Paulo Brito. Foto: mediotejo.net

É natural de Lisboa, tem 54 anos. Reside na aldeia de Almofala, concelho de Vila de Rei. Militante do PSD, é presidente da Assembleia Municipal vilarregense desde 2013 e deputado na Assembleia Intermunicipal da CIM do Médio Tejo. Docente, coordenador e investigador, tem feito carreira no Instituto Politécnico de Portalegre, dedicado ao setor das energias renováveis e combustíveis alternativos. Católico, pai de 8 filhos, encontrou na corrida uma forma de descompressão libertadora para o corpo e mente e com isso abraçou um novo estilo de vida, com mais saúde. O mediotejo.net esteve à conversa com Paulo Brito para conhecer melhor o lisboeta que não pensou duas vezes em retornar às raízes e fixar residência em Vila de Rei.

Os pais são naturais de aldeias de Vila de Rei; o pai de Almofala e a mãe de Pisão Cimeiro. A mãe foi enfermeira no Hospital da Cruz Vermelha e o pai comissionista/empresário. Conheceram-se precisamente nas viagens de comboio até Lisboa. Namoraram, casaram, e por lá ficaram. Continuam a residir na capital. São duas das suas grandes referências. Outra grande referência tem na Avó Lídia, pela forma “como vivia a sua religiosidade”.

Fã acérrimo de Pink Floyd, destaca como filme da sua vida o “Once Upon a Time in America” e escolhe como livro marcante o “Papalagui”, um livro escrito por Erich Scheurmann baseado nos discursos de um chefe de tribo indígena.

Nasceu, cresceu e viveu em Lisboa até começar a constituir família. Uma família numerosa que logo pôs em perspetiva a ideia de mudar de ares, procurar uma nova vida e com mais qualidade. Mudaram-se da capital para Vila de Rei, mais concretamente para Almofala.

“Queríamos sair de Lisboa. Morar no Interior do país, para um lado menos populoso. Surgiu a possibilidade, com um concurso para o Instituto Politécnico de Portalegre, concorri e acabei por ficar. Ainda estive um ano a trabalhar em Portalegre e a família estava em Lisboa”, começa.

Como era normal todos os anos vir até Vila de Rei passar férias com a família, os cálculos não foram difíceis de fazer para a próxima decisão. “Percebi que o tempo que demorava de Vila de Rei para Portalegre não era assim tão diferente do que demorava em Lisboa a dar voltas e voltinhas. E como a minha esposa, sendo jurista, teve oportunidade de emprego aqui na Câmara com abertura de uma vaga à qual concorreu, e entrou…”, continua.

Começaram a alinhar-se as perspetivas de um novo futuro coletivo em família. “Tinha aqui as minhas raízes, as coisas conjugaram-se e apostámos em Vila de Rei. E vivemos cerca de dois a três anos na casa dos meus avós, e acabámos por construir a nossa casa”, conta.

O percurso escolar foi feito em Lisboa; frequentou o Liceu D. Pedro V, depois formou-se Engenheiro Químico no Instituto Superior Técnico. Iniciou um trabalho de doutoramento na área da Eletroquímica, focado nas células de combustível. Fez um mestrado em Ciência e Engenharia da Corrosão, na Universidade de Manchester. Possui também um MBA na área de Gestão.

E eis que surge pausa para explicação em prol do rigor científico, na diferenciação entre química e eletroquímica.

Paulo Brito (à esquerda) com uma comitiva do Politécnico de Portalegre e com Manuel Heitor, Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior em visita ao BioBIP. Foto: BioBIP

A carreira tem sido no Politécnico de Portalegre, com trabalho focado na área da investigação, nomeadamente quanto a energia, combustíveis alternativos, energias renováveis.

E aqui contribuiu para que o enfoque fosse a componente de valorização de recursos de biomassa, “um setor mais interessante e na altura ainda não havia muita gente a explorar a temática” numa região florestal e agro-florestal.

“Começámos a perceber que o Instituto Politécnico, com ensino mais aplicado, também deveria ter a parte de investigação mais aplicada, com maior contacto com as empresas. E aí criámos uma incubadora de base tecnológica com um laboratório de demonstração. Aí tem sido desenvolvido trabalho com empresas, com projetos que pretendem avaliar materiais”, disse, referindo-se ao BioBIP (Bioenergy And Business Incubator) do Instituto Politécnico de Portalegre.

