O contingente português de 144 elementos que esteve no Chile a apoiar no combate aos incêndios florestais que atingem aquele país sul-americano chegaram ao final do dia 28 a Lisboa. Créditos: DR

Regressou o contingente português que esteve no Chile a apoiar no combate aos incêndios florestais que atingem aquele país sul-americano. Os 144 elementos chegaram ao final do dia 28 fevereiro a Lisboa, após terem estado empenhados em “cinco teatros de operações diferentes”.

As principais dificuldades no terreno prenderam-se “com a densidade florestal e do ordenamento da floresta”, começou por dizer ao nosso jornal Nuno Morgado, comandante dos Bombeiros Municipais de Sardoal, que integrou a Força Operacional Conjunta (FOCON) composta por bombeiros, militares da GNR, elementos do ICNF e pessoal médico – no Chile.

O contingente português de 144 elementos que esteve no Chile a apoiar no combate aos incêndios florestais que atingem aquele país sul-americano chegaram ao final do dia 28 a Lisboa. Créditos: DR

Em declarações a jornalistas no Terminal Militar de Figo Maduro, o chefe da missão da Força Operacional Conjunta Nacional da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC), Mário Silvestre, já havia adiantado que todos os palcos de intervenção eram “muito complexos” e de “grande dimensão”.

Nuno Morgado confirmou, dando conta que as espécies que compõem a floresta “são similares às nossas. É verdade que existe ali alguma expressão de algumas culturas, designadamente o eucalipto comum, que existe em Portugal. E também resinosas, um pinheiro muito similar ao nosso”.

O contingente português trabalhou na região de Biobío, uma das 16 regiões do Chile, cuja capital é Concepción. “Essa região é densamente florestada e com essas duas principais culturas florestais”, explicou dizendo que no ordenamento do território o país tem “os povoamentos entregues a privados, devidamente ordenados” contudo “as limpezas florestais” afetam o ordenamento. “A ausência dessa gestão provoca uma grande densidade de combustíveis florestais e isso foi um problema para nós”, admitiu.

O comandante falou em “grande dimensão” e “grande intensidade”. Um dos incêndios lavrava em cerca de 130 mil hectares, um flanco de mais de 100 quilómetros sendo que tal complexidade “obrigava a que tivéssemos as devidas precauções”, recordou.

Outro aspeto que afetou a atuação do contingente português “foi a orografia. O Chile encostado à costa do Pacífico e estando no alinhamento do anel de fogo, aquela atividade vulcânica, provoca a existência de algumas cordilheiras, ou mini cordilheiras, e do nada passa-se de uma planície para vales encaixados, montanhas com alguma elevação. Isso também foi um problema” por terem de trabalhar “em declives muito acentuados”, referiu dando como exemplo similar na região do Médio Tejo “os vales encaixados do Zêzere, na zona de Ferreira do Zêzere, Abrantes Norte, Vila de Rei”. A aumentar as dificuldades acresce “a ausência de caminhos florestais que permitissem aceder a esses locais de mais difícil acesso”.

O incêndio de Santa Ana, junto à cidade de Coronel, “foi o de maior dimensão e de maior intensidade no qual a força portuguesa esteve em ação”. Segundo Nuno Morgado tal incêndio “obrigou os operacionais da Força Conjunta Portuguesa a tomarem as devidas precauções para não correrem riscos desnecessários, que pudessem pôr em causa os operacionais”.

Nesse território com “um complexo de incêndios”, ou seja, “vários incêndios” numa “área muito extensa” que totalizaram os cerca de 130 mil hectares, “na semana passada, houve necessidade de procedermos à defesa de habitações na Estrada da Madeira, junto ao rio Biobío e aí houve a necessidade de fazermos a proteção de diversos aglomerados populacionais. Proteger diretamente as habitações através de ataque direto com os veículos dos bombeiros do Chile, ataque com ferramentas manuais para proteger habitações, pessoas e animais”, contou.

Contudo, ajudou no terreno “a formação” ministrada em Portugal e “os cuidados” tomados por parte dos operacionais. “Nunca houve problemas com as equipas que estiveram em intervenção”, garantiu.

