Sob o lema “Repara, cuida e partilha”, decorre de 5 a 17 de outubro a 11ª edição do Festival de Materiais Diversos, a ter lugar em Alcanena, Minde e no Cartaxo. Afirmando que entrou numa fase de “desaceleração”, a organização deu a conhecer esta terça-feira, 24 de agosto, um programa com maior foco em iniciativas de debate, assim como uma maior proximidade ao público local.
De 5 a 17 de Outubro, Cartaxo, Minde e Alcanena recebem 26 atividades e cerca 50 artistas e participantes: 12 conversas, sete espetáculos nacionais e dois internacionais, quatro em estreia e um em antestreia. Conforme destacou a diretora artística da Materiais Diversos, Elisabete Paiva, o grande foco vira-se para as Conversas, a grande novidade desta edição. “Sentimos há algum tempo a vontade de reformular o nosso trabalho”, admitiu, frisando a importância de uma aproximação ao cidadão comum.
Sem nunca desistir da dimensão internacional e experimental, o Festival aposta assim num modelo de “desaceleração” em relação às edições anteriores, em consonância também com o atual contexto pandémico. “Repara, cuida e partilha” é assim o lema deste ano, querendo-se continuar a defender da pluralidade e distinção das produções. “O programa dialoga e procura encontrar-se com estes lugares”, afirmou a responsável.
Questionada sobre o financiamento do Festival, Elisabete Paiva referiu que os principais patrocinadores continuam a ser a Direção Geral das Artes, apoios europeus, assim como dos municípios de Alcanena e do Cartaxo, para além de outros pequenos apoios que não se traduzem em dinheiro mas equipamentos.

“Já estive mais zangada com o poder local”, refletiu, referindo ser necessária humildade e diálogo. “Há muito caminho a fazer”, comentou, lembrando que atualmente também há muitos mais festivais do que no tempo em que a Materiais Diversos começou.
ÁUDIO | ELISABETE PAIVA, DIRETORA ARTÍSTICA DO MATERIAIS DIVERSOS:
A programação conta assim com um ciclo de 12 conversas como forma de interpelar e tornar visíveis assuntos presentes no programa da Materiais Diversos dos últimos dois anos. O festival começa no dia 5 de outubro com Que paisagens pode um festival criar?, para discutir o desenvolvimento deste festival e de outras atividades fora dos grandes centros urbanos. A conversa surge do livro “Paisagens Imprevistas – Outros lugares para as artes performativas” e conta com a participação de Tiago Bartolomeu Costa e Cátia Terrinca.
Na conversa Na Prática: que escola é esta?, dia 8 de outubro, lança-se o website da escola e partilha-se reflexões sobre as premissas deste projeto co-organizado com o CET — Centro de Estudos de Teatro, com Elisabete Paiva, Rui Pina Coelho e Vânia Rovisco.
Como comunicamos quando queremos falar de cultura?, dia 9 de outubro, é a pergunta lançada por um grupo de profissionais de comunicação cultural que propõe discutir as formas de disseminar as atividades culturais. A sessão é inspirada na Long Table, da artista Lois Weaver, pelo que quaisquer pessoas interessadas são convidadas a sentarem-se para partilhar as suas ideias. Este modelo será alargado às várias sessões de conversa, procurando incentivar a participação sem hierarquias.
As inquietações, os medos, as vontades e os sonhos para um futuro melhor, as questões ecológicas e as responsabilidades da humanidade são o mote para três conversas com a participação de jovens de diferentes contextos: Que futuros tenho eu aqui? (dia 6), E depois do Paraíso? (dia 10) e Outra cidadania é possível? (dia 15).
No que toca aos espetáculos, Marcelo Evelin foi convidado a criar um objeto artístico de raíz – Filme –, em colaboração com Fernanda Silva e Danilo Carvalho. Filme é uma aventura imagética e sonora, a partir da figura emblemática da onça-pintada: um mamífero em extinção que vive nas matas brasileiras, animal selvagem de força e beleza exuberantes, um mito que incorpora os xamãs nos seus rituais de cura, central nas cosmologias Ameríndias. Segue, neste âmbito, a conversa Que povo é esse? (dia 5).
Ruído Rosa, espetáculo de dança que sobe a palco dia 9 no Cartaxo, é a nova criação de Alina Ruiz Folini. Investiga a partir da prática da escuta, com o desejo de desierarquizar a relação entre ver, dizer e escutar. Propõe uma experiência corporal de tensão entre pólos não opostos, onde os sentidos não são binários, para observar as várias formas de colaboração, dissociação e ressonância entre oralidade, som e movimento. A peça questiona a escuta, não só do som, mas também das sensibilidades lésbicas e queer, como preocupação com outras formas de pesquisa e criação que questionam as metodologias normativas de criação.
Outra novidade desta edição é a iniciativa Caminhantes, a decorrer dias 14 e 15. Trata-se de uma jornada em espaço aberto que mobiliza um grupo de pessoas convidadas das áreas da criação, da programação e da produção, para uma experiência imersiva. A caminhada é um projeto da artista chilena Carolina Cifras, investigadora, criadora e docente e conta com a colaboração de Ana Trincão. Traz-nos um laboratório experimental e reflexivo que procura, a partir de uma experiência em torno da arte de caminhar em contacto com a natureza, gerar novas formas de consciência e de relação, e serve de preâmbulo à conversa Seguiremos juntos por novos caminhos?, dia 16 no Centro de Ciência Viva do Alviela.
Entre as estreias está ainda Bruno Caracol com Subterrâneo, dia 15, uma instalação que parte do conto Fragment d’histoire future, de Gabriel Tarde, que contrasta com a história da espeleologia e bio-espeleologia da Serra d’Aire.

É no parque, junto ao Centro de Convívio do Cartaxo, de 5 a 10 de outubro, que a ação Paraíso Bruto procura outras formas possíveis de o habitar. Já Palmira é uma peça de teatro com música ao vivo, dias 8 e 9, de Anabela Almeida e Sara Duarte, onde duas mulheres questionam o que é ser homem e ser mulher – um tema complexo e basilar na constituição do que é ser humano. Terá a sua estreia na Galeria José Tagarro, no Cartaxo.
O Estado do Mundo (Quando Acordas), dia 8, é um criação de Inês Barahona e Miguel Fragata, da companhia Formiga Atómica, e é o primeiro espetáculo de um díptico que se destina a pensar o estado natural, político, geográfico, social, histórico, económico e humano do mundo.

O FMD encerra dia 17 de outubro com um “Piquenique Comunitário”, em Minde, com um convite a todos os que participam a levarem “algo para partilhar”, seguido do concerto de Surma, às 18:30, no Coreto de Minde.