Respeito. Pelo negrume da paisagem. Pelo intenso cheiro a fumo. Pelos rostos cansados e exaustos dos populares que olham para o horizonte. Pelos bombeiros. Respeito, acima de tudo, pela mãe natureza que nos cerca. Não é fácil descrever o cenário que encontrámos em Cernache do Bonjardim, Sertã, na tarde de segunda-feira, 19 de junho. Talvez a palavra certa seja “desolador”.

Para chegarmos ao posto de comando das operações montado num morro, na aldeia de São Macário, passamos uma primeira barreira de segurança, uma vez que a estrada está cortada. Autorização dada e prosseguimos. Ainda há uma frente ativa e todo o cuidado é pouco.
Avançamos em direção a um monte, cercados de árvores queimadas de ambos os lados. Ali em cima, o cenário é desolador (tenho que repetir a palavra). No céu, adivinhava-se o barulho de um helicóptero enquanto tentamos não ficar incomodados com o cheiro fétido do fumo.

No comando, bombeiros, Protecção Civil e jornalistas. Pedro Nunes, adjunto do Comandante Nacional, fez o ponto da situação para o mediotejo.net. Enquanto segurávamos a câmara, pequenos insetos picavam-nos a pele.
“O incêndio que durante a manhã prevaleceu em três frentes ativas foi controlado à tarde e já só temos uma, na parte mais a sul, na zona geográfica de Várzea de Pedro Mouro, Almegue e Mercador”, disse, acrescentando que o combate ao incêndio estava a ser feito com a ajuda de quatro “canadairs”, quatro aviões anfíbios médios, um helicóptero pesado e 300 operacionais apoiados por cerca de 70 viaturas. No teatro das operações também atuaram quatro máquinas retroescavadoras.

Os esforços que os bombeiros desenvolviam nesta tarde, muito quente, passavam por circunscrever toda a área que estava a ser consumida pelo incêndio de modo a que ficasse sob controle, para passarem à fase de rescaldo.
Sem mais delongas partimos ao encontro do presidente da Câmara da Sertã, José Farinha Nunes, que se encontrava num local não muito longe dali: no quartel dos Bombeiros Voluntários de Cernache do Bonjardim. Após uma descida algo sinuosa, e numa estrada repleta de torrões de areia, conseguimos sentir o pé no chão quando voltamos à estrada principal, onde os pirilampos das viaturas de emergência são uma constante.

No chão não passava despercebido o amontoado de garrafas de água e muitos alimentos. São doações de privados para ajudar os bombeiros, explicou José Farinha Nunes, salientando o espírito solidário bem patente nestes gestos. O autarca reconhecia que a situação estava “bem melhor” em relação ao dia anterior sendo que, apesar de tentarem colaborar com o combate ao incêndio de Pedrógão Grande, não conseguiram evitar que o fogo se estendesse ao concelho da Sertã.
José Farinha Nunes refere que falou com a Ministra da Administração Interna pessoalmente em Pedrógão Grande e explicou-lhe a situação concreta ao que, rapidamente, foram desenvolvidos esforços no sentido de reforçar o equipamento e os meios de combate ao incêndio. “Por isso, a situação está bem melhor e temos uma certa confiança nos meios que estão no terreno. Penso que será uma noite de mais descanso e não de preocupação e vigilância como a anterior”, disse.

O autarca explicou que os danos materiais são poucos – arderam duas arrecadações – e que a maior preocupação era a vida das pessoas. José Farinha Nunes salientou a dimensão humana do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que esteve na Sertã na tarde desta segunda-feira. “Fez questão de passar por aqui e deixar o seu espírito solidário e a sua preocupação o que nos dá conforto e agradecemos publicamente”, frisou.

E por falar em solidariedade explicou que as toneladas de produtos que estavam no Quartel de Cernache do Bonjardim – os bens destinam-se a ir para o terreno, para onde mais forem necessários, explicou a chefe do Agrupamento de Escuteiros 721 – provieram de ofertas quer de residentes no concelho mas também do concelho de Oeiras, agradecendo a solidariedade de todos, “muito importante nestes momentos”.
O autarca deixou ainda uma mensagem de tranquilidade à população, assegurando que a preocupação dos operacionais passa sempre por salvar vidas, embora nem sempre seja fácil convencer as pessoas a deixaram os seus bens para ficarem em segurança.
Deixando o quartel dos soldados da Paz, procuramos saber como é que as populações viveram a noite de domingo, 18, ocasião em que o fogo andou muito perto das suas habitações. Devido à frente que ainda se encontrava ativa na localidade de Várzea de Pedro Mouro, a estrada foi cortada devido ao perigo que podia representar para quem ali se atrevesse a entrar. Invertemos a marcha em Santa Madalena, não antes sem meter conversa com duas moradoras que olhavam, apreensivas, para a coluna de fumo no horizonte, a poucos quilómetros dali.

“Não fomos à cama. O meu marido andou toda a noite a circular com a carrinha com um depósito e cinco pessoas lá em cima até a estoirar. Andou tudo a arder até às cinco da manhã”, contou Isabel Santos à nossa reportagem. Dormir é algo impensável para quem anda com o coração nas mãos. Sabem que estão perto de um vale e que bastam poucos segundos para o incêndio lhes bater à porta.
“O que valeu foi os populares que ajudaram a combater as chamas. Não há bombeiros para tantas ocorrências. Havia muito vento mas conseguimos que não passasse para este lado”, contou.

Também Amélia David Leitão, moradora na Roda do Cabeço, não foi à cama esta noite. O incêndio não deu descanso a ninguém. O fogo andou no Brejo da Correia, no Sambado, Monte Minhoto, Santa Maria Madalena, no Almegue e Castelo entre muitas outras populações da freguesia de Cernache que se encontram mais junto ao rio.
“Ontem por esta hora (20h) isto era de noite. Foi uma grande aflição. O fogo corre tudo num minuto e anda por aqui perto ainda”, referiu, acrescentando que ainda não será hoje que vai dormir descansada. Nunca se sabe as voltas que a mãe natureza pode dar. Por isso, e por todos os outros motivos, os bravos de Cernache do Bonjardim mostram respeito. Muito respeito.
É uma vergonha cuja culpa pertence inteiramente ao Governo e às Entidades encarregues de vigiar
as florestas e segurança da população ! O incêndio de Pedrogão Grande deve ser explicado !!
O Ministério Público deverá abrir um processo contra o Estado pelo ocorrido !
A população deve, por isso, exigir a abertura desse processo !