100 euros, a uma média de 50 euros por kg. Mas, mesmo assim, a procura é cada maior.

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Fernando Freire, Presidente da Câmara Municipal da Barquinha, confirma que após 29 anos a promover o Festival do Peixe do Rio e após questionar os pescadores do concelho, foi decidido que a lampreia não faria parte do cartaz, porque quando existe são situações muito pontuais, sendo a maior parte importada, não podendo assegurar a sua venda no prato.

Para o autarca, estes sabores ribeirinhos e a mostra gastronómica associada são iniciativas de caráter único que alimentam a tradição, apoiam a restauração e ajudam a promover e a criar riqueza no território.

Fernando Freire, presidente da Câmara de Vila Nova da Barquinha. Foto: mediotejo.net

Este tipo de eventos traz muita população ao concelho, de vários sítios dos país, reforçando não só a restauração mas também as visitas culturais no concelho, desde o parque ribeirinho, a exposições ou ao Castelo de Almourol.

Após a refeição, as pessoas que procuram os restaurantes aderentes para provar a iguaria, têm direito a um vale de visita ao Castelo de Almourol ou ao CITA – Centro de Interpretação Templário de Almourol.

Sável frito com açorda é uma das especialidades dos restaurantes ribeirinhos. Foto: mediotejo.net

Fomos em busca de um restaurante no concelho que integrasse o evento e nos explicasse todo o processo de preparação e confeção do sável e da lampreia. O restaurante Almourol, com vista para o Rio Tejo, é quase tão antigo quanto esta iniciativa.

“Nós aprendemos a fazer aqui em Tancos, com uma cozinheira de Tancos, faz já 31 anos, e sempre da mesma forma. Mas cada um tem a sua forma de preparação e confeção”, disse ao nosso jornal José Ferreira, proprietário e gerente daquele espaço de restauração.

O sável é servido habitualmente frito com açorda das ovas do próprio peixe a acompanhar, enquanto a lampreia é feita à bordalesa ou de cabidela, com o sangue do ciclóstomo, sendo o arroz servido à parte.

Rui Ferreira assegura que o peixe seja levado diretamente do rio para o restaurante, mantendo a frescura do pescado. Foto: mediotejo.net

O restaurante disponibiliza ainda na sua ementa a lampreia no forno de lenha, com batata assada e legumes. O empresário realçou dois aspetos essenciais para a preparação dos pratos: o alho porro, ou seja, o alho bravo “do monte” apanhado ali mesmo por eles em Tancos, e o amanhar do peixe, sendo que, se este processo for mal feito, poderá estragar por completo todo o prato.

“O sável é um peixe que recebemos fresco e a lampreia vem viva”, sublinha José Ferreira. Esta variedade de pratos apenas é comercializada nesta altura do ano, que coincide com a época da desova das espécies.

“O peixe está normalmente 7 a 8 anos no mar, portanto o ciclo dele é normal – nasce no rio, vai para o mar, volta depois passados  7 a 8 anos ao rio para desovar. E é nessa altura que é capturado, entre janeiro e abril”.

Lado a lado com o Tejo, o Restaurante Almourol, em Tancos, tem no peixe do rio algumas das suas especialidades. Foto: mediotejo.net

O preço, tanto do sável como da lampreia, varia consoante a oferta e a procura do produto. É a lei do mercado. Contudo, o sável este ano está entre os 12 e os 18 euros a dose, variando do momento e do preço do produto a que é fornecido aos restaurantes. Neste momento a lampreia está muito escassa e os preços subiram muito.

José Ferreira conta que lhe “tentaram vender uma lampreia por 110 euros” e que “esta é uma forma de empolgar demasiado o valor do peixe, de forma desmesurada e desonestamente”, sublinha.

O sável e a lampreia, duas das iguarias ribeirinhas muito apreciadas nesta época do ano. Foto: mediotejo.net

A procura este ano, no decorrer deste festival gastronómico, foi igual ou superior a anos anteriores, afirmou, tendo feito notar que, “quando há escassez, há ainda mais tendência a existir procura”. E os preços sobem. A lampreia que se pode degustar no Almourol, mesmo que ainda seja pouca, vem de vários locais, desde o Tejo, ao Mondego, e também do exterior, especialmente de França.

O melhor mesmo é reservar mesa antecipadamente e solicitar informação sobre a disponibilidade da lampreia na ementa e o preço ao momento. Geralmente haverá, mas depende do número de comensais, sendo os preços flutuantes, embora as expectativas sejam de manutenção por cima devido à escassez.

Apesar da escassez da lampreia, cumpriu-se até domingo, 19 de março, o mês do sável em Vila Nova da Barquinha, sendo que, até à Páscoa, será possível saborear as receitas destas espécies ribeirinhas nos restaurantes locais e encontrar pescadores a lançar as redes ao rio, numa tradição que se cumpre, ano após ano.

Uma fataça nas mãos do pescador Rui Ferreira.

Diana Serra Garcia

Natural de Vila Nova da Barquinha, tem 25 anos e licenciou-se em Ciências da Comunicação pela Universidade da Beira Interior.

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