“Pedimos a Deus e à Virgem de Fátima a paz na Ucrânia e no mundo.” Foi com esta prece, perante uma multidão de fiéis, que o arcebispo metropolita greco-católico de Lviv iniciou a cerimónia religiosa de recepção à Imagem Peregrina de Nossa Senhora de Fátima, que chegou àquela cidade da Ucrânia ao início da tarde desta quinta-feira, 17 de março.

Na monumental Igreja da Natividade da Santíssima Virgem, no coração histórico da cidade classificada como Património da Humanidade pela Unesco, o arcebispo Ihor Vozniak voltou a agradecer ao Santuário de Fátima por ter prontamente respondido ao seu pedido, enviando para a Ucrânia a Imagem da Virgem, na esperança de que possa ajudar os ucranianos nas suas preces pelo fim da guerra com a Rússia, iniciada no passado dia 24 de fevereiro.

A Imagem Peregrina de Fátima partiu do Santuário português na terça-feira, tendo sido transportada de avião para a Polónia. Daí cruzou a fronteira com a Ucrânia numa carrinha especial, até à cidade de Lviv, onde foi recebida por centenas de fiéis, que aguardaram na rua a sua chegada, para depois a seguirem até ao interior da igreja, em procissão.

Realizou-se depois uma emotiva cerimónia de entronização, transmitida em direto por várias cadeias de televisão ucranianas.

Muitos dos que assistiram à cerimónia desta tarde partilharam também nas redes sociais vídeos e fotografias do momento simbólico da entronização da Virgem de Fátima na igreja de Lviv, onde permanecerá durante um mês.
Una estatua de la Virgen de Fatima ya está entronizada en la mayor iglesia de Lviv, donde se quedará un mes. La gente espera que traiga paz #UkraineUnderAttack pic.twitter.com/PKdEo43eER
— Elisabetta Piqué (@bettapique) March 17, 2022
A Rússia na mensagem de Fátima
As Aparições de Fátima aos três pastorinhos, em 1917, e os segredos que a Virgem lhes confiou, têm na sua génese o contexto histórico que então se vivia, quando a I Guerra Mundial se travava já há três anos. Na Cova da Iria começou por rezar-se o terço suplicando pela paz no mundo, e esse espírito permanece vivo na mensagem de Fátima até hoje, com as Imagens Peregrinas a viajarem todos os anos para vários pontos do mundo em conflito, onde a sua interceção seja invocada.
O ano de 1917 ficou também marcado pela Revolução Russa, mas essa era uma notícia distante do Portugal de então. Para as multidões que acorriam a Fátima a cada dia 13, entre maio e outubro daquele ano, a guerra era uma realidade mais próxima, e que só parecia possível acabar com uma intervenção divina.
Contudo, segundo os pastorinhos, a mensagem da Aparição de 13 de julho de 1917 era clara:
“Quando virdes uma noite alumiada por uma luz desconhecida, sabei que é o grande sinal que Deus vos dá de que vai a punir o mundo pelos seus crimes, por meio da guerra, da fome e de perseguições à Igreja e ao Santo Padre. Para a impedir, virei pedir a consagração da Rússia a Meu Imaculado Coração e à Comunhão reparadora nos primeiros sábados. Se atenderem aos Meus pedidos, a Rússia se converterá e terão paz; se não, espalhará os seus erros pelo mundo, promovendo guerras e perseguições à Igreja. Os bons serão martirizados, o Santo Padre terá muito que sofrer, várias nações serão aniquiladas. Mas por fim o Meu Imaculado Coração triunfará. O Santo Padre consagrar-me-á à Rússia, que se converterá e será concedido ao mundo algum tempo de paz.”

Numa explicação teológica dos segredos de Fátima publicada pelo Vaticano, Joseph Ratzinger (mais tarde Papa Bento XVI) refere que a noção de “Imaculado Coração” pode soar estranha mas que o termo “coração” significa na Bíblia “o centro da existência humana, uma confluência da razão, vontade, temperamento e sensibilidade, onde a pessoa encontra a sua unidade e orientação interior”.
O “coração imaculado” é, segundo o evangelho de Mateus, “um coração que a partir de Deus chegou a uma perfeita unidade interior e, consequentemente, ‘vê a Deus’”, explicava Ratzinger. “Portanto, ‘devoção’ ao Imaculado Coração de Maria é aproximar-se desta atitude do coração, na qual o ‘fiat’ (‘seja feita a vossa vontade’), se torna o centro conformador de toda a existência.”
A consagração da Rússia ao Imaculado Coração de Maria só veio a ser realizada pelo Papa João Paulo II em 25 de março de 1984, perante a Imagem de Nossa Senhora de Fátima e para os fiéis católicos teve como consequência o colapso da União Soviética nos anos seguintes. No Santuário de Fátima está por isso em exposição um pedaço do Muro de Berlim.

Com uma nova guerra a dividir a Europa e o mundo, o Papa Francisco decidiu consagrar de novo a Rússia (e agora também a Ucrânia) ao Imaculado Coração de Maria. A cerimónia vai decorrer simultaneamente no Vaticano e em Fátima no próximo dia 25 de março – o mesmo dia escolhido por João Paulo II há 38 anos, invocando também assim a interceção do Papa polaco, que cresceu na mesma Europa de Leste a que a Ucrânia não quer voltar.
Tenho esperança que o Mário Machado leve uma santinha da Cova da Iria para lhe dar sorte.