Falar sobre biodiversidade é pertinente nos tempos que correm mas, ao mesmo tempo, desafiador pois acaba por ser um tema tão vasto que o mais difícil é escolher sobre o que falar. Daí que todos os anos a Escola Secundária Santa Maria do Olival, do Agrupamento Nuno de Santa Maria, em Tomar, convide o conhecido biólogo Jorge Paiva para dar uma palestra sobre a temática. A última encheu o auditório da Biblioteca Municipal de Tomar, na tarde da passada sexta- feira, 17 de novembro, sendo esta a décima quarta edição das palestras sobre biodiversidade.

Aos 84 anos, Jorge Paiva continua a cativar a atenção de quem o acompanha e interroga, assumindo que se irrita quando o assunto são as alterações climáticas ou os fogos florestais dado que há anos que anda a tentar alertar consciências mas os seus ecos não chegam ao poder político. Por isso, avisou, apesar de ter sido convidado a dar contributos na questão dos incêndios não aceitou, por uma questão de princípio, o convite de nenhum partido político. Neste dia, deslocou-se a Tomar para falar do tema da Biodiversidade Humana, mostrando vários fotografias com exemplos de locais onde animais, ditos selvagens, como as raposas convivem de forma sã com as pessoas em meio urbano.

Uma das coisas que está a acontecer no globo terrestre é que os animais que se dizem selvagens – tais como o leopardo, o alce, a raposa (só em Inglaterra há 250 mil raposas urbanas – estão a mudar para o meio urbano. “A espécie humana entrou no meio rural com maquinaria, com pesticidas e produtos químicos e acabou com a cadeia alimentar. Deste modo estes animais foram obrigados a vir para o meio humano porque a cadeia alimentar está lá. Há uma inversão de habitats”, sustenta.

Há 14 anos que o biólogo Jorge Paiva se desloca a Tomar para falar de Biodiversidade e promover um jantar lusitano, não o fazendo em mais nenhum local Foto: mediotejo.net

Tudo porque, explicou, com as alterações constantes que os meios rurais têm sofrido ao longo dos tempos,  os animais cada vez mais procuram refúgio nos grandes centros urbanos. “Se soubermos lidar com eles, não nos fazem mal nenhum”, atestou.
A diretora do Agrupamento de Escolas Nuno de Santa Maria, Maria Celeste Sousa recordou que estas palestras e o respetivo jantar lusitano são o resultado do trabalho, entre professores, alunos e funcionários da Escola Secundária de Santa Maria do Olival. “É uma honra para nós, e para todos os tomarenses, ter alguém que nos dá grandes lições com muita sabedoria sobre muitos temos e, felizmente, acho que vamos todos aproveitando estando presentes nestas iniciativas”.

Após a palestra decorreu um jantar com uma ementa especial do tempo dos lusitanos Foto: mediotejo.net

O jantar lusitano, servido após a palestra, serviu para mostrar a riqueza da natureza com os presentes a puderem saborear paladares diferentes dos habituais tais como pão de castanhas, presunto de porco bízaro e preto, queijos de cabra e ovelha, castanhas e bolotas assadas, porco preto, javali, veado, coelho, pato, salada “Professor Jorge Paiva”, puré de maçã, castanha com cogumelos, salada de chícharo, maçãs bravo esmolfe, pudim de castanhas e requeijão com geleia de mirtilos. A próxima edição da Biodiversidade está já marcada para 16 de novembro de 2018.

ENTREVISTA

“A espécie humana está em risco de caminhar para uma extinção”

Porque razão escolheu o tema da Biodiversidade Humana?
Eu gosto imenso de cá vir porque vejo que é do agrado das pessoas e da escola. Já me pediram para fazer noutras escolas mas só faço nesta que aceitou o meu repto há 14 anos. Escolhi este tema porque todas as vezes que cá venho tenho que falar sobre a biodiversidade e procurar chamar a atenção para um tema. Uma das coisas que está a acontecer no globo terrestre é que os animais que se dizem selvagens – tais como o leopardo, o alce, a raposa (só em Inglaterra há 250 mil raposas urbanas – estão a mudar para o meio urbano.

Porquê?
Porque a espécie humana entrou no meio rural com maquinaria, com pesticidas e produtos químicos e acabou com a cadeia alimentar daí que essas espécies, onde se incluem as aves de rapina e carnívoros, têm que vir para o meio humano. A cadeia alimentar está lá. Há uma inversão de habitats.

Considera que, como muitos preconizam, estamos perante uma extinção em massa das espécies?
Não é só a extinção em massa, estamos numa extinção em massa onde a grande culpada é a espécie humana que está convencida que as outras todas desaparecem mas ela não. Eu já disse a várias pessoas que a espécie humana está em risco de caminhar para uma extinção. Ficam cá outras que vão evoluir noutro sentido. Nós dependemos de uma elevada biodiversidade.

O que podemos a fazer para inverter essa inevitabilidade?
Como esta gaiola é dirigida por políticos não há muito a fazer. É pena que grande parte deles não liga nem sequer ouve para aquilo que os investigadores científicos chamam a atenção. Quando o produto que o investigador interessa a esta sociedade mercantilista aproveita-a. Mas quando o investigador descobre que estamos em risco e que está a haver uma alteração climáticas isso já não interessa porque altera o processo desta sociedade mercantilista.

Já viajou por todo o mundo. Essa experiência permitiu-lhe obter um maior esclarecimento sobre o que se passa no meio ambiente. O que o motiva a espalhar a sua mensagem?
Eu falo muito com jovens para os alertar no sentido de, quando chegarem a adultos, termos políticos que se interessem por raciocinar nesta área. Por exemplo, nesta questão dos fogos, fui convidado por partidos políticos para participar em sessões de esclarecimentos. Não vou a nenhuma. Todos os partidos políticos são culpados desta situação. Estamos com um problema gravíssimo e isto só se resolve em várias legislaturas. Só se resolve com o acordo de todos os partidos políticos, com várias sessões no Parlamento, sobre o tema. Até hoje não houve nenhuma.

Elsa Ribeiro Gonçalves

Aos 12 anos já queria ser jornalista e todo o seu percurso académico foi percorrido com esse objetivo no horizonte. Licenciada em Jornalismo, exerce desde 2005, sempre no jornalismo de proximidade. Mãe de uma menina, assume que tem nas viagens a sua grande paixão. Gosta de aventura e de superar um bom desafio. Em maio de 2018, lançou o seu primeiro livro de ficção intitulado "Singularidades de uma mulher de 40", que marca a sua estreia na escrita literária, sob a chancela da Origami Livros.

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