Francisco Romãozinho. Créditos: DR

“Gostava de ser recordado como alguém que só olhava para a frente”
Francisco Romãozinho (1943 – 2020) 

Casado, pai de duas raparigas e de um rapaz, Francisco Romãozinho morreu em Lisboa, esta quinta-feira 12 de março, na sequência de complicações do seu estado de saúde (sofria de Parkinson e polineuropatia). Completaria 77 anos no próximo dia 28 de março. O seu corpo será cremado em Lisboa, estando prevista a realização de uma missa de 7º dia em Alvega, terra que adoptou em 1974, quando ali comprou o Monte da Várzea.

*Com Joana Rita Santos

O nome de Francisco Romãozinho fica para sempre ligado a uma época áurea na história do desporto automóvel nacional. O primeiro piloto de ralis português a conduzir um carro oficial, um Citroën DS 21 (o mítico ‘boca de sapo’), ao volante do qual se fez campeão no Rali TAP em outubro de 1969. Aquele momento que considerava ser “o melhor” da sua carreira, ano em que também ganhou a Volta a Portugal, em março, e o Campeonato Nacional de Velocidade, no verão, ao volante de um BMW.

Foram 42 anos dedicados à competição, de 1962 a 2004, ainda que com alguns interregnos. A primeira experiência na adrenalina da velocidade correu-a no Rali das Termas de Monfortinho precisamente em 1962. Nada fazia prever que o único filho de um médico albicastrense, rapaz tímido que o pai desejava mais aberto, agarrasse o volante do desporto automóvel e se transformasse num campeão nacional e internacional.

Francisco Romãozinho viria a ter um destino maior que não cabia na pequena cidade de Castelo Branco, sendo o primeiro passo para a mudança, a decisão de aos 16 anos ir viver para Lisboa, onde mais tarde ingressou na Faculdade de Arquitetura. Escolha premiada pela avó materna de Alvega, Joana Ruivo, que lhe ofereceu o seu primeiro automóvel; um Mini Cooper. À arquitetura deixou-a ficar pelo caminho para se dedicar a outras estradas. As primeira provas venceu-as em 1965. No ano seguinte sagrava-se campeão em Espanha, mais propriamente em Vigo.

Um piloto com vitórias marcantes, algumas derrotas, que sempre fez várias coisas ao mesmo tempo, com a consciência da dificuldade de fazer bem se o número ultrapassar as três, dizia. Talvez por isso tenha aceitado a função de administrador de empresas do ramo automóvel, como a Citroën, a Fiat ou a Siva enquanto pilotava carros de corrida. Uma carreira paralela onde trabalhou mais de 20 anos à qual juntava o gosto pela agricultura e pelo turismo. Ainda nos automóveis foi Francisco Romãozinho quem trouxe para Portugal a marca Skoda. No marketing destacou-se como responsável pelas marcas Volkswagen e Audi.

As fotografias da sua história, algumas, encontram-se expostas no Bar da Esquina, no Monte da Várzea, unidade de turismo rural, em Alvega (Abrantes), com a qual sonhou toda a vida e se dedicou após a reforma. Tem por exemplo imagens na fábrica de Palmela com Eduardo Catroga, então ministro das Finanças, ou em Paris, na fábrica da Citroën, e com Mário Soares numa salão automóvel da Fiat.

Francisco Romãozinho sabia ultrapassar os obstáculos da vida, sabia que perdeu muitas provas por azar, que poderia ter ganho o Rali de Portugal três vezes. Por isso, dizia que se tivesse tempo para escrever um livro não seria sobre as vitórias mas sobre as derrotas.

Teve um susto valente no Rali dos Alpes Austríacos, onde deu uma cambalhota, ficou de rodas para o ar no meio da estrada após ficar sem travões, sem direção e sem caixa de velocidades. A perícia de piloto campeão permitiu um final feliz, apesar dos trambolhões.

Certa vez deslocou-se a Moçambique para receber um troféu com o nome do seu copiloto José Arnaud, entretanto falecido, e com quem se havia irritado por este não descansar o suficiente para as corridas. Entregou o troféu à família de Arnaut.

Conhecido como o senhor DS, Francisco Romãozinho afirmava, no entanto, ser um Maserati disfarçado de Citroen, o carro que guiou com maior potência, e que teria 250 cavalos.

A unidade de Turismo Rural em Alvega comprou-a em 1974, inicialmente com 15 hectares, que transformou em 130 onde, nos últimos anos, fez planos, delineou projetos e explorou também a agricultura. Naquele espaço turístico construiu duas pistas, uma de autocross e outra de motocross, para poder acelerar à vontade e permitir que os seus hóspedes ali “fizessem uma perninha”.

A sua última prova foi ao volante de um Nissan Navarra da equipa da SIC, nas 24 Horas de Fronteira. Chegou a confessar que gostava de ser recordado como “alguém que só olhava para a frente”.

Paula Mourato

A sua formação é jurídica mas, por sorte, o jornalismo caiu-lhe no colo há mais de 20 anos e nunca mais o largou. É normal ser do contra, talvez também por isso tenha um caminho feito ao contrário: iniciação no nacional, quem sabe terminar no regional. Começou na rádio TSF, depois passou para o Diário de Notícias, uma década mais tarde apostou na economia de Macau como ponte de Portugal para a China. Após uma vida inteira na capital, regressou em 2015 a Abrantes. Gosta de viver no campo, quer para a filha a qualidade de vida da ruralidade e se for possível dedicar-se a contar histórias.

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