De uma pele de amêndoa, de uma folha caída no chão ou até de um verso de um poema podem nascer um par de brincos, um colar, uma pregadeira ou mesmo um botão de punho. Obras de arte autênticas e diferentes que resultam da simbiose entre o processo artesanal de saber fazer e o gosto pela criatividade contemporânea e que saem da mente e das mãos de Charlotte Weiss. Inspirada nos mais singelos pormenores que nos rodeiam no dia a dia, o mediotejo.net foi conhecer a história desta artista de joias que ambiciona levar a sua joalharia de autor desde Vila Nova da Barquinha até além fronteiras.
“Tudo o que aprendemos com gosto forma-nos, torna-se parte de nós, refletindo-se naturalmente em tudo o que criamos…”. É deste jeito que Charlotte Weiss se apresenta ao mundo no seu recentemente criado site na Internet que, através de um ecrã de telemóvel ou computador nos permite apreciar as suas peças de autor, feitas manualmente e com a atenção merecida aos mais ínfimos detalhes. Mas nada como observar cada pormenor destas obras ao vivo e, para isso, a orientação dirige-nos para Vila Nova da Barquinha, mais concretamente para o espaço empresarial CAIS.

É aqui que as peças da artista de 34 anos ganham vida, no seu acolhedor ateliê no rés-do-chão deste ninho de empresas inaugurado em 2020 pelo Município de Vila Nova da Barquinha, data desde a qual a jovem adulta deixou para trás a sua improvisada oficina em casa dos pais, em Santa Margarida da Coutada (Constância).
Ao entrarmos no espaço, deparamo-nos com quatro paredes repletas de todos os apetrechos essenciais para produzir as diferentes e mais inesperadas peças: desde uma máquina de soldar, um maçarico, bigorna, martelos e alicates de diferentes feitios e tamanhos, moldes, cera, limas e outras tantas ferramentas que permitem dar origem a elegantes brincos, anéis, colares, pregadeiras e botões de punho, com o limite a ser ditado pela criatividade.

“Há coisas que saem mas ainda não são nada”, diz-nos a artista enquanto nos mostra uma pequena caixa com divisões onde guarda experiências inacabadas, esboços de futuras peças e pedaços de nada que podem a qualquer momento vir a ser tudo.
O gosto pela joalharia começou de forma discreta quando começou com a fazer experiências em massa FIMO (massa de modelagem também chamada de argila de polímero). “A minha mãe sempre foi muito de nos pôr a fazer coisas artísticas, fazíamos muitas vezes colares (…) Quando havia casamentos eu fazia sempre coisinhas para meter nos cabelos para mim, para as minhas irmãs. Enrolava arame com pedras com furinhos, ficava giro”, lembra Charlotte que confessa ter sido a única das irmãs que apanhou o gosto por esta arte.
Mas na hora de entrar no ensino superior, embora tenha deitado o olho a um curso de Design na área da joalharia, foi o de Conservação e Restauro que lhe encheu as medidas, no Instituto Politécnico de Tomar. Apesar de achar que era isso que queria fazer para o resto da vida, e de ainda hoje continuar a admitir a sua paixão pelo restauro, o destino veio provar-lhe que o caminho não iria ser apenas por aí.
“Eu acreditava – depois descobri que não é bem assim – que iria para um ateliê ou para um museu, mas o que aconteceu foi que comecei a andar de obra em obra, de um lado para o outro do país. Já trabalho nisto há 10 anos, e depois de estar nalgumas obras até de construção civil percebi que não era aquilo que queria fazer a vida toda. E comecei a tirar joalharia de autor, no Centro de Joalharia de Lisboa. Depois fui para o ateliê Allis Lab, e ainda continuo a ir lá de vez em quando”, confessa Charlotte.

Neste processo de redescoberta do gosto pela arte da joalharia de autor, a artista foi desenvolvendo a sua apetência pela estética naturalista e tem hoje na natureza a sua maior inspiração. “As minhas coleções são fruto do estudo permanente das formas, texturas e materiais numa abordagem contemporânea e delicada (…) onde os fragmentos da natureza evidenciam as suas formas, movimentos, cores e texturas”, refere.
Algumas peças com “inspirações mais óbvias”, outras assim nem tanto, a jovem não sai à rua sem o seu caderno. “Aponto tudo. Basta ir a algum lado, às vezes uma frase de um poema que me inspira, e no fim é juntar e começar a construir a coleção. Há peças que saem de uma frase, de uma raiz que vi no chão”, confessa.
“Por exemplo, de uma pele de amêndoa, através da eletricidade, revesti o material orgânico com cobre para ganhar espessura e consegui fazer um molde [com o desenho das linhas da pele de amêndoa] que me permite replicar peças”, exemplifica a jovem.
Além da inspiração, há outra máxima para que todas as peças concretizadas tenham o resultado final desejado: “Tento fazer sempre coisas que eu gosto”, sublinha.
Metais nobres, mais concretamente prata e prata plaqueada a ouro, são os materiais usados nas peças que saem das mãos de Charlotte. “Não é a joalharia clássica, são joias diferentes”, diz, explicando que todas as produções têm de passar pela Casa da Moeda para atribuição da marca de punção que comprova a veracidade do material das mesmas, a par das licenças que são necessárias para fabricar e vender produtos com estes metais nobres.

Admitindo que a sua vontade é a de trazer para região joalharia de autor, algo que defende existir pouco na região, a artista começou a expor e dar a conhecer o seu trabalho nas feiras, pouco tempo antes da pandemia de Covid-19 bater à porta e cancelar estes eventos.
“Quando fiz a primeira feira em Vila Nova da Barquinha havia muita gente que chegava ao pé de mim e dizia ‘ah, eu não sabia que havia este tipo de joias’. Eu estava a apostar nas feiras e de repente cancelaram as feiras e saiu-me um bocadinho ao lado”, recorda, lembrando no entanto o apoio que sentiu na altura e as vendas que conseguiu “a pessoas de todo o lado”.
“Depois disso, houve um decréscimo. Tenho cada vez mais seguidores e pessoas a comentar e a dizer que gostam, mas não compram”, expõe, admitindo que ainda não é possível viver a 100% da joalharia.
Mas a vontade de continuar a traçar o seu caminho de criatividade segue intacta e o orgulho que sente quando consegue corresponder aos pedidos específicos dos clientes é impagável.
Com vontade de ir dando uma mãozinha no restauro, Charlotte Weiss tem os seus objetivos bem definidos: “O meu objetivo é fixar-me em Vila Nova da Barquinha e ser isto. O objetivo é viver disto, vender em Portugal e depois começar também a lançar-me para o mundo”.