4patasterapia sardoal
Foto: DR

No Dia Mundial do Cão, que se celebra a 26 de agosto, o mediotejo.net dá-lhe a conhecer um projeto terapêutico inovador, o 4patasterapia, sediado no Sardoal e desenvolvido por Carla Grácio – onde os patudos são responsáveis por ajudar a promover o bem-estar, a saúde e o desenvolvimento dos seres humanos.

O Dia Mundial do Cão começou a ser comemorado por influência norte-americana e surgiu para celebrar este animal e as suas qualidades, que são constantemente aliadas dos seres humanos e das suas atividades.

Além de servirem de companhia e conforto para diversas famílias, os cães ajudam a sociedade das mais variadas formas, desde o auxílio em atividades policiais, servindo de guias para pessoas invisuais, para deteção de drogas e explosivos, em ações de busca e salvamento, ou até a detetar casos de doença.

Nina, a “cãopanheira” de Carla, com quem iniciou este projeto, entretanto falecida. Foto: DR

No projeto 4patasterapia, a sua missão está mais ligada à vertente terapêutica, nomeadamente no que diz respeito a maleitas físicas, cognitivas, emocionais e relacionais. Para conhecermos melhor este projeto, fomos ao encontro da sua dinamizadora, Carla Grácio, formada em Gestão de Recursos Humanos, e que fez um curso de treino de cães em 2005.

Foi em 2015, ao ficar desempregada, que Carla escolheu um novo rumo, aceitando a sugestão de um professor do curso de treino que cães que tinha frequentado, e se pós-graduou em Terapias Assistidas por Animais, em 2016-2017. Foi também em 2016 que se juntou com a sua “cãopanheira” Nina – entretanto falecida – com quem iniciou o projeto, o qual arrancou em pleno no ano de 2019, uma vez que Carla foi mãe em 2017.

No jardim localizado à entrada da vila do Sardoal, ainda antes da povoação propriamente dita, vemos ao longe Carla Grácio a sair do carro com a sua companheira labradora, Rosita, que vem feliz e segura pela trela ao nosso encontro, cumprimentando-nos com vários “beijinhos” quando lhe tentamos dar umas festas no pelo macio.

Enquanto percorremos o parque à procura do melhor sítio para conversar, entre uns bancos ainda molhados pela água da rega e outros demasiado expostos ao sol, Rosita atravessa-se continuamente à nossa frente tentando cheirar todas as flores, inspecionar todos os recantos.

Carla Grácio e a sua cadela labradora, Rosita. Foto: mediotejo.net

Ainda com pouco mais de três meses, Rosita está em fase de treino, para daqui a uns tempos poder começar a trabalhar com Carla em “sessões” de Intervenções Assistidas por Animais. O que Carla faz é trabalhar em conjunto com um terapeuta, por exemplo um terapeuta da fala, o qual trabalha com a criança enquanto Carla leva o cão, o qual faz com que a criança fique mais motivada, solícita e empenhada.

Com o ‘4patasterapia’ são ainda dinamizadas outras vertentes com recurso ao melhor amigo do homem, como as Atividades Assistidas por Animais, onde são feitos vários jogos ou brincadeiras envolvendo o canídeo, não sendo necessário ter objetivos ou tempo definido nem a presença de um profissional de saúde ou educação, ou a Educação Assistida por Animais, desenvolvido em contexto escolar e educacional, como é exemplo o projeto de leitura para os animais.

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São assim vários os possíveis locais de intervenção e de aplicação deste projeto desde escolas, jardins de infância e bibliotecas, até centros de atividade, saúde e lares de 3ª idade.

Os benefícios são também eles múltiplos. “Muitas vezes a simples presença do cão é o suficiente para ajudar bastante a pessoa”, explica Carla, mas o auxílio do cão nestas sessões vai mais longe, uma vez que facilita a interação entre os terapeutas e o utente, conduz ao aumento da autoestima e confiança devido à ausência de crítica (o cão não julga), diminui a sensação de solidão, além de estimular a interação e sociabilização.

Mesmo a nível físico e de saúde, os benefícios são vários, como o baixar do ritmo cardíaco, o aumento da ocitocina (vulgarmente conhecida como a hormona do amor), o desenvolvimento da motricidade, através do pentear ou passear do cão, por exemplo.

São vários os exemplos positivos com que Carla já se deparou ao longo da sua atividade, referindo o caso de uma criança (ainda não diagnosticada, mas onde as suspeitas de hiperatividade e défice de atenção são por demais evidentes), cuja mãe ficou espantada com o facto de o filho falar tanta coisa sobre ele próprio, algo que nunca tinha acontecido nas variadas visitas a outros especialistas. A razão foi simples: a criança estava a dar festas ao cão.