O contingente português de 144 elementos que esteve no Chile a apoiar no combate aos incêndios florestais que atingem aquele país sul-americano chegaram ao final do dia 28 a Lisboa. Créditos: DR

A FOCON, como já referido, foi coordenada pela ANEPC e “integrava cinco forças distintas que iam trabalhar em complementaridade, começando pelo INEM, elementos das corporações de bombeiros de Lisboa e Vale do Tejo, integrados seis operacionais da região do Médio Tejo, elementos da força especial da ANEPC, elementos da Unidade de Emergência, Proteção e Socorro da GNR e da força de sapadores de bombeiros florestais do ICNF. É verdade que em escalas diferentes mas todos estes operacionais tinham alguma experiência no combate aos incêndios rurais. Em complementaridade tudo correu bem!”, assegurou.

No fim da missão, “por certo todos vêm mais ricos” afirmou Nuno Morgado quando questionado relativamente ao que retirou desta experiência. “A integração numa força conjunta, que incluía várias unidades portuguesas, cada uma com as suas características, com as suas singularidades mas com todos a trabalhar em conjunto de uma única forma e sob um único comando, coordenação, permitiu que que fosse uma experiência enriquecedora”.

Além disso “a possibilidade de combatermos incêndios florestais noutra latitude, noutro local do nosso planeta. Embora as caraterísticas fossem próximas, levou-nos a ter outros cuidados, acima de tudo cuidados com a segurança de todos os operacionais, garantir que todos aqueles que foram, regressaram”, acrescentou.

O contingente português de 144 elementos que esteve no Chile a apoiar no combate aos incêndios florestais que atingem aquele país sul-americano chegaram ao final do dia 28 a Lisboa. Créditos: DR

No Chile, especificamente na cidade de Concepción e nos locais onde a equipa portuguesa atuou “fomos muito bem recebidos pela comunidade, por toda a população. Desde o dia em que aterrámos em Santiago, a capital, na própria deslocação até Concepción”. Quanto às forças chilenas fala na Corporación Nacional Forestal “CONAF, a componente florestal no combate aos incêndios rurais, os próprios bombeiros [urbanos] de defesa de casas, e também das empresas privadas, tal como existe em Portugal, que fazem a defesa do seu património”.

Falou num trabalho “conjunto” tendo sido integrados “em muitas missões” nas equipas chilenas e “como os conhecimentos da força portuguesa são complementares aos conhecimentos e prática das forças chilenas houve um adequado funcionamento das equipas”, ou seja, sem necessidade de “grandes explicações” ou “aquisição de novos conhecimentos porque facilmente conseguimos trabalhar em conjunto” e “quase que não havia barreira linguística”, embora reconheça que os chilenos “têm uma organização própria, um pouco diferente da nossa em Portugal. Tivemos que nos adequar ao trabalho que eles pretendiam desenvolver e conseguimos”.

O contingente português de 144 elementos que esteve no Chile a apoiar no combate aos incêndios florestais que atingem aquele país sul-americano chegaram ao final do dia 28 a Lisboa. Créditos: DR

Para além de Portugal – que enviou a maior delegação da Europa-, Espanha e França também ofereceram ajuda, tendo Madrid disponibilizado duas equipas de combate a incêndios florestais terrestres, num total de 28 pessoas, e uma Equipa de Avaliação e Aconselhamento de Combate a Incêndios Florestais de dez peritos. França destacou uma equipa de 80 bombeiros.

Para Nuno Morgado a forma conjunta de atuação internacional, implementada pela ANEPC através de um mecanismo europeu de Proteção Civil a pedido das autoridades chilenas. “Permitiu ao Chile receber de forma organizada uma equipa muito grande e dar uma autonomia no apoio ao combate aos incêndios”.

O comandante considera que tal organização “deve ser replicada por mais países, incluindo Portugal porque necessitamos por vezes de ajuda de países aliados e temos de saber aproveitar os recursos que nos são disponibilizados para em conjunto conseguirmos resolver as ocorrências que aparecem, seja nos incêndios rurais”, nos quais os operacionais portugueses tem vasta experiência devido à tipologia e característica do território português, “mas também noutras áreas. Portugal teve duas Forças Conjuntas no exterior” no Chile e na Turquia, enumera defendendo que “cada vez mais tem de ser este o caminho”.

Relativamente ao verão que se aproxima, Nuno Morgado garantiu que “os bombeiros de Sardoal estão preparados de forma cabal para aquilo que chamamos o período mais critico dos incêndios rurais – de maio a outubro. Os bombeiros da região, e também a nível nacional, penso que também estão cabalmente preparados. As outras forças em complementaridade também conseguirão apoiar na atividades”.

O comandante dos Bombeiros, Nuno Morgado, durante a cerimónia de comemoração dos 65 anos dos Bombeiros Municipais de Sardoal. Créditos: Paulo Jorge de Sousa

No entanto, Nuno Morgado deixa algumas criticas à prevenção dos incêndios e à gestão florestal, considerando que Portugal deverá ir mais longe. Notou que não basta intervenção existindo “outros pilares” para o sucesso da defesa da floresta contra incêndios, ou seja da gestão integrada de fogos rurais.

“Temos de caminhar juntamente com os proprietários dos terrenos florestais para a gestão ordenada da nossa floresta”. Aponta igualmente a questão da fiscalização, da vigilância e de alertas coordenados por outras entidades. “Em conjunto levar a bom porto esta missão que é a defesa de pessoas, bens, floresta, ambiente”.

ÁUDIO: ENTREVISTA – COMANDANTE DOS BOMBEIROS MUNICIPAIS DE SARDOAL, NUNO MORGADO

Na cerimónia de regresso a Portugal, o ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro, sublinhou que se tratou da “maior força da União Europeia a apoiar o Chile”.

“Foi uma missão de 17 dias que se decidiu prolongar [por mais três dias], no âmbito do mecanismo europeu de proteção civil. Trata-se uma solidariedade da União Europeia para com o povo do Chile, na qual participou Portugal”, disse aos jornalistas.

Antes, dirigindo-se aos 144 operacionais naquele dia regressados ao país, José Luís Carneiro deixou “uma palavra de profundo reconhecimento” do primeiro-ministro, António Costa, e do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que pediu para “transmitir que muito oportunamente” os vai receber na residência oficial em Belém.

Também presente no ato solene, a embaixadora do Chile em Portugal, Marina Teitelboim, agradeceu “o excelente trabalho” da FOCON.

“Estamos a viver um momento complicado, mas Portugal enviou a maior delegação da Europa. Essa é a solidariedade que o povo português sempre teve com todas as causas do Chile. Somos países parecidos e sempre nos ajudamos. Quero agradecer. A vossa ajuda foi muito importante para nós”, afirmou.

O contingente português de 144 elementos que esteve no Chile a apoiar no combate aos incêndios florestais que atingem aquele país sul-americano chegaram ao final do dia 28 a Lisboa. Créditos: DR

De acordo com um balanço divulgado no sábado pelo Serviço de Prevenção e Resposta a Desastres (Senapred) do Chile, os hectares destruídos pelos incêndios nas últimas três semanas ultrapassam os 450 mil.

São os fogos mais mortais registados no país sul-americano nos últimos dez anos, com 25 mortes contabilizadas até ao momento.

O Ministério Público chileno está a investigar a origem e pelo menos 44 suspeitos por fogo posto já foram detidos.

No sábado, em todo país, foram registados 224 incêndios florestais. Quase 6 mil operacionais continuavam a combater os fogos ativos.

As regiões de Biobío, Ñuble e La Araucanía são as mais afetadas.

C/Lusa

Paula Mourato

A sua formação é jurídica mas, por sorte, o jornalismo caiu-lhe no colo há mais de 20 anos e nunca mais o largou. É normal ser do contra, talvez também por isso tenha um caminho feito ao contrário: iniciação no nacional, quem sabe terminar no regional. Começou na rádio TSF, depois passou para o Diário de Notícias, uma década mais tarde apostou na economia de Macau como ponte de Portugal para a China. Após uma vida inteira na capital, regressou em 2015 a Abrantes. Gosta de viver no campo, quer para a filha a qualidade de vida da ruralidade e se for possível dedicar-se a contar histórias.

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