Este domingo foi especial, e o tempo até abriu para receber a passagem do Cruzeiro Religioso e Cultural do Tejo, que desceu o rio até à região, entrando de manhã em Gavião, na praia fluvial do Alamal, passando por Ortiga – e ultrapassando a Barragem de Belver – enquanto a tarde se fez com pequenas paragens em Alvega, Mouriscas e Pego, até desembarcar no Aquapolis, na margem sul, em Rossio ao Sul do Tejo.
O fervor religioso foi sendo vincado à passagem em cada comunidade ribeirinha do concelho de Abrantes com a devoção a Nossa Senhora dos Avieiros a reverter-se em jeito de oração e cântico.
Dois anos depois da suspensão causada pela pandemia, voltou a padroeira do Tejo e dos avieiros, os “ciganos do rio”, a navegar numa embarcação típica engalanada, num cruzeiro que se faz por estes dias, principalmente, pela saúde e pela paz no mundo.
Este ano, o tempo de paragem em cada ‘porto’ local foi menor, mas ainda assim não se deixou de trazer a santa até à zona ribeirinha de cada terra, permitindo aos populares demonstrarem o seu afeto e respeito pela divindade.
Em cada local foi sendo acolhida a Senhora dos Avieiros com um momento solene e celebração religiosa, onde entoaram os cânticos e em todos os lugares se rezou a oração a si destinada.

Esta etapa, cuja jornada fluvial terminou em Rossio ao Sul do Tejo, contou com o desembarque no Aquapolis Sul, onde a azáfama de uma tarde de domingo passada entre familiares e amigos se fazia notar, especialmente na esplanada debaixo da tenda-referência da zona ribeirinha a sul.
Aguardava-se com ansiedade a chegada do cruzeiro, prevista para as 18h00, e os olhos iam sendo postos fixamente no rio, avistando até à curva do Taínho, em Alferrarede, após a ponte ferroviária. O vento soprava agradável, a temperar a sensação quente do final de tarde solarengo, e as crianças iam aproveitando o parque infantil e o relvado para saltitar e correr. Os adultos iam pondo a conversa em dia.
Até que alguém exclama, cerca de meia hora depois da estimativa de chegada, “Aí vem ela, lá ao fundo! Já se vê!”. E as pessoas vão-se alinhando junto à margem, para a aguardada chegada.

A receção faz-se inicialmente em silêncio e contemplação, e segue-se um período de palmas tímidas, enquanto os registos iam sendo feitos com recurso aos smartphones e câmaras fotográficas.
À chegada, iniciam-se os cânticos a acolher a padroeira, enquanto é feito o desembarque e esta é carregada em ombros, no andor, até à praça, junto ao coreto.
Aqui, uma modesta mas sentida celebração religiosa se inicia, após breves palavras da organização a contextualizar a iniciativa deste ano.
Em entrevista ao mediotejo.net, Rui Rodrigues, membro da Confraria Ibérica do Tejo que organiza como um dos seus principais eventos o Cruzeiro Religioso e Cultural do Tejo, falou sobre a expetativa relativamente a esta edição, após dois anos em suspenso.
Com raízes em Constância, reconhece a importância dos rios para a comunidade e a ligação a Nossa Senhora dos Avieiros pela relação íntima às lides da pesca que deram sustento a várias famílias a partir do rio ao longo de décadas.

“Marca o retomar do contacto entre as comunidades, o retomar das atividades da Confraria Ibérica do Tejo e o retomar do nosso grande projeto, o Cruzeiro Religioso e Cultural do Tejo, com objetivo de interligação entre as diversas comunidades ribeirinhas, entre os diversos ‘Tejos’ ao longo de todo o rio Tejo, e retomar as ligações entre as diferentes populações, especialmente mais a norte, que estão mais isoladas e para quem o cruzeiro é um evento fundamental. Razão pela qual fizemos o evento este ano, um pouco à pressa, para corresponder ao pedido das comunidades para que voltasse este convívio”, explica.
Este é um “cruzeiro de fé e afetos pela saúde e pela paz”, relembrando Rui Rodrigues que ainda nos encontramos a lidar com uma situação de pandemia e que o mundo não pode ficar indiferente ao conflito com a Rússia e a guerra na Ucrânia, situações que merecem particular atenção por parte dos crentes, que pedem auxílio divino para pôr cobro a estas provações.
Entre as preces surge ainda a preocupação com a seca extrema e a falta de água, pedindo-se a intercessão da padroeira para manter o rio Tejo e seus afluentes vivos e saudáveis.
Apesar de não se notar na travessia fluvial a mesma adesão de outros anos, verifica-se a vontade da população em cumprir a tradição e honrar os antepassados, fazendo jus à identidade que se cruza intimamente com o rio Tejo.
O tempo médio de paragem em cada concelho também não está a ser o mesmo de outros anos, e a organização tem noção disso, porém não foi possível garantir uma organização como em edições anteriores, confessando Rui Rodrigues existir algum lamento por parte de eleitos locais e comunidade em geral pelo pouco tempo de permanência.

Mas há já compromisso de começar a pensar na próxima edição, garantindo uma organização grandiosa e que volte a mover multidões e a permitir a organização de cerimónias solenes, missas campais e receções mais demoradas no desembarque em cada ‘porto’.
A Nossa Senhora dos Avieiros, finda a pequena adoração e cerimónia religiosa em seu louvor, seguiu numa carrinha 4×4 até Rio de Moinhos, onde permanecerá até dia 10 de junho, feriado, na igreja. Os barcos ficam recolhidos nos estaleiros municipais de Abrantes até entrarem novamente no Tejo, transpondo assim outra barreira à navegação fluvial, o açude.
Arrancará na sexta-feira uma nova etapa que começará no Tramagal, às 14h00, seguindo ás 14h45 de barco em direção a Rio de Moinhos. Será o único troço de sexta-feira por rio, seguindo a peregrinação por carro, devido à pouca água no rio, até Praia do Ribatejo, onde pernoitará. No dia seguinte, sábado, o cruzeiro volta ao rio, fazendo o percurso fluvial com destino a Vila Nova da Barquinha. De Barquinha até Alpiarça será feito novamente por terra. Do Patacão em frente já deverá haver condições para seguir por água.

A 3ª etapa arranca dia 10 de junho, sexta-feira e feriado, de Tramagal, onde a imagem chega por volta das 14h00, prevendo-se depois partir do Porto da Barca para Rio de Moinhos às 14h45, onde deverá atracar cerca das 15h30 e chegar à Igreja de Amoreira às 16h00. Os troços fluviais até Amoreira, Constância e Praia do Ribatejo foram cancelados devido ao baixo caudal do rio e serão feitos por terra.
Depois da pernoita, arranca a 4ª etapa no sábado, dia 11 de junho, pelas 9h00, a partir da Praia do Ribatejo, seguindo para Tancos (9h45), Arripiado (10h00), Vila Nova da Barquinha (11h30), Pinheiro Grande (12h45), Porto das Mulheres/Chamusca (14h15), Azinhaga/Golegã (15h45) e saindo da região em direção à sede de distrito, chegando a Alpiarça/Patacão pelas 18h00 para avançar para a 5ª etapa.
NOTÍCIA RELACIONADA