Renova instaura participação criminal a cidadãos que estavam junto à nascente do Rio Almonda. Foto: Um Colectivo

“A Renova confirma que apresentou uma denúncia contra incertos, junto das entidades competentes, por ter ocorrido a vandalização de uma vedação da Renova e posterior invasão de propriedade privada”, indicou fonte oficial da empresa Renova – Fábrica de Papel do Almonda, sediada em Torres Novas.

O convívio dos cidadãos no ‘Dia da Espiga’, em 18 de maio, feriado municipal em Torres Novas, foi organizado pela plataforma ecologista “Um Colectivo” e ocorreu junto à nascente do Rio Almonda, onde a empresa capta a água para a sua laboração.

Em comunicado, aquela plataforma especificou que a participação criminal incide sobre 12 cidadãos e criticou aquilo que considera ser uma “tentativa de intimidação”, indicando que “não abdicará, antes reforçará, a sua luta pela defesa do acesso público às margens do Rio Almonda e, em particular, à zona da nascente”.

“Nós achamos que esta participação criminal não passa de uma tentativa de intimidação daquilo que é um movimento que se tem afirmado, sobretudo, com a promoção da petição pelo melhoramento da nascente do Rio Almonda”, disse à Lusa Pedro Ferreira, membro do movimento e um dos 12 cidadãos identificados pelas autoridades por ter estado naquele local no dia 18 de maio.

Segundo Pedro Ferreira, a petição visa também “a remoção da vedação que, por agora, continua a impedir o acesso à nascente do Rio Almonda, que é de todos”.

Renova instaura participação criminal a cidadãos que estavam junto à nascente do Rio Almonda. Foto: Um Colectivo

Segundo indicou o membro do movimento “Um Coletivo”, o ‘Dia da Espiga’ tem sido marcado no concelho pela realização de “piqueniques em várias zonas” e foi isso que quiseram “levar à nascente do Rio Almonda, que é uma nascente que é de todos nós”, sendo “um dia de convívio, de comes e bebes, de piquenique e também de alguns mergulhos”.

“Foi um dia completamente inofensivo e todas as pessoas que lá estiveram, tiveram um bom momento. No final viemos embora e deixámos o local como estava”, assegurou Pedro Ferreira, refutando as acusações de invasão de propriedade privada e de atos de vandalismo.

“A Renova acusa-nos de invasão de propriedade privada e acusa-nos de dano. A única coisa que nós temos a dizer é que aquilo não é deles ou, mesmo que o terreno seja privado, está no domínio público e, portanto, podemos ir lá quando quisermos, não devemos nada a ninguém”, afirmou.

“Isto é um processo em que a acusação se baseia em provas obtidas de forma ilegal. E, portanto, eu acho que seria interessante o Ministério Público investigar de que forma é que a Renova captou imagens dos veículos das pessoas que foram notificadas. Ou seja, de que forma, porque foi através de câmaras de vigilância, qualquer pessoa que vá lá pode ver que são câmaras que estão apontadas para a via pública, e eu tenho muitas dúvidas, para não dizer quase certeza absoluta, de que a Renova novamente não tem licença para captar aquelas imagens”, afirmou.

“Portanto, não tem licença para a vedação, não tem licença para as câmaras, e o Ministério Público deve averiguar esta situação, obrigar a Renova a remover as câmaras, ou pagar uma coima, não sei quais costumam ser as penalizações por se fazer isto. Há pessoas que têm lá casas, não é? Portanto, sempre que se dirigem a casa têm de ser filmadas? Uma pessoa quer visitar a nascente, que é um monumento natural, um monumento cultural, tem de ser filmado pela Renova? Não, não acho que isso faça sentido nenhum. E por outro lado devem investigar novamente a situação da vedação, que encontra ilegal há uma série de anos. Isto compete a quem? Porque é que lá permanece? E obrigá-los a tirar, como é óbvio”, defendeu.

Segundo Pedro Ferreira, os 12 cidadãos identificados “já prestaram esclarecimentos à GNR”, estando o processo “na fase de inquérito”.

ÁUDIO | PEDRO FERREIRA, MOVIMENTO ‘UM COLECTIVO:

A Lusa questionou a empresa se este tipo de participação criminal já havia ocorrido mais vezes, tendo a Renova indicado ser este “o procedimento habitual em situações semelhantes, ocorridas, anteriormente, nos Centros de Produção da Renova”.

A fonte da empresa disse ainda que “o processo está em curso” e que a Renova “irá aguardar pelo seu desfecho”.

Em comunicado, a plataforma “repudia vivamente que uma grande empresa, que suporta a sua produção na utilização de um recurso público, se dedique a processar judicialmente cidadãos que apenas pretendem a fruição pública e pacífica da nascente do Rio Almonda, perante o repúdio e a revolta generalizada das populações da zona, que (…), desde sempre, consideraram o acesso à nascente do Rio Almonda como um direito de todos”.

Os protestos populares e de alguns partidos políticos começou em 2020, quando a empresa fechou a cadeado o acesso à nascente do rio Almonda, alegando motivos de segurança.

Em março de 2023, a Agência Portuguesa do Ambiente (APA), em resposta a um pedido de esclarecimentos da Assembleia Municipal de Torres Novas quanto à propriedade da água do Almonda, concluiu que, se bem que a propriedade da parcela é particular, “a água é pública”.

Antes, em 2021, a APA já havia afirmado, em resposta a um pedido de esclarecimento do grupo parlamentar do BE, que a Renova “não poderá impedir o acesso à nascente do Rio Almonda, nomeadamente, no que diz respeito à servidão do domínio hídrico”, salientando que qualquer intervenção/ação nesta faixa (10 metros contados a partir da crista e/ou aresta do talude da linha de água) “carece de autorização prévia”.

Na mesma nota, a APA disse que “não foi consultada relativamente a projetos de obra ou licenças de exploração comercial do espaço circundante da nascente do Rio Almonda, nomeadamente por parte da empresa Renova – Fábrica de Papel do Almonda, S.A., não tendo emitido qualquer pronúncia no âmbito dos recursos hídricos e do domínio hídrico”.

A Renova tem invocado ser proprietária do terreno onde se situa a nascente fonte do litígio, justificando a vedação do acesso ao público com a “perigosidade do local”.

C/LUSA

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