A crónica desta semana poderia começar com as expetativas em torno do novo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
Porém, antes disso, um registo de obituário para a perda de um dos grandes valores de representação cultural que ontem nos deixou: Nicolau Breyner. Cresci a vê-lo na televisão, em rábulas, em programas de humor e entretenimento, como apresentador, como ator de novelas, séries e filmes de cinema. Sempre o apreciei.
E há um pormenor mais reservado que sempre me incentivou a seguir a sua carreira. Guardo ainda um livro que a sua mãe autografou e ofereceu ao meu avô, da sua autoria, com o sugestivo título de “O meu noivo é um fantasma”. Aquando da primeira novela portuguesa, Vila Faia, as famílias rivais era os “Marinhais” e os “Marques Vila”. Nem de propósito a minha família paterna é da vila de Marinhais e de apelido Marques. Coincidências… Por isso sempre segui o seu percurso e agora que se foi só me recordo do seu último papel em “Os gatos não têm vertigens”, do António-Pedro Vasconcelos e no qual faz o papel do morto que aparece à viúva Maria do Céu Guerra.
O homem parte mas o legado fica. E neste caso fica muito.
Voltando ao novo Presidente da República, começo por dizer que aprecio muito o estilo de proximidade com que começa o seu mandato, repleto de afetos e de valores.
E lamento muito a atitude da esquerda na Assembleia da República. Aplaudir um Presidente não é concordar com ele – é felicitá-lo pela sua vitória e pela sua posse. É um ato de boa educação, de cortesia, de civismo. Não o fazer é um ato de tremenda falta de educação, de rudeza áspera de quem não sabe conviver em regime democrático.
O Presidente Marcelo dormirá tranquilo com isto. Até poderá esboçar um sorriso antes a crueza com que os paladinos das verdades absolutas e das morais supremas tão depressa atiram esses valores para as urtigas. Mas não deixa de ser um sinal, mais um, que nos é dado pela, alegadamente, democrática esquerda representada no Parlamento.
Na pretérita semana, estava eu ainda fora do país mas atento ao que por aqui se estava a passar, Camilo Lourenço, num notável texto publicado no seu mural no Facebook, alertava para um potencial perigo, que julgo importante retomar aqui, para memória futura. Escrevia ele e passo a citar: “Portugal é um país que se afastou da bancarrota devido às medidas tomadas em quatro difíceis anos. Mas não está muito longe dela. Tem de crescer e ter finanças públicas equilibradas, como disse ontem no seu discurso? Sim, mas não é a aumentar despesa que o país cresce. É reduzindo-a. É baixando impostos. E fazendo reformas muito duras, que ninguém quer perfilhar. Nem governo e, provavelmente, nem Marcelo. Porque elas geram a mesma impopularidade que desfez a presidência de Cavaco. Dou o benefício da dúvida ao novo Presidente. Mas se ele preferir os afetos ao realismo, o status quo às reformas, estarei aqui a criticá-lo com a mesma veemência com que critiquei Soares, Sampaio e Cavaco”.
E os resultados dos primeiros 100 dias da Geringonça a governar começam a apontar sinais de falhas graves. Primeiro as notícias de ontem. “Morgan Stanley corta as estimativas de crescimento para a economia portuguesa e diz-se “preocupada” com o risco de perda de competitividade e de queda no investimento”. Passa a ser feita uma separação clara: Irlanda e Espanha de um lado; Portugal e Grécia do outro. E isso só pode ser mau.
Depois o anedótico episódio do anedótico ministro da Economia. Caldeira Cabral pediu aos portugueses para não se abastecerem de combustível em Espanha e considerou que seria civismo se assim acontecesse, ao invés de iremos deixar os impostos do outro lado da fronteira. Não, não é uma anedota. Os portugueses querem lá saber onde pagam os seus impostos. Querem fazer a melhor compra, a mais barata. Só tenho pena de Lisboa não fazer fronteira com Espanha; caso fizesse também eu lá iria abastecer-me. O preço dos combustíveis subiu mas os impostos, ao contrário do anunciado, não desceram. E a geringonça gostaria que os ajudássemos.
A geringonça gostaria de ter muito mais ajudas. Por exemplo, João Galamba tentou ontem fazer o PSD refém do voto favorável no OE, a pretexto de um argumento esfarrapado relacionado com um projeto de resolução apresentado em Outubro do ano passado pelo PSD em torno dos compromissos europeus de Portugal. O PS está aflito porque os seus parceiros da “coligação negativa” de esquerda já anunciaram que não votarão favoravelmente estas propostas de alteração ao OE. Sempre que a esquerda mais radical dá um grunhido o PS olha para o PSD em busca de socorro, de apoio. Para quem não aceitou o repto da coligação que venceu as eleições legislativas, com maioria relativa, para um entendimento de regime, é preciso lata, despudor, hipocrisia e sentido de perversidade vir agora com estas lamúrias.
Este país está cada vez mais estranho…