Foto: DR

Apresenta-se como professor, como docente, mas a componente pedagógica diz-lhe um pouco menos do que a científica, estando mais voltado para a investigação aplicada.

Professor Coordenador com Agregação, na Escola Superior de Tecnologia e Gestão do Instituto Politécnico de Portalegre, onde exerce funções de presidente do Conselho Técnico-Científico e é coordenador do Centro de Investigação de Valorização de Recursos Endógenos – VALORIZA. Já está a concorrer para atingir o topo da carreira, enquanto Professor Coordenador Principal.

Áreas como a bioenergia, tratamentos ambientais de resíduos, corrosão de materiais e produção galvânica de energia e hidrogénio são-lhe muito caras e é aqui que dedica a sua atenção. Conta hoje mais de 250 trabalhos publicados, entre artigos científicos, livros, apresentações e congressos.

Foto: BioBIP

Começou a dar aulas à noite em 1986, com vinte e poucos anos; passou pelo Colégio D. Dinis, em Chelas, onde o ambiente era “um bocadito pesado” e de onde se recorda também das cenas de pancadaria entre alunos e funcionários, e até alunos e professores. Mas também deu aulas em Sintra. “Sempre se ganhava mais umas massazitas e foi uma experiência muito interessante e gratificante. Foi aí que nasceu o gosto pelo ensino”, conta.

Deu aulas na Universidade Lusófona, e diz ter quase a certeza de ter dado a primeira aula na estreia do curso de Ciências Farmacêuticas, ao qual, entre muitas disciplinas, deu Química analítica. Também somou muitas horas de aulas aos alunos de Engenharia Civil e de Biologia.

Quando veio de Inglaterra criou uma empresa na área da corrosão em que tinha feito mestrado. A empresa CPSystems, que ainda hoje existe, incide em consultoria e trabalhos em proteção catódica.

No meio de tantos projetos, destaca-se o mais importante de todos. A família.

Fez, a 15 de dezembro de 2021, 20 anos que se mudou para Vila de Rei. Veio em 2001, quando nasceu o 5º filho.

Tem 8 filhos, que facilmente se dividem entre a equipa feminina e masculina para qualquer brincadeira ou jogo familiar. São quatro raparigas e quatro rapazes. Mas a cereja no topo do bolo é já ser avô, a filha mais velha foi recentemente mãe de uma menina.

Uma família que é numerosa porque a vida assim o ditou. “Foi acontecendo, e estávamos disponíveis para tal. Não houve aqui nenhuma previsão sobre quantos filhos íamos ter. Foram surgindo e sendo bem acolhidos”, assume.

E vai puxando da cabeça para situar a vida atual de cada um. E lá vai indicando as diversas áreas profissionais de cada filho, sendo que a mais velha é terapeuta da fala e reside em Vila de Rei. O segundo está a terminar mestrado no IST na área de Eletrónica, a terceira terminou mestrado na Escócia na área de Design e Comunicação, a quarta está no terceiro ano de Nutrição em Coimbra, o quinto está a estudar música na Holanda, na Academia Real Holandesa na parte da percussão, o sexto entrou em Engenharia Civil.

Os mais novos, com 13 e 10 anos, ainda estão a estudar em Vila de Rei mas, até ver, a descendência tem puxado mais pela área das Ciências e da Engenharia.

“Estão a ir mais para a área do pai do que para a área da mãe”, comenta, lembrando que a esposa é jurista.

Mas entre os oito, há um que segue as pisadas do pai e da mãe. O sexto filho, Simão, tem como particularidade ser vice-campeão de trampolim sincronizado e ter estado muito perto de competir nos Mundiais, não fosse uma lesão estragar-lhe os planos. Treina no Lisboa Ginásio Clube, uma vez que foi opção ter feito o ensino secundário em Lisboa e ficar com os avós a bem da sua evolução enquanto atleta e dada a exigência dos treinos.

Simão, filho de Paulo Brito, herdou o bichinho da ginástica acrobática dos pais e tem alcançado altos patamares, tendo sido vice-campeão mundial de trampolim sincronizado. Foto: DR

E daqui surge outra faceta, além da ciência e do ensino. Paulo Brito também já foi ginasta e foi nessa altura que conheceu a mulher, Manuela.

Foram os pais de Paulo Brito que o colocaram na ginástica, uma vez que moravam muito próximo do Estádio da Luz. Recorda o saudoso “Mestre Granger, um dos primeiros olímpicos portugueses na ginástica, em Helsínquia”.

