Como noticiámos no final de setembro, Nuno Gomes, abrantino, professor de educação física e treinador de futebol, partiu para a China, onde passou a integrar os quadros técnicos da Academia de Futebol de Luís Figo naquele país asiático.
Agora, a nosso convite, Nuno Gomes escreve sobre o primeiro mês da sua experiência e conta-nos, na primeira pessoa, como tem sido a sua nova vida do outro lado do mundo.
“E já passou um mês desde que cheguei à China para integrar a Academia Winning League Luís Figo. E que aventura… todos os dias são preenchidos com aprendizagem profissional, cultural e essencialmente emocional.
Inicialmente estive uma semana em Pequim, que serviu sobretudo para conhecer a forma de funcionamento da academia, treinos, planeamentos, e para ir solidificando o meu processo de adaptação. Findo este período, fui para Shenzhen, para iniciar uma nova academia Winning league naquela cidade.

Shenzhen situa-se a sul da China, muito perto de Macau e Hong Kong, tem cerca de 15 milhões de habitantes, o dobro da população portuguesa… e com uma temperatura média acima dos 30 graus. Senti-me em Portugal. O problema é a humidade, que chega a rondar os 70%, o que dificulta o processo de treino devido ao facto de ter de haver diversas paragens para hidratação. E os treinos ao fim de semana têm início às 8 horas da manhã…

Outro aspeto muito diferente do Ocidente é a alimentação. Aqui já vi de tudo. Quando digo tudo refiro-me a animais que para a nossa cultura são de estimação mas que para os chineses são uma autêntica iguaria. Ainda por cima é cara, diga-se de passagem. Apesar de ser extremamente barato comer num restaurante, uma refeição custa 10 a 15 Yuans (que equivale a sensivelmente 1 a 2 euros) opto por comer em casa para ter uma alimentação mais parecida com a que tinha em Portugal. Existem muitas especiarias idênticas às que temos no nosso país, o principal problema é o azeite, não há melhor azeite que o português!

O meu dia-a-dia tem sido dividido entre reuniões preparatórias com o staff da academia, planeamentos, treinos e casa. O staff é constituído por um manager, dois treinadores portugueses (o meu colega Ricardo Marques é natural de Penalva do Castelo e foi treinador, nos últimos seis anos, na formação do Futebol Clube do Porto), dois treinadores adjuntos chineses, que falam bem inglês, e um tradutor.

À margem do treino tenho aproveitado para conhecer melhor a cidade. Apesar de, na minha cidade natal, estar habituado a andar a pé de um lado para o outro, em Shenzhen a pé só consigo conhecer a urbanização onde moro. Mas já consegui ir à praia (neste pormenor sinto um pouco falta de Portugal), e andar de bicicleta, que é o meu meio de transporte, para zonas onde não haja prédios de trinta andares, não conheço muitas…

Relativamente à parte prática, treinamos todos os dias exceto à segunda-feira. Nesta fase inicial, o planeamento é composto unicamente pelo desenvolvimento e aptidão motora com base no treino, posteriormente começaremos a organizar convívios desportivos entre academias. A Winning league está num espaço muito bom, composto por 10 campos de futebol recentemente inaugurados, onde existem mais 6 academias a funcionar, desde a Academia do Borussia de Dortmund, à do Athletic Club de Bilbau e também a própria academia da cidade de Shenzhen, que tem treinadores exclusivamente oriundos do Brasil.
As crianças chinesas adoram futebol, as que fazem parte da academia adoram o treino, querem aprender e falam muito no “C lao” (Cristiano Ronaldo) Os pais idolatram o “Figuee” (Figo).
No geral, não apresentam uma desenvolvida motricidade, pois não existe futebol de rua na China e a grande maioria das crianças chinesas passa parte do tempo livre em casa. Poderá haver uma relação causa-efeito.

Está a ser uma enorme aprendizagem. Um desafio futuro, no que à alimentação diz respeito, será o de ganhar coragem para provar uma das melhores iguarias, dizem eles, da China: cobra.
Um forte abraço para Portugal, especialmente para a cidade de Abrantes, e um saudoso olá para a minha família e amigos.”