São cerca de 3 mil os utentes da extensão de saúde de Assentis, Torres Novas, sem acesso a cuidados de saúde de proximidade, a maioria dos quais idosos e com dificuldades de locomoção. A alternativa apresentada é o recurso à Unidade de Saúde Familiar (USF) Cardilium, na sede de concelho, a cerca de 20 km de distância e que representa uma viagem de 20 a 25 minutos. Uma solução que não agrada à população, que clama por um médico de família que sirva a freguesia. Por isso, na terça-feira, cerca de 150 pessoas rumou à cidade e à sessão de Assembleia Municipal onde, perante os atores da política local, reclamaram para que os seus representantes lhes dessem voz junto do Governo Central.
“Há dois anos que a população de Assentis não tem uma estrutura de saúde minimamente definida. Dirigimo-nos à Assembleia Municipal para demonstrar o desacordo com a não existência de médico na freguesia e com a definição do novo formato de saúde familiar no concelho. O Município definiu que a população de Assentis seria deslocada para Torres Novas, na nova USF Cardilium e a população não considera que isso seja uma vantagem”, disse ao mediotejo.net, o presidente da Assembleia de Freguesia de Assentis, João Miguel Silva.

Estas pessoas, notou, “vivem numa zona distante, têm acessibilidades e dificuldades diferentes da população de Torres Novas e não consideram que haja igualdade na prestação do serviço. Há uma desigualdade de oportunidades”, afirmou.
ÁUDIO | JOÃO MIGUEL SILVA, PRESIDENTE ASSEMBLEIA FREGUESIA DE ASSENTIS:
João Miguel Silva defendeu ainda que a transferência dos utentes de Assentis para a USF Cardilium não é uma solução viável: “Não é por virmos a Torres Novas que temos o problema resolvido, porque também não vamos ter médico de família em Torres Novas”. E, deixou um reparo, que pode explicar o facto de não haver maior pressão para a colocação de um médico na extensão de saúde local: “A USF Cardilium precisa da população de Assentis para passar de uma classificação A para uma classificação B. Há também essa questão, que não apresentámos aqui [na sessão da Assembleia Municipal]…”.
A população diz sentir-se “desamparada” e pede “atenção” para um problema que se arrasta “há tempo demais”, traduzindo-se em “grandes dificuldades”, especialmente, “para os menos autónomos e também para os mais desfavorecidos”.
Ao mediotejo.net, vários populares presentes na sessão de Assembleia Municipal, manifestaram a sua indignação, lamentando que os seus direitos não estejam a ser devidamente defendidos.
Quem também se juntou à população de Assentis nesta manifestação foi Manuel José Soares. Usando da palavra no período dedicado às intervenções do público, o representante da Comissão de Utentes da Saúde do Médio Tejo (CUSMT), lembrou os representantes políticos locais da responsabilidade que têm em dar voz àqueles que os elegeram, fazendo pressão e reivindicando os seus direitos junto do poder central.
Manuel Soares dirigiu-se ao presidente da Câmara de Torres Novas, Pedro Ferreira, e lamentou que o autarca não faça, no que toca às fragilidades da saúde no concelho, a mesma pressão que faz quando defende a instalação do novo aeroporto em Santarém.
“O senhor presidente disse ao Ministro João Galamba estar cansado de ouvir que ‘Portugal é Lisboa e o resto é paisagem’. É estranho que o diga, quando na gestão da coisa pública no seu concelho, há tanta gente a dizer que ‘o concelho é a cidade e as aldeias são paisagem”, atirou Manuel Soares, lembrando as extensões de saúde que fecharam em Meia Via, Ribeira, Pedrógão e Vila do Paço, bem como as que não têm médico de família, como Assentis e Chancelaria.

“Os cuidados de saúde têm de estar onde estão as populações e não onde os profissionais e as entidades responsáveis acham que devem estar”, defendeu o representante da CUSMT, refutando a alternativa da USF Cardilium como resposta aos utentes de Assentis.
Muito incisivo na sua intervenção, foi também o presidente da Junta de Freguesia de Assentis, Leonel Santos, reconhecido pela maioria dos presentes, entre população e representantes políticos, como um dos grandes impulsionadores desta luta a favor dos cuidados de saúde na freguesia.
O autarca lamentou “o estado a que chegou o estado da saúde em Portugal”, incluindo Assentis nesse quadro, e mostrou cansaço por “andar a mendigar há muitos anos”, junto da Câmara Municipal, por respostas para o problema na sua freguesia, “sem qualquer resultado”.
“O que mais me indignou foi a não continuação da médica que estava em Assentis. Essa senhora pediu-nos para ficar. E nós, disponibilizámo-nos para pagar o diferencial do vencimento que ia auferir para o Entroncamento, um valor de 1.300 euros cada mês. Assim, ficávamos com a situação totalmente resolvida na minha freguesia”, desabafou Leonel Santos, voltando a criticar a falta de apoio da Câmara Municipal nesta situação em concreto.
“O senhor presidente devia de ter mais empenho na resolução. As pessoas do público, são aquelas que lhe deram a maioria durante muitos anos. Mereciam mais empenho da nossa Câmara”, reforçou.
“Infelizmente, o que temos, senhor presidente, é uma mão cheia de nada”, concluiu o presidente de Junta.
Em resposta, o presidente da Câmara, Pedro Ferreira, lamentou o descrédito do presidente da Junta, Leonel Santos, garantindo que tem feito tudo o que está ao seu alcance para resolver o problema da falta de médicos de família no concelho.
Pedro Ferreira aponta “Bata Branca” como solução temporária para dar resposta à falta de médicos no concelho
O autarca, que disse estar ao lado das populações nesta luta, reconhecendo as suas dificuldades, reiterou que esta é uma situação que afeta todo o país e apontou para uma solução temporária, o projeto Bata Branca, em parceria com a União Portuguesa das Misericórdias (UPM) e a Administração Regional de Saúde – Lisboa e Vale do Tejo, que disponibiliza uma comparticipação no valor de 27 euros/hora para pagar aos médicos que possam estar disponíveis para a prestação de consultas nos serviços de saúde primários.
Por sua vez, a UMP estabelece parcerias com uma instituição local registada na ERS – Entidade Reguladora da Saúde – para que possa dar sequência à implementação do projeto enquanto entidade gestora, em parceria com a Câmara Municipal, a quem caberá a restante comparticipação aos médicos. Em Torres Novas, de acordo com Pedro Ferreira, a parceria será celebrada com a Santa Casa da Misericórdia local, que receberá do Município a comparticipação remanescente de 15 euros/ hora.
“Se houver habitantes de Torres Novas que conheçam médicos, médicos reformados de Torres Novas, ou da região, que não se importem de ganhar até 42 euros à hora, que venham cá, porque há formas e resolver este assunto”, apelou o presidente da Câmara, pedindo o apoio de todas as forças políticas para que juntos possam encontrar uma solução para o flagelo da falta de médicos.
De referir que durante a sessão da Assembleia Municipal, representantes dos diferentes partidos, mostraram-se solidários com a população de Assentis, mostrando-se disponíveis para colaborar com a autarquia e para fazer pressão junto das entidades responsáveis, no caso, o Ministério da Saúde, para que se encontre mais rapidamente, uma solução para o problema.