Aos 88 anos, a caminhar para os 89 e depois de dar 30 anos à vida militar, Joaquim Cunha dedicou-se posteriormente a fazer biscates. Parou definitivamente aos 80 anos, mas para si estar quieto “é a pior coisa que pode acontecer”, razão pela qual começou a fazer casinhas de madeira em miniatura. Muitas são réplicas de estruturas típicas de várias regiões do país, naquele que é um “tesouro” até há pouco tempo escondido na sua oficina, e que é agora dado a conhecer pelo mediotejo.net.
Natural de Alhandra, foi na Praia do Ribatejo que construiu vida, depois de ser colocado no agora denominado Regimento de Engenharia nº 1. Mas acabou por decidir dar-se como voluntário para os paraquedistas, naquela que considera ter sido a melhor decisão que podia ter tomado.
Depois de ser um dos primeiros paraquedistas portugueses, daqueles que foram tirar o curso por terras espanholas, Joaquim Cunha foi militar durante 30 anos. Pelo meio, experienciou a guerra nos três teatros da Guerra Colonial, em Angola, Moçambique e na Guiné.

A sua própria casa – esta verdadeira e em tamanho real – foi também erguida pelas suas mãos: “Pus esta casa em pé só eu, o meu sogro e os familiares, pu-la em pé, com tijolo à vista”. Só para rebocar as paredes é que teve de contar com a ajuda de pedreiros. “Mas pô-la em pé, com o telhado, isso fui eu mais o meu sogro”, assevera.
Ao fim de 30 anos abandonou a vida militar, passou “à reserva”, o que não significou que tenha parado. “Eu já tinha princípios de marcenaria do antigamente, depois para estar entretido, trabalhei nas obras a fazer cofragem”, diz, exemplificando com a Escola da Praia do Ribatejo e com os prédios construídos ao lado, onde trabalhou com uma equipa de carpinteiros.

Posteriormente deixou também de trabalhar nas obras, “comecei-me a mentalizar que eu não tinha necessidade de estar a trabalhar nas obras, mas era o problema de estar quieto, o estar quieto para mim, é a pior coisa que pode acontecer”, diz.
Veio para casa, mas ia fazendo uns biscates, conforme as pessoas iam solicitando: “oh sr. Cunha faça-me isto, oh sr. Cunha faça-me aquilo”. Entre roupeiros, cozinhas e muitos outros trabalhos, trabalhou até aos 80 anos.
Foi portanto na idade redonda dos 80 anos que parou efetivamente de trabalhar. Mas de novo se levantava o problema de estar quieto, pelo que começou a indagar-se “e agora o que é que vou fazer”?
Pelo que, para colmatar esse problema, começou então a fazer as primeiras casinhas na sua oficina, local onde passa desde então as suas manhãs, entre madeiras e ferramentas, a dar vida às suas casinhas, e onde esteve à conversa com o nosso jornal.

A primeira casinha que fez foi a miniatura de uma casa açoriana, à qual se lhe seguiram muitas outras, desde casas típicas da ilha da Madeira, do Alentejo, Algarve, Costa Nova ou Trás-os-Montes e várias ao estilo americano. Já construiu também uma casa típica avieira, uma réplica da Escola Primária de Praia do Ribatejo e um solar minhoto – a sua peça mais querida.
Entre a já vasta coleção, que já tem de ser repartida entre a oficina e outras duas garagens, encontra-se igualmente um espigueiro – estrutura elevada com a função de secar o milho e de impedir a intromissão de roedores – ou uma igreja, construída a partir de um filme, “um daqueles filmes americanos, de cowboys”. Como na trama incendiavam e destruíam a igreja, Joaquim Cunha resolveu construir uma réplica da mesma. O pormenor da presença de um pequeno sino na torre do edifício chamou em particular a atenção do nosso jornal.
Mas do seu trabalho orgulha-se também de não fazer nenhuma casa igual “faço todas diferentes. E vou à procura, esta não, aquela não, agora estou a fazer esta esta casinha, toda feita em pauzinhos das espetadas”.
“Depois comecei por aí, comecei por aquelas casinhas todas, por isso tudo”, diz-nos enquanto roda o braço ao longo das várias casinhas em exposição nas prateleiras da sua oficina, adiantando ainda que “depois houve uma senhora [a neta] que me deu um canal onde só vejo casas, casas, casas, então comecei a apaixonar-me por estas casas e comecei sem parar até hoje, pronto. Vou estando de volta das casinhas, e continuo”, diz-nos sorridente e visivelmente feliz.
Quando se lhe pergunta quais os materiais que utiliza nas suas construções, a resposta sai-lhe pronta e simples, “madeira, madeira, madeira”. Compra paus e madeiras de diferentes formatos e tamanhos, mas não é só chegar e colar, toda a madeira é trabalhada, é lixada e é cortada para ficar do comprimento e formato desejado.

