Foto: Pixabay

O tema começou por ser debatido com alertas e preocupações deixadas pelos deputados no período antes da ordem do dia, situação que vem sendo recorrente, lembrando os problemas que continuam a afetar as populações das freguesias rurais que continuam sem médico de família e com atendimento deficitário nos seus polos de saúde.

Luís Lourenço, deputado da CDU, alertou para o agravamento da situação na extensão de saúde de Mouriscas, numa situação inédita e que deixou a população na mão, tendo sido apanhada de surpresa pela ausência repentina da médica que assegurava o atendimento após a aposentação do clínico que ali estava alocado.

“O médico aposentou-se, havia uma médica que pontualmente ia dar consultas, mas fui informado que as pessoas na passada semana estavam à espera da consulta que tinham marcado, e a médica não apareceu nem os funcionários sabiam que se passava”, começou por contar.

Luís Lourenço, deputado da CDU na AM Abrantes.

O deputado pediu explicações, reconhecendo que a situação não é fácil. “Sei que não é simples, que há falta de médicos, o problema não é novo, mas tendo eu formação na área da saúde e tendo aprendido que o diagnóstico precoce é muito importante… As pessoas necessitam de ter médico para que haja diagnóstico precoce”, afirmou.

Por outro lado, disse saber que o médico aposentado que exercia na freguesia de Mouriscas terá mostrado disponibilidade para continuar a atender os pacientes na pós-aposentação. “O Dr. Proa mostrou disponibilidade para, após aposentação, continuar a dar consultas durante algum tempo no centro de saúde”, referiu, perguntando sobre “démarches para que o médico pudesse dar consulta por mais algum tempo ou se ainda poderá ser equacionada essa proposta para que a população de Mouriscas não fique sem médico”.

Por seu turno, o deputado João Paulo Rosado (PSD), voltou a trazer para cima da mesa os problemas na extensão de saúde de Rio de Moinhos, também sem médico de família há muito tempo.

“Sabemos que está a ser estudada a hipótese de uma USF na zona Norte do concelho, estou a par disso e o presidente de junta tem estado envolvido. Mas fiquei há dias muito surpreendido. Desloquei-me lá, e sabendo que não temos médico, temos a secretaria dois dias por semana e o administrativo não tem sistema informático para trabalhar”, disse, mostrando-se perplexo e crendo que “estamos a voltar para trás”.

João Paulo Rosado, deputado do PSD na AM Abrantes

“Não tem acesso direto à base de dados da Unidade do centro de saúde; deve tomar nota e depois quando chega a Abrantes, é que dá andamento às situações. Gostava de saber porquê, deve haver alguma questão técnica, e, claramente, estão a pensar rever isso e repor o sistema informático?”, questionou.

Manuel Jorge Valamatos, presidente da Câmara de Abrantes, interveio sem respostas concretas para um tema complexo e que se vem agudizando nos últimos anos, com o acumular de aposentações de médicos e com a não entrada de novos médicos a concurso para o interior do país.

“Daquilo com que vivo mais angustiado verdadeiramente é esta história dos médicos de família, mas também gostava que compreendesse o seguinte. Na CIMT, o secretário executivo até pediu a todos os municípios que cada um entregasse estratégias e metodologias que tenham para fixar médicos. Abrantes tem um regulamento, o nosso não passa por pagar para que os médicos venham. O nosso regulamento passa por apoiar temporariamente os médicos da USF, até atingirem um nível mais elevado na fase de transição, como forma de captação de médicos jovens. Temos cerca de 12 médicos do norte e outros pontos do país, que vieram com esse apoio”, referiu.

Ainda assim, o autarca não deixa de recordar que a contratação de médicos e profissionais de saúde, apesar da transferência de competências, não é competência das autarquias mas sim das entidades de saúde.

Dando exemplo que na Escola Secundária Dr. Solano de Abreu falta um professor numa disciplina, o edil questionou se “também vai ser a autarquia a ir buscar um professor para colocar nesta escola? E quando faltar alguém na GNR, também é a autarquia que lá vai pôr operacionais? Onde está o Estado? E onde está cada um dos seus ministérios?”.

“Eu vivo angustiado com esta questão dos médicos de família, mas tem que haver equidade e princípios e moralidade. Não basta fazer sessões da democracia ou moralidade para termos moralidade verdadeiramente e sermos democratas verdadeiramente. A autarquia e a vereadora com o pelouro da Saúde, Raquel Olhicas, diariamente faz contactos telefónicos com a Direção Regional de Saúde, com o Ministério da Saúde, acho que é uma área muito pertinente e de grande responsabilidade”, notou o edil.

Por outro lado, dadas as circunstâncias, não deixou de lembrar que existem outros mecanismos aos quais as populações se podem socorrer. “Temos sempre as consultas de recurso. Nós não ficamos satisfeitos com o mal dos outros, mas no contexto do Médio Tejo, Abrantes é dos concelhos que mais população tem servida por médicos de família”, sublinhou,

Atualmente estão 10 mil pessoas sem médico de família no concelho de Abrantes. A autarquia pretende apostar na construção de uma nova Unidade de Saúde Familiar (USF). Foto: DR

Por outro lado, não deixou de assumir que a CM Abrantes foi “apanhada de surpresa” com a falta de médico na extensão de saúde de Mouriscas, com a deslocação de médico para o concelho de Sardoal.

Atualmente, disse, estão 10 mil pessoas sem médicos de família no concelho de Abrantes. Ainda assim, deu conta de uma situação que ali acontece, pois “existe um conjunto de médicos que está a fazer o seu trabalho, por exemplo no Carvalhal, e todas as pessoas que aquele médico observa e atende contam como não tendo médico de família porque esse médico não é da especialidade de Saúde Familiar, está contratado”, deu conta.

“Temos que melhorar, estar atentos. Não pode ser uma luta desenfreada entre os municípios, tem que haver equidade e bons princípios e é nisso que assentamos a nossa ação”, concluiu.

No que toca à saúde, Manuel Jorge Valamatos defende “a estratégia das Unidades de Saúde Familiar”, enquanto modelo que “funciona”.

“O modelo dos polos de saúde têm que estar agregados a uma Unidade de Saúde Familiar, caso contrário não conseguimos cativar e mobilizar médicos para o efeito, e depois do ponto de vista das infraestruturas, reparem o que acontece com a USF Beira-Tejo e a USF D. Francisco de Almeida, são unidades preparadas do ponto de vista técnico para responder melhor às pessoas”, disse, convicto.

USF. D. Francisco de Almeida, em Abrantes. Créditos: mediotejo.net

O edil aproveitou ainda para fazer uma reflexão, com base da defesa do modelo das USF que agrega população das freguesias rurais aludindo à antiga Escola C+S Dr. Fernando Loureiro, em Alvega, atual Escola Básica de 1º Ciclo e Jardim de Infância.

“A mim custa-me muito, fui professor em Alvega. Adorava aquela escola. Era escola secundária e de 2º e 3º ciclo, mas já quando lá fui professor, há quase trinta anos, eu ia percebendo que cada vez havia menos alunos. Ia percebendo que aqueles alunos se iam afastando para escolas muito mais competitivas. A escola de Alvega, há 50 ou 60 anos, teve centenas e centenas de alunos, na altura já só havia uma turma do 5º, do 6º, do 8º, e eu percebi que a escola ia perdendo alunos. São os tempos. O que é que é melhor e para quem? Claro, para as pessoas que têm ali a loja, para o presidente da junta, para qualquer cidadão, manter a escola a todo o custo ainda era uma possibilidade. Mas quem perde são os alunos; aqueles alunos estão muito melhor em escolas grandes, com muita gente, com dinâmica, com infraestruturas capazes de responder aos dias de hoje. Nós não podemos querer ter tudo no mesmo sítio, como foi, com saudosismo”, refletiu.

Por outro lado, o edil foi questionado pelo deputado Paulo Teixeira (PS) sobre as obras no Hospital de Abrantes.

O eleito mencionou o anúncio feito há dois meses pelo CHMT de início de obras na Consulta Externa e Gastroenterologia no Hospital de Abrantes com prazo de duração de um ano, sendo que estariam previstas obras em simultâneo no serviço de urgências do Hospital de Abrantes.

A bancada do PS questionou ao presidente sobre o desenrolar das obras em curso assim como o início das obras de requalificação do serviço de urgências.

Manuel Jorge Valamatos disse que nas obras na Gastroenterologia e Consultas Externas “o processo está a andar de forma célere, muito mais do que o Conselho de Administração entendia. As coisas estão a correr mesmo muito bem”.

Manuel Jorge Valamatos, presidente CM Abrantes. Foto: mediotejo.net

Falando no projeto final, revelou que “era bom que se replicasse por todo o hospital”, e admitiu ter conferenciado com vários membros do Governo sobre as Urgências, porque “as Urgências têm urgência na sua requalificação”.

“Não queremos descolar desta pretensão de ter as Urgências devidamente requalificadas”, afirmou o presidente de Câmara.

Na ordem de trabalhos também foi deliberado um ponto sobre a extinção de protocolos/contratos de cedência de instalações, no âmbito do processo de transferência de competências na área da saúde, referentes à Junta de freguesia de Fontes e UF São Facundo e Vale das Mós, bem como alteração do protocolo com a Junta de freguesia de Bemposta.

De acordo com a transferência de competências na área da saúde, explicou o presidente de Câmara, está a existir uma “atualização das rendas nos sítios onde verdadeiramente estão a haver ações em concreto”, disse, explicando que “não podemos manter as rendas em sítios onde não tem atividade. Não é sinónimo de dizer que, se daqui a seis meses voltar a haver atividade numa junta de freguesia ou noutra instalação de qualquer instituição, não recuperemos um novo contrato. Neste momento não existe aquela função específica, e tivemos que atualizar. Vamos receber dinheiro mas vamos ter que justificar, com contas certas e de forma afirmativa, o que estamos a fazer”.

José Silva, deputado do BE na AM Abrantes.

Neste âmbito José Silva, do Bloco de Esquerda, referiu que tem sido bandeira do seu partido a defesa da prestação de cuidados primários em freguesias onde deixou de existir. “Com esta proposta, o executivo municipal vem acabar de uma vez por todas com a possibilidade de esses serviços voltarem a ser prestados”, indicando que se propõe a extinção de protocolos/contratos com a UF São Facundo e Vale das Mós, Casa do Povo de São Facundo, Casa do Povo de São Miguel do Rio Torto, Junta de Freguesia de Fontes.

José Silva, deputado eleito pelo BE na AM Abrantes

O BE alertou que na União de Freguesias de São Facundo e Vale das Mós e na freguesia de Fontes “cessa a possibilidade futura de prestação pública de cuidados de saúde primários, contribuindo para o despovoamento, afugentado investimentos e condenando os cidadãos a grandes deslocações, onerando o orçamento familiar, numa altura em que a crise fustiga gravemente as famílias”.

Por outro lado, quantificou que está em causa um valor de 3600 euros num orçamento municipal que ultrapassa 40 milhões de euros.

“Estes encerramentos vêm juntar-se ao encerramento de escolas, nestas e noutras freguesias, o mesmo acontecendo em relação aos CTT que também decidiram encerrar balcões, contribuindo para o aumento das assimetrias. Convém aqui realçar que a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT) nunca encerrou estes polos de saúde, mantendo sempre aberta a possibilidade, no futuro, de poder recolocar profissionais de saúde”, disse.

“O executivo abrantino, que tanto apregoa aos serviços de proximidade, assim que assumiu competências na área da saúde logo extingue essa possibilidade. Face ao exposto, o BE vota contra a proposta de extinção de protocolos/contratos celebrados com as entidades anteriormente mencionadas”, terminou, argumentando o seu sentido de voto.

João Morgado, deputado do PSD na AM Abrantes.

Por seu turno, João Morgado, deputado do PSD na Assembleia Municipal, interveio sobre o tema da transferência de competências na área da saúde, colocando questões ao presidente de Câmara. O deputado disse presumir que com a extinção destes contratos a autarquia estaria “a assumir que os médicos de família não voltarão às localidades em questão, pelo menos é essa a nossa interpretação”.

João Morgado, deputado eleito pelo PSD na AM Abrantes.

Manuel Jorge Valamatos respondeu que se está a “tentar mudar a estratégia de funcionamento para conseguir um maior número de pessoas ou a totalidade de pessoas servidas pelo SNS”, frisando que não se está a acabar com polos de saúde.

“Só estamos a regular a situação. Não podemos pagar por um sítio que não existe (…) Só estamos a acertar os protocolos em função de onde existe verdadeiramente atividade”, justificou.

Resposta do presidente de Câmara à intervenção de João Morgado (PSD).

O ponto foi aprovado por maioria com votos a favor do PS, PSD e Chega, e presidentes de junta da UF Alvega e Concavada (MIUFAC), Tramagal (MIFT) e Rio de Moinhos (MIFRM).

O Bloco de Esquerda e a CDU votaram contra e o ALTERNATIVAcom optou pela abstenção.

Na sessão foi também aprovado por unanimidade o Regimento do Conselho Municipal de Saúde de Abrantes, com vista à sua instalação.

Alexandra Simão, deputada eleita pelo PS na AM Abrantes.
Alexandra Simão, deputada eleita pelo PS na AM Abrantes, apresenta declaração de voto abordando a criação do Conselho Municipal de Saúde de Abrantes

O Conselho Municipal de Saúde será “um órgão consultivo, que tem por objetivo analisar e acompanhar o funcionamento do sistema de saúde no território local e a sua criação decorre no âmbito da transferência de competências para os órgãos municipais no domínio da saúde”, explica a autarquia.

Este órgão poderá intervir no domínio da saúde propondo “ações necessárias e adequadas à promoção dos maiores padrões de eficiência e eficácia do mesmo”.

Este conselho será presidido pelo presidente da Câmara ou, na sua falta ou impedimento, pela vereadora responsável pelo pelouro da Saúde, Raquel Olhicas, enfermeira de profissão.

O Conselho Municipal de Saúde é ainda composto pelo presidente da Assembleia Municipal; um presidente de uma junta de freguesia em representação das freguesias do município, que será eleito pela Assembleia Municipal; um representante da Administração Regional de Saúde; um diretor executivo e o presidente do conselho clínico e de saúde dos Agrupamentos de Centros de Saúde e um representante das instituições particulares de solidariedade social, dos serviços de Segurança Social e das associações da área da saúde.

Joana Rita Santos

Formada em Jornalismo, faz da vida uma compilação de pequenos prazeres, onde não falta a escrita, a leitura, a fotografia, a música. Viciada no verbo Ir, nada supera o gozo de partir à descoberta das terras, das gentes, dos trilhos e da natureza... também por isto continua a crer no jornalismo de proximidade. Já esteve mais longe de forrar as paredes de casa com estantes de livros. Não troca a paz da consciência tranquila e a gargalhada dos seus por nada deste mundo.

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