“Éramos uma classe acrobática mista, associada ao Benfica, competíamos em termos de classe e fomos várias vezes ao estrangeiro representar Portugal. Na primavera existiam saraus por todo o lado, e corríamos o país todo. Era um ambiente giro. Começámos no Benfica, com 10 ou 11 anos. Eu andei lá até aos 18 ou 19 anos, porque com a Universidade começou a tornar-se muito exigente e acabei por desistir”, recorda.

Mais recentemente o desporto voltou a fazer parte da sua vida. Foi fumador durante muitos anos, mas afirma, certeiro, que das melhores coisas que fez foi abandonar esse vício há cerca de 18 anos.

Porém, com essa vitória, engordou muito e apesar de ter conseguido perder algum peso a certa altura, não conseguia resultados porque havia uma necessidade de compensar a ausência do cigarro. O peso teve implicações a nível de saúde. “A minha médica era simpática comigo, e de vez em quando mandava-me fazer análises, e eu nem precisava pedir. E – qualquer dia tenho de fazer um gráfico – todos os parâmetros iam piorando à medida que ia repetindo as análises”, garante.

Há cerca de três anos e meio, as análises ditaram a mudança. “A minha mãe é diabética, e como recebi umas análises com os parâmetros todos desajustados, isso foi o toque final. Soou a campainha e decidi que assim não podia ser e tinha de perder peso. Na altura estava com quase 120 kg”, e voltou a fazer dieta e contenção alimentar.

Seis meses depois de iniciar o processo, a mulher foi desafiando para caminhadas, a par da médica de família que também incentivava a prática desportiva com regularidade.

“Comecei a fazer passeios com a minha mulher, e houve uma vez que pensei: porque não correr um bocadinho? E comecei a correr um quilómetro ou dois. Fiquei tão contente! Consegui correr dois quilómetros. E passados uns dias, voltei a repetir. E comecei a desafiar-me. Se corro dois, também corro três. Cheguei a um ponto em que corria 10 quilómetros. Comecei a ganhar o gosto pela corrida”, confessa.

Paulo Brito com a equipa do Politécnico de Portalegre que correu a Meia Maratona de Lisboa em novembro de 2021. Foto: DR

Hoje em dia não dispensa os 40 quilómetros de corrida por semana, com três a quatro corridas, no mínimo.

E com uma equipa do Politécnico de Portalegre correu em novembro de 2021 a Meia Maratona de Lisboa, passando a ponte sobre o Tejo.

“Neste momento dedico-me muito à corrida. Dá-me um certo gozo a nível físico, mas também me faz sentir bem a nível mental e intelectual. É um momento de descompressão muito interessante”, admite.

Nunca gostou de correr. Nem quando era ginasta. Nem mesmo quando foi à tropa por quatro meses.

A envolvência política, social e religiosa num concelho com esperança no futuro

À chegada a Vila de Rei, há mais de uma década, tornou-se militante do PSD, partido por quem já tinha alguma afinidade política.

Foi convidado pela ex-presidente de Câmara Irene Barata para ser seu mandatário de campanha na candidatura ao último mandato.

Paulo Brito foi reeleito presidente da mesa de Assembleia Municipal. Foto: mediotejo.net

Há 8 anos, o atual presidente de Câmara, Ricardo Aires, convidou-o para avançar como cabeça de lista à Assembleia Municipal. “Acabei por ponderar, e aceitei. Pensei que também era um serviço que poderia fazer à comunidade”, conta, sobre a experiência da vida política que arrancou nas eleições autárquicas de 2013.

Em jeito de balanço, admite que o Partido Social Democrata tem tido a vida facilitada, porque “tem alcançado sempre maioria absoluta quer na Câmara, quer na Assembleia. Acaba por não ser uma grande dificuldade em termos políticos”.

Crê que o diálogo, análise e discussão e tomada de posição têm estado presentes, e diz que se trata de uma “construção conjunta”.

“Temos vindo a fazer algumas iniciativas, procurando alguns temas relevantes, criámos sessões dedicadas a esses temas, com convites a pessoas externas, empresas e instituições para participar”, recorda, enquanto enumera outras ações como a descentralização das sessões da Assembleia Municipal, nomeadamente na Escola Básica e Secundária, no Quartel dos Bombeiros, às juntas de freguesia.

“Sempre na perspetiva de levar a Assembleia ao pé das pessoas e ouvir os seus anseios e necessidades”, diz.

