Peixe escalado. Foto: DR

Na quinta-feira, dia 25 de novembro, fui almoçar a um restaurante onde o peixe é fresco, filho das águas do Atlântico e livre das rações de engorda forçada desses mesmos habitantes, crustáceos e moluscos. Escolhi amêijoas e uma dourada nédia para duas pessoas.

Sobre a mesa foi colocado um pratinho contendo pequenas e finas extremidades de polvo matizadas com cebola picada, mais discreta alhada aspergida com gotas de vinagre. Cousa inocente!

As amêijoas, valeram pelo molho, pois a maioria delas estavam mirradas ou ressequidas.

A dourada apareceu esventrada ou seja: aberta ao meio rente à coluna dorsal. Olhei, a minha mulher pronunciou a senha da minha sanha contra este método de cozinhar o peixe.

Escalar o peixe é retirar-lhe substância, sapidez, suculência dada a acção do fogo estilo boca-a-boca lhe diminuir as qualidades e virtudes no que ao gosto diz respeito. A fúria suscitada pelo atropelo pacóvio de ofender a integridade do peixe obrigou-me a bufá-la para dentro pois não avisei o homem da grelha como costumo fazer, contudo no final da malfadada refeição não deixei de o fazer.

Os profissionais da grelha gostam de escalar peixes e crustáceos, é mais rápido, para eles é mais seguro, para o gourmet, pura e simplesmente não passa de grosseira ignorância aleivosa da arte de bem comer a todo o custo sem custos atentatórios do bom paladar. Na Terra, no Céu, no Limbo, no Purgatório, nas profundezas do Inferno!

Armando Fernandes é um gastrónomo dedicado, estudioso das raízes culturais do que chega à nossa mesa. Já publicou vários livros sobre o tema e o seu "À Mesa em Mação", editado em 2014, ganhou o Prémio Internacional de Literatura Gastronómica ("Prix de la Littérature Gastronomique"), atribuído em Paris.
Escreve no mediotejo.net aos domingos

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *