Convidámos os diretores das bibliotecas municipais do Médio Tejo a fazerem as suas recomendações neste espaço, de forma alternada, todas as sextas-feiras. Esta semana, “Irmão Lobo”, de Carla Maia de Almeida, é o livro sugerido por Margarida Teodora Trindade, diretora da Biblioteca Municipal Gustavo Pinto Lopes, em Torres Novas.
Passe pela biblioteca… e boas leituras!
Há irmãos que não nascem dentro da família, antes entram para dentro da família, são absorvidos por laços invisíveis e tornam-se família.
Há histórias onde o “lobo-mau” pode ser a crise que assola um país ou o desemprego, que destrói uma família.
Há lobos que se tornam irmãos de meninas de oito anos e que, nas memórias do “para sempre”, ficam parte da família e aparecem nos retratos.
Carla Maia de Almeida escreveu, António Jorge Gonçalves ilustrou e a Planeta Tangerina editou.
Neste livro conhecemos uma família que se confronta com o cenário e com as consequências de uma crise que se instalou no seu país. Uma família que se confronta com a inesperada situação do desemprego de um pai. Conhecemos nessa família uma miúda de oito anos (a mais nova de três irmãos) que, em processo de sobrevivência emocional face à inesperada situação, emana de si um esforço de compreensão e de maturidade alternados com uma doce ingenuidade criativa, num mundo quotidiano onde ela própria
cria e constrói os seus cenários imaginários, nos quais dá outros nomes às personagens de quem depende e que giram à sua volta, entre elas, o seu cão-lobo, um husky.
É um livro para todas as idades, uma história onde o final é, afinal, apenas um recomeço, um outro caminho, uma vida inteira pela frente.
O passado é só uma parte dessa história, é somente aquilo que permite que uma menina de oito anos seja uma sobrevivente.
Do rasgo da autora, Carla Maia de Almeida, nasceu uma história bonita, na qual a expectativa, a desilusão, a perda, a recuperação e a resiliência marcam o ritmo. Ocorre-nos, portanto, depois da leitura deste romance, perguntar: nunca será a realidade uma história bonita? Às vezes não é, sabemos. Porém, Carla Maia de Almeida confere estilisticamente uma beleza imensa a esta
narrativa. E essa beleza é o reflexo de uma escrita onde habita a sensibilidade, sem dar azo a “lamechices” desnecessárias ou a “infantilizações” desapropriadas.
Estamos perante uma escrita onde se percebe o enorme respeito da autora por todas as personagens que criou, mas não menos um enorme respeito pelos leitores deste “Irmão Lobo”.
É uma narrativa de uma enorme verosimilhança e de uma delicadeza, vocabular e cénica, invulgar. No texto vivem e respiram, em simultâneo com as personagens, imagens e metáforas que compõem a narrativa e os cenários descritos que a ilustração, por seu lado, com recurso a duas cores apenas, completa e enriquece.
Ora, a ilustração deste livro, diga-se muito justamente, acrescenta e dinamiza a relação com o leitor, e, de forma genial, marca o tempo da narrativa no romance: o passado e o presente.
Escolhido, em 2014, para o catálogo “White Ravens” dos 200 melhores do mundo, este livro que nos conta a história de uma família que coleciona alcunhas e de uma menina que escolheu ser maior do que a tristeza, é um livro que está traduzido em vários países e que se encontra disponível para empréstimo na Biblioteca Municipal Gustavo Pinto Lopes.