No mandato passado, numa Assembleia Municipal em 2019, que decorreu na Biblioteca da Escola com alunos na assistência. Foto: mediotejo.net

Porém, a participação dos cidadãos fica muito aquém do preferível, situação que se estende numa realidade regional e muito provavelmente nacional, onde os cidadãos se afastam da política e não participam nas sessões dos órgãos autárquicos locais.

Mesmo assim, recorda que “antes da pandemia, eu diria que em muitas das sessões havia uma intervenção de alguém do público”, salienta.

O presidente da Assembleia Municipal reconhece que poderia haver mais “diálogo político”, mas que ainda se privilegia muito o contacto direto, por ser um meio pequeno onde todos se conhecem, e prefere alertar-se logo para o problema a resolver, para a necessidade premente ou dá-se a sugestão quando se cruzam com o presidente ou o vereador na rua.

Além da participação na política, mantém-se ativo na sua terra. Católico, consegue entre tantos afazeres, responsabilidades e viagens ser catequista na Paróquia de Vila de Rei. “O nosso município ainda é um dos mais religiosos da região”, aponta.

Outra função que tem assumido é a de deputado na Assembleia Intermunicipal da Comunidade Intermunicipal do Médio Tejo, para a qual tenta transportar as mais-valias e conhecimentos em termos profissionais, contribuindo para o sucesso e desenvolvimento da região.

“Sozinhos não conseguimos chegar a lado nenhum. A minha perspetiva tem sido esta, de criar sinergias e pontes”, garante.

Questionado sobre o facto de Vila de Rei – a par de Sertã -, município do distrito de Castelo Branco, integrar a Comunidade Intermunicipal do Médio Tejo e não a da Beira Baixa, Paulo Brito reconhece que existem vantagens desde logo a nível de saúde, pela proximidade ao CHMT. “Pessoalmente, vejo um grande dinamismo da parte da CIM Médio Tejo em termos de projetos, parece-me muito relevante e que tem muito interesse para Vila de Rei”, começa por notar.

Ainda assim, não descarta que os dois municípios do Pinhal Interior Sul pudessem também dar algum apoio positivo à Beira Baixa. “Falo dos dois porque acho que não faz sentido Vila de Rei entrar na CIMBB e Sertã ficar na CIMT. Ficava uma quebra”, diz.

Por outro lado, entende que integrar uma Comunidade Intermunicipal maior, traz vantagens em termos de ganhos de escala que permitem a concretização e integração em mais projetos.

“Nesta fase, dado que muitos dos serviços que aqui precisamos de fornecer acabam por estar muito mais perto e com maior facilidade na região do Médio Tejo, é aqui que reside a grande vantagem. Podermos estar muito próximos de Abrantes. Enquanto que para Castelo Branco demoro cerca de uma hora, para Abrantes demoro 15 minutos”, salienta, reconhecendo que há vantagens e desvantagens nos dois lados e que Vila de Rei provavelmente conseguiria outros projetos igualmente importantes na CIMBB.

Quanto a Vila de Rei, terra do coração e à qual se dedica nos últimos quase 20 anos, reconhece-a como um concelho cheio de potencialidades.

Entre as áreas mais significativas, em termos de desenvolvimento, nota o turismo – setor cujo sucesso é transversal a nível nacional.

Praia fluvial do Penedo Furado. Foto: mediotejo.net

“Acho que têm vindo a ser dados alguns passos, mas ainda temos muito para caminhar. A nossa oferta ainda não é muito significativa. Temos agora o hotel que está a ser remodelado e que vai aumentar grandemente essa oferta. Mas ainda está aquém… se eu quiser organizar um evento localmente, não consigo organizar porque não tenho hipótese de alojar as pessoas. Mas não há dúvida que temos uma frente do Castelo de Bode muito interessante, apesar de maior parte dela estar quase bloqueada e não conseguirmos fazer lá nada”, descreve.

Refere-se ao Plano de Ordenamento da Albufeira de Castelo Bode, que tem sido um impedimento a várias intenções e projetos de investimento em termos turísticos no concelho e de aproveitamento deste grande ativo do Médio Tejo, que é a Barragem de Castelo do Bode. Caso, nomeadamente, de um dos grandes projetos anunciados nos últimos anos, a Herdade da Foz da Represa, cujos promotores foram vencidos pelo cansaço perante as restrições que foram sendo impostas pela lei e organismos públicos.

“Acho que estamos no bom caminho. A pandemia também ajudou muito todas as zonas do interior do país. Alertou as pessoas que também há aqui coisas muito interessantes e de qualidade que podem usufruir”, diz.

Praia fluvial de Fernandaires. Foto: CM Vila de Rei

Relevou ainda o trabalho que se está a desenvolver para projetar o turismo no concelho, caso do Plano Estratégico de Desenvolvimento Turístico de Vila de Rei 2030, que faz um diagnóstico do que existe e das lacunas prementes, delineando ainda soluções e uma estratégia a ser proposta pela equipa de investigação responsável do Instituto Politécnico de Castelo Branco.

Outra parte refere-se à grande aposta na área social, sendo que Vila de Rei tem hoje em dia um manancial de “serviços de qualidade de apoio à terceira idade”, caso de lares, o centro geriátrico e ainda a componente de apoio à pessoa com deficiência. “Acabou também por permitir a fixação de algumas pessoas, nomeadamente jovens, no concelho. A Santa Casa da Misericórdia é o maior empregador deste território”, indica.

O futuro passa por outra grande área, mas cujo sucesso dependerá também do envolvimento de outros concelhos da região: o da floresta. Mas defende o investigador a implementação de biorefinarias – um dos projetos que Vila de Rei quer implementar nos próximos anos – como forma de “extração de produtos de mais valor, como combustíveis e outros materiais”.

“Não é só focado em termos da exploração da madeira que é uma área importante, mas também na componente da extração de materiais, quer sejam combustíveis, quer sejam materiais para outras produções, como extração de óleos”, exemplifica, mencionando que dessa extração e transformação dos materiais surgem produtos alternativos e que contribuem para a valorização da matéria-prima.

“Há aqui um potencial muito grande. e se queremos efetivamente uma descarbonização, acho que a biomassa e as biorefinarias têm um papel muito importante”

Um concelho como Vila de Rei, inserido numa área florestal, “terá que olhar para esta área com atenção numa ótica de valorização. Penso que é isso que estamos a tentar”.

O setor da floresta assume-se como ponto forte pela sua potencialidade, mas consegue ser um “ponto fraco muito fraco”.

“Todas as zonas do interior, a norte do Tejo, são caracterizadas pelo minifúndio, ou até mesmo microfúndio. Nem se sabe muito bem na maior parte dos casos quem são os donos dos terrenos, e quando não há donos surgem não sei quantos herdeiros. Este é o grande desafio, e é muito difícil de ser vencido. A questão da propriedade privada é importante, mas acho que a legislação tem que evoluir um bocadinho mais no sentido de dar oportunidade para que se possam desenvolver alguns projetos”, começa por explicar.

Centro Geodésico de Portugal, em Vila de Rei. Foto: André Farinha

Na sua visão, deveriam existir mecanismos que permitam, por exemplo, que o Município ou uma associação dinamizem projetos no terreno. “Não é querer ficar com os lucros da propriedade. Mas que possa haver um conjunto de vetores que seja economicamente interessante e viável. E que valorize o território”, sublinha.

Neste âmbito, o novo Programa de Transformação da Paisagem poderá ser um mecanismo incentivador de novas dinâmicas, como as que enumerou.

“A esperança é grande nesse aspeto. E a biorefinaria tem de estar dentro desse plano que permite olhar para o território de forma organizada e que tudo aquilo que é gerado nesse território possa depois ser utilizado e valorizado. A biorefinaria está lá para essa valorização”, nota, referindo que o projeto inicial para uma central de biomassa em Vila de Rei evoluiu para esta biorefinaria, como sendo um projeto mais abrangente e que tem igualmente a componente de produção de energia.

“Se eu tiver hipótese de ter energia a partir da biomassa, tudo bem. Mas se não, há outros produtos com mais valor e interesse”, defende.

Os vestígios da exploração de ouro em Vila de Rei ocupam toda a zona centro e sul do concelho. Foto: DR

Também em termos de valorização e preservação do património local, Vila de Rei poderá vir a pontuar. Paulo Brito considera que por via de projetos como a classificação das Conheiras, naquelas que foram explorações auríferas do tempo dos Romanos, poderá surgir uma iniciativa maior até de investigação e divulgação, uma vez que já existe uma parceria com o Instituto Politécnico de Tomar.

“Não podemos querer tudo, e se conseguirmos apostar nestas três áreas, num turismo com maior foco e maior qualidade, com linhas muito bem definidas. Manter uma componente de caráter social e que possa ser referência. E na parte da floresta, apostar na biorefinaria. Julgo que serão as três grandes linhas de trabalho”, adianta, convicto de que empresas de fileiras diferenciadoras, caso do investimento anunciado no setor da canábis medicinal, poderão contribuir para um crescimento integrado do concelho.

No que toca à biorefinaria, espera-se que seja criada de forma modular, começando com uma unidade e que possam ir crescendo. E com isso, possa ir sendo motor de crescimento, possa incentivar outros projetos e o envolvimento e crescimento de outros concelhos da região, que possam enveredar por caminhos relacionados, caso da produção de hidrogénio no setor da energia verde.

“Se não conseguirmos dinamizar economicamente o município e atrair novos projetos, o concelho não consegue manter sustentabilidade [demográfica]”

Vila de Rei é sobejamente conhecida pelos apoios e incentivos dados no regulamento de apoio à fixação de população, medidas que o município tem tomado nos últimos anos por forma a dar maior qualidade de vida a quem opta por residir e constituir família em Vila de Rei.

Mas a situação de perda populacional, crê o docente, depende muito do desenvolvimento económico e da criação de emprego que incentive a estabelecerem-se em Vila de Rei. O problema, diz, está na dificuldade em conseguir atrair mão-de-obra qualificada, que acompanhe a estratégia económica e a aposta empresarial.

“A grande parte dos jovens ainda não está com grande interesse em ficar no concelho. Fala-se na «Geração dos 1000»… é verdade que com mil euros aqui se vive melhor do que com mil euros em Lisboa, no Porto ou em Coimbra. Mil euros aqui parecem valer muito mais do que lá. Mas é muito pouco… A geração tem de passar para dois mil euros ou mais. Claramente precisamos de dar maiores condições aos jovens, porque se não as pessoas acabam por sair, vão para o estrangeiro”, constata.

Foto: mediotejo.net

A orientação da Administração Central também tem de mudar quanto à instalação e localização de investimentos e projetos em Portugal.

“Não precisam necessariamente de ficar no litoral. Acho que devia haver uma estratégia muito séria de distribuir os projetos pelo país. Temos condições em termos de acessos, parques industriais, água, a vários níveis. Temos que perceber que há projetos que se fossem antes instalados nos pequenos municípios pelo país, dinamizavam muito o território. Acho que é por aí que temos que ir”, faz notar.

Como alguém que migrou da capital há quinze anos em busca de uma vida melhor e mais calma, longe da confusão da grande cidade, Paulo Brito vê Vila de Rei a manter a sua essência no futuro.

Convocado a imaginar Vila de Rei daqui a 20 anos, disse esperar “olhar para a mancha florestal e ver um território ordenado, com diferentes espécies. Vejo algumas unidades industriais dedicadas e a processar materiais extraídos da floresta. Vejo um conjunto de casas degradadas a serem restauradas e a funcionar como alojamento local, por exemplo. Vejo manter-se uma barragem saudável e as pessoas poderem usufruir das margens e das praias fluviais com qualidade”.

Vila de Rei. Foto: DR

Nesse exercício imaginativo, diz logo que não tem ilusões ao ponto de esperar que Vila de Rei vire uma espécie de Silicon Valley. Mas espera que, pelo menos, haja bastante população jovem e vê no horizonte a continuidade do projeto que tem vindo a ser construído, nomeadamente com a atribuição dos apoios ao nascimento e casamento, com o anual encontro entre famílias e crianças, nos momentos comunitários que reúnem os vilarregenses por ocasião do Dia do Concelho.

“Que a média etária baixe um bocadinho, tendo aqui mais jovens, porque já estamos com uma média de idades muito alta”, deseja, por fim.

Na verdade, mantém a esperança que Vila de Rei não perca a sua identidade e que continue a ser o sítio com muitas qualidades e potencialidades, as mesmas que pesaram na balança quando decidiu rumar, de armas e bagagens com a família crescente, a este pequeno município do Pinhal Interior que se tornou casa.

Joana Rita Santos

Formada em Jornalismo, faz da vida uma compilação de pequenos prazeres, onde não falta a escrita, a leitura, a fotografia, a música. Viciada no verbo Ir, nada supera o gozo de partir à descoberta das terras, das gentes, dos trilhos e da natureza... também por isto continua a crer no jornalismo de proximidade. Já esteve mais longe de forrar as paredes de casa com estantes de livros. Não troca a paz da consciência tranquila e a gargalhada dos seus por nada deste mundo.

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