O destino do edifício da Casa Grande, ou Casa dos Almeidas, em Sardoal, voltou a ser discutido na reunião de câmara desta quarta-feira, gerando discórdia entre o autarca Miguel Borges e o vereador socialista Pedro Duque, tendo este apresentado declaração de voto contra o ponto 5 da ordem do dia. Em causa estava a cessão de posição contratual do projeto de requalificação da Casa Grande e instalação do Hotel de charme à empresa Requisitos de Sonho, Lda., pertencente ao grupo económico da Marimi – Sociedade de Gestão Hoteleira, S.A. (promotor inicial), com contrapartida de requalificação do Externato Rainha Sta. Isabel para instalação da biblioteca municipal (atualmente localizada no edifício da Casa Grande). O PS questionou uma vez mais a legalidade dos processos, defendendo que deveria ter sido aberto procedimento concursal.

Pedro Duque, PS, (em substituição de Fernando Vasco, que pediu suspensão de mandato por 24 horas) referiu votar contra por via da coerência do que vem sendo defendido pelo Partido Socialista desde o início do processo, com quase 3 anos. O vereador justificou a sua posição declarando que o PS entende que “este processo podia ter sido desencadeado de uma forma muito mais transparente e de uma forma que não deixasse quaisquer dúvidas quanto à sua legalidade e quanto à sua transparência, efetivamente”.

“Não percebemos porque é que a Câmara, e em tempo foi alertada para essa possibilidade, não optou por ter feito um procedimento concursal, pondo de facto o espaço a concurso, para adjudicá-lo a quem tivesse melhores condições para desenvolver a candidatura”, esclareceu Pedro Duque, relembrando que pareceu ao PS, na altura da apresentação desta proposta do promotor, que “terá havido alguma precipitação [do executivo municipal], alguma vontade de mostrar de alguma forma um novo projeto por altura das festas do concelho”, entendendo notar-se uma certa estratégia política.

Para o socialista, “o tempo veio dar-nos razão” uma vez que o projeto apresentou desde início algumas fragilidades, opinião partilhada pelos companheiros de partido. Segundo Pedro Duque, o promotor pretende agora uma “nova possibilidade de negócio tendo já uma em curso, e o próprio vem assumir com este novo aditamento ao contrato que tem uma candidatura em curso, e por esse facto, não pode com a mesma possibilidade de sucesso apresentar candidatura no Sardoal”.

Quanto à empresa para a qual foi cedida a posição contratual, a Requisitos de Sonho, Lda., Pedro Duque (PS) mostrou-se reticente pelo capital social reduzido da mesma (5 mil euros), achando que isto possa ser um indicador de fraca viabilidade do projeto. “Alegadamente, e não temos possibilidade de verificar isso ainda, é uma empresa que fazendo parte do mesmo grupo económico, tem meramente 2 sócios, um com 4950 euros de capital e outro com 50 euros de capital, parece-me a mim – na minha opinião enquanto vereador e como técnico – que é uma posição relativamente frágil para quem quer financiar perante a banca”, disse.

A inexistência de apresentação de projetos de viabilidade económica e de projetos de arquitetura foram apontados como outros elementos que causam dúvidas ao PS, dúvidas essas que persistem até aos dias de hoje.

Questionado sobre a concretização do projeto, Pedro Duque assumiu não acreditar que se venha a verificar, pelo menos a curto prazo, ainda que reconheça as mais-valias para o concelho de Sardoal. “Muito sinceramente gostava de acreditar, tanto quanto desejo que fosse uma realidade, porque era uma oportunidade excelente para o concelho, não só valorizava o espaço como também o restaurava, porque é evidente a necessidade desse restauro, assim como proporcionava, pelo menos, mais dez postos de trabalho, e dava mais uma valência ao nosso concelho, que está deficitário nessa matéria (…) Gostava de facto de acreditar, mas não acredito que o mesmo venha a ser realidade a curto prazo (…) parece-me que o processo apresenta várias fragilidades”, concluiu.

“Tudo o que foi feito está dentro do quadro legal”, afirma presidente da CM Sardoal

Em declarações ao mediotejo.net, Miguel Borges, autarca sardoalense, explicou que o ponto 5, que fora aprovado por maioria com voto contra do PS, é “um procedimento administrativo normal” sendo que o promotor inicial, Marimi – Sociedade de Gestão Hoteleira, S.A., propõe esta cedência da posição contratual para uma empresa também do grupo (Requisitos de Sonho, Lda.) por ter um procedimento pendente vindo do quadro comunitário anterior, e tem “receio que isso possa ferir esta candidatura”.

Miguel Borges frisou que da parte da CM Sardoal tudo tem sido feito “para que o hotel seja uma realidade e principalmente para que a recuperação desta Casa, que é de interesse histórico”.

O autarca referiu que o projeto está aprovado pela Direção Geral do Património e que está em condições de dar entrada na Câmara Municipal para a sua aprovação final, salientando que o processo de candidatura está a decorrer, e deverá terminar no final do mês, segundo informação do promotor.

Confrontado com as dúvidas sobre a legalidade dos processos associados a esta proposta, o autarca lamentou que os vereadores socialistas não apresentem exemplos concretos que justifiquem a sua posição, lamentando ainda que nada tenha sido proposto/feito pelos mesmos no passado quanto ao estado de degradação do edifício em causa, uma vez que tiveram responsabilidades políticas na câmara e assembleia municipal em determinadas alturas.