“Quando eles não dão o comprimento, sou eu que faço os pauzinhos, tenho aqui a madeira, e o que é que me safa? É esta maniqueta”, questiona e responde, puxando de uma máquina que corta madeira a qual mete a trabalhar para nos exemplificar o seu funcionamento. A máquina foi comprada exatamente com esta finalidade. É também a neta que lhe vai trazendo alguns outros materiais em madeira, como os paus que os médicos usam para ver a língua – que Joaquim Cunha usa bastante para construir os telhados – ou os paus das espetadas.
É exatamente numa casa feita apenas com “pauzinhos das espetadas” que está agora a trabalhar. A ideia nasceu depois de ter perdido mais de duas horas a ver um vídeo no qual uma mulher asiática, apenas com um serrote e uma catana, construiu uma casa em bambu, pelo que Joaquim Cunha resolveu fazer uma igual, em miniatura.
Quando acaba uma nova construção sente-se “contentíssimo”, mas não nega que enquanto está a fazer uma casa, a ideia já está na próxima: “Eu às vezes passo noites que não durmo a pensar ‘quero fazer aquela casa, mas agora como é que eu faço isto, como é que eu faço aquilo’. Por exemplo, eu vejo uma casita só assim de frente, quando é a imagem que vejo e não dá para o 3D, vejo-a de frente, e depois tenho de imaginar como é que ela é do outro lado e atrás. Mas geralmente sai-me a quase sempre bem”, diz, adiantando que muitas vezes se guia pelo plano da casa, o qual lhe diz tudo – onde estão as portas, as janelas – “e pronto, depois aí já me guio”.

O seu trabalho nunca esteve exposto publicamente até há pouco tempo, quando o convidaram a expor no CECUDE (Centro Cultural e Desportivo de Praia do Ribatejo), no dia 1 de maio de 2022. Até essa data, as suas construções nunca tinham visto outro lugar para além das paredes da oficina ou das suas garagens.
Mas em breve as suas obras vão estar expostas novamente, naquela que era a Escola Primária de Praia do Ribatejo, entretanto transformada em museu. “Eu vou acabar por fazer a exposição com o mesmo material que tinha, mas não fiz mais porque a minha doença não deixou. Tenho esta e tenho uma casa em vistas, que é toda às pedrinhas, que quem arranjou as pedrinhas todas foi a minha neta, mas não é para agora, que aquela é uma casa que vai dar muito que fazer. Está na calha, mas já não vai para esta exposição. Poderá ir para outra mais tarde”, adiantou.

Quanto às obras em miniatura, Joaquim Cunha diz não aceitar encomendas, recusando-se a vender o que faz. “Isto é artigos que não sei onde é que irão ficar, os meus netos, eles é que sabem para onde é que isto há-de ir, ou então um dia dá-me na telha e se eles quiserem ofereço isto ao museu”, confidencia ao nosso jornal.
Depois de descobertas as casinhas do senhor Cunha, que mais tesouros terá o concelho barquinhense em si escondidos?
Boa tarde,
Fiquei fascinada pelas casinhas que faz o Sr. Joaquim Cunha.
Sabe-me dizer se ele ainda continua a fazer e se aceita visitas?
Obrigada.
Bonitos trabalhos. Sou reformado, e também faço casinhas em madeira e faço pinturas