“Algumas crianças podem ter algum medo, mas o que me tenho apercebido é que as crianças ultrapassam rapidamente esse medo. De qualquer das formas, a maior parte das crianças adora, quer brincar e é através dessa vontade de brincar que conseguimos trabalhar as outras coisas”, explica.

As cadelas Rosita e Fifi. Foto: DR

Carla tem neste momento duas cadelas, Fifi, uma podenga (ou arraçada) que resgatou na APA (Associação de Proteção dos Animais), em Torres Novas, muito meiguinha e que Carla acredita que pode trabalhar muito com idosos – uma vez que estes têm muita necessidade de toque e Fifi adora festas – e Rosita, a jovem labradora já apresentada que o quer é brincadeira, especialmente com crianças.

Entretanto estas duas cadelas estão ainda em fase de treino, o que “não é um processo de um mês ou dois”. Para se ter um cão preparado, “não se deve colocá-lo a trabalhar com menos de um ano de idade”, explica a dona destas patudas. 

O treino requerido é, essencialmente, de obediência: “Não é preciso o cão ser artista de circo, nem é esse o intuito. Claro que as crianças acham piada a algumas coisas que eles fazem, mas não é necessário.”

A improvisação é uma constante, consoante a situação, mas o treino básico de obediência tem de estar assegurado, pelo que também é necessário algum cuidado com os profissionais que dão estes treinos: “Há muita gente que não é formada a fazer estes treinos e acho que é importante ter essa preparação porque há vários aspetos a ter em conta, além de que é preciso que se conheça bem o cão”, explica Carla Grácio.

Embora o meio onde o projeto está inserido não seja “fácil” – noutros sítios, como em Lisboa, já há muitas atividades a serem desenvolvidas nestas áreas – e o ‘4patasterapia’ ainda esteja a dar os primeiros passos, está a haver algum reconhecimento e procura, especialmente por parte de pais que procuram ajuda diferente para os filhos.

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Mas os resultados não são imediatos. Em conjunto com Nina, Carla Grácio realizou mais de 20 sessões de terapia da fala, onde foram visíveis as melhorias e o surgimento de resultados.

“A continuidade é também muito importante, às vezes quer-se muito ver logo resultados – em tudo, não é só nestas terapias – e os pais, por exemplo, muitas vezes estão ansiosos por ver logo resultados nos filhos, mas não é assim”, explica Carla, enquanto troca a coleira de mão e dá uns biscoitos a Rosita. Podem surgir logo alguns sinais de melhorias, dependendo da criança, mas por norma não existe uma alteração de comportamento repentina num dia ou dois.

Mas também o bem-estar do cão não pode ser descurado. Na opinião de Carla, é também fundamental transmitir esta mensagem, a qual nem sempre as crianças têm facilidade em perceber: “Não podemos estar a obrigar o cão a fazer algo que ele não quer, temos de respeitar o bem-estar animal e é preciso ter isso em atenção.”

É também por isso que a dona da Fifi e da Rosita acredita ser importante a junção do cão mais o guia (do animal) com um profissional que trabalha a pessoa com qualquer que seja a sua necessidade específica. 

Carla Grácio considera ainda que nestes meios ainda predomina muitas vezes a ideia de que o cão é para estar na horta, acorrentado, para servir de guarda ou caçar, e não para auxiliar em projetos destes, mais sociais. Além desse fator, muitas pessoas até têm vontade de ser ajudadas pelo projeto mas depois não têm disponibilidade financeira, predominando também entre as pessoas uma habituação ao voluntarismo dentro destas ações, algo que é diferente deste projeto, conforme explica a sua mentora.

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Existem alguns apoios, como por exemplo na Cornucópia de Talentos – uma associação abrantina onde Carla coopera e também ela com perspectivas e ensinos diferentes – onde existe a ajuda do FINAbrantes.

Mas a verdade é que, pelo menos por enquanto, este é um projeto que não é para ganhar dinheiro, mas sim para não perder, o que leva a sua mentora a equacionar ter uma atividade diferente, paralela a este projeto.

Carla Grácio deixa ainda uma última palavra: “Todos sabemos que o cão é o melhor amigo do homem, e os seus benefícios estão mais do que provados, mas nem toda a gente pode ou deve ter um cão em casa”. É importante que primeiro se equacione se existe realmente essa disponibilidade, seja ela horária, financeira ou física, lembra.

Afinal, aquele que é o melhor amigo do homem e que em tanto o ajuda, merece que também o homem seja o seu melhor amigo.

Rafael Ascensão

Licenciado em Ciências da Comunicação e mestre em Jornalismo. Natural de Praia do Ribatejo, Vila Nova da Barquinha, mas com raízes e ligações beirãs, adora a escrita e o jornalismo.

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