“Nunca apresentaram uma única ideia ou uma única proposta, ou sequer chamaram à atenção alguma vez, durante todos os anos que estiveram na câmara como vereadores mas também o vereador Fernando Vasco, na altura, como deputado municipal, nunca houve uma palavra sobre este património que se está a degradar. Curiosamente, quando há uma solução, quando há uma proposta para solucionar este problema, aparecem todas as ideias. Toda a gente faria de forma diferente. Eles fariam de forma diferente e fariam melhor… Lamento que não o tivessem feito durante estes anos em que o edifício se foi degradando (…) Lamento que durante os muitos anos que tiveram responsabilidades políticas na câmara municipal, nunca tivessem levantado uma palavra sobre a Casa Grande/Casa dos Almeidas e a sua degradação”, lamentou o presidente da câmara.

Quanto às dúvidas do PS sobre a legalidade dos processos, o autarca reafirmou, em declarações ao mediotejo.net, o que disse em reunião de câmara. “Eu oiço falar em legalidade desde o primeiro dia em que apresentámos esta proposta, mas nunca ninguém foi capaz de dizer que é ilegal por este ou por aquele ponto”, assegurou.

A Casa Grande, ou Casa dos Almeidas, edifício onde se situa atualmente a Biblioteca municipal, deverá ser transformada num hotel de charme, segundo proposta do promotor privado. Foto: mediotejo.net

O autarca relembrou ainda que desafiou o PS, em reuniões de câmara e sessões de assembleia municipal onde o tema integrou a ordem do dia, “a fazer prova desta ilegalidade ou socorrerem-se da Inspeção-Geral”, porém passaram mais de 2 anos, e o partido “entregou todos os documentos e disse o que tinha a dizer à Inspeção-Geral de Finanças, o que é certo é que, passados quase 3 anos, ainda ninguém nos disse que aquilo que estávamos a fazer era uma ilegalidade”.

Miguel Borges afirmou que tudo foi feito “com base em pareceres jurídicos, consultámos os nossos advogados (…) o PS continua, desta forma, a meu ver irresponsável, a levantar suspensões de ilegalidade, sem dizer onde é que elas existem, mais, nem eles, nem ninguém por eles”.

Miguel Borges acrescentou que “fazer boa política não é isto, o Sardoal não precisa deste tipo de políticas. Precisa de políticas concretas, reais, e não levantar suspensões”, fazendo notar que o PS “está a pôr em causa todos aqueles que estão a contribuir (…) O hotel só é realidade depois de estar construído, e depois de estar aprovado. (…) O promotor está sujeito à aprovação dos fundos comunitários”.

Recorde-se que houve aprovação por maioria, em junho de 2016, a adenda ao contrato, que decidiu a contrapartida de recuperar o edifício do Externato Rainha Sta. Isabel, para instalação de uma nova biblioteca, referindo-se que partiu da proposta do promotor externo dirigida à autarquia, mediante cedência do edifício por 50 anos, e transformando o edifício da Casa Grande em hotel de charme, onde se pretendeu incluir a parte onde se insere atualmente a biblioteca municipal, no núcleo do edifício em causa.

“Dois edifícios importantes, duas grandes obras, praticamente a custo zero para a autarquia”, congratulou-se o autarca, relembrando que será um equipamento “que depois de pronto cria 10 postos de trabalho diretos, para além de todos os outros, é fundamental na nossa estratégia no âmbito do turismo, da fé e religiosidade, do património, e perante isto não acredito que autarca algum neste país – responsável – havendo um quadro legal para dar resposta a essa proposta, causasse entraves”.

Para o social-democrata trata-se de um ato de “coragem política”, uma vez que “a lei permite que seja feito assim, e não ando aqui para disfarçar ou fazer de conta que não era assim ou para arranjar outras formas. Há coragem política para fazer as coisas como tal, e foi isto que fizemos. Dentro da lei, não há ilegalidade absolutamente alguma, haveria outras formas de fazer, eventualmente até melhores, lamento é que quem tem essas ideias só as apresente depois de o assunto estar a ser resolvido”.

O objetivo, para o autarca, é apenas um: “a recuperação da Casa Grande com a recuperação do Externato e com o equipamento hoteleiro de oferta à região”, não vendo vantagens na abertura de concurso. “Não me parece que hajam assim tantos potenciais interessados em recuperar edifícios como este”, e considerando-se esta proposta aliciante em termos de nulidade de custos, “não faz sentido hesitarmos nestas coisas, porque pessoas com esta vontade, com esta disponibilidade, não nos aparecem todos os dias”, concluiu Miguel Borges.

A Casa dos Almeidas, ou Casa Grande, é um edifício senhorial localizado no centro da Vila de Sardoal e que, no âmbito de um protocolo com um promotor privado, será cedido por um prazo de 50 anos, para ali ser instalado um hotel de charme. O projeto implica a recuperação e ampliação da Casa Grande, adaptando-a a hotel de charme com capacidade para 43 quartos e representando um investimento global de cerca de 4 milhões de euros.

Joana Rita Santos

Formada em Jornalismo, faz da vida uma compilação de pequenos prazeres, onde não falta a escrita, a leitura, a fotografia, a música. Viciada no verbo Ir, nada supera o gozo de partir à descoberta das terras, das gentes, dos trilhos e da natureza... também por isto continua a crer no jornalismo de proximidade. Já esteve mais longe de forrar as paredes de casa com estantes de livros. Não troca a paz da consciência tranquila e a gargalhada dos seus por nada deste mundo.

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