Sempre tive o secreto desejo de escrever a partir de locais que visitasse.
Infelizmente e porque o dinheiro é sempre coisa que rareia por estas lados – e penso que na generalidade das pessoas que conheço sucede mais ou menos o mesmo – as viagens são as possíveis e, no caso desta semana, procuro conciliar uma viagem em serviço com a possibilidade de conhecer um pouco mais e melhor um local que nunca antes tinha visitado: Varsóvia. É tudo muito a correr mas sempre existe a curiosidade e a oportunidade para mais do que chegar e partir.
O povo é acolhedor, hospitaleiro, prestável. Esforçam-se por falar inglês, cada vez mais a língua universal, embora no centro histórico da cidade tenha tido algumas dificuldades de comunicação com alguns interlocutores.
A cidade está em franca animação, explosão, crescimento, desenvolvimento. Penso que será uma grande metrópole dentro de poucas décadas.
É ainda um local cinzento, austero mas que possui dinâmica de crescimento que se sente um pouco por todo o lado. Noto ainda alguns contrastes mas direi que me surpreendeu pela positiva. Arrumado, impecavelmente limpo na zona histórica e nas avenidas novas, repletas de edifícios modernos e gente que se veste com classe, é uma cidade que merece mais atenção em próxima viagem. Mas entre Abril e Setembro. Está bastante frio agora.
Nas zonas ainda não intervencionadas sentem-se reminiscências dos tempos do “bloco do leste”, pela arquitetura dos edifícios, pelo arranjo das ruas, bermas e passeios, pela estrutura comercial existente, pela indumentária das pessoas, pelo poder de compra que aparentam (ainda) não ter. Afinal o movimento “Solidariedade” (Solidarność) não tem ainda muitas décadas e Lech Wałęsa terá sido um homem simples mas com uma ampla visão e abertura. Teve uma grande ajuda do Papa de então, João Paulo II (o polaco nascido em Wadowice, de nome próprio Karol Józef Wojtyła), ele próprio um opositor dos regimes comunistas e um apoio enorme da abertura da Polónia na década de 80.
A zona histórica é bonita, impecavelmente arranjada, repleta de história e monumentos, universidades e jardins, espaços onde Chopin (o nome Chopin é uma derivação do nativo Szopen, embora o pai fosse um francês expatriado) ocupa lugar de destaque. Por todo o lado é Chopin, expoente cultural que procuram potenciar. E estão a conseguir fazê-lo. Há roteiros de Chopin em todo o lado do centro histórico e ainda tenciono visitar o museu com o seu nome. Se o tempo o consentir.
As igrejas são bonitas, acolhedoras, quentes, iluminadas, repletas de história. Por todo o lado nota-se uma fé católica muito forte e uma adoração a Cristo e à Virgem, em simultâneo, que vejo como paralelismo para com o nosso país.
Nos acessos às zonas novas de escritórios e serviços as avenidas são largas, os transportes parecem muito bem organizados, entre metro, autocarros, comboio ligeiro e comboio mais pesado.
O mais importante que fica das viagens é o que a memória retém. As cores, as pessoas, a gastronomia, os espaços, os edifícios, a arte, as galerias e museus. Mas, sobretudo, a identidade de um lugar. Quando visitamos um lugar com forte identidade, é impossível que essa identidade não nos toque, não passe a fazer parte de nós. É um ato mágico, por osmose. Passamos a sentir que esse lugar faz parte de nós e que nós passamos também a fazer parte desse lugar.
Por isso, esta semana cumpri um sonho: escrever uma crónica em viagem. Enviá-la daqui deste canto da Europa, esperando que possa ser um ato que repita. Já uma vez fiz um programa em direto para a rádio a partir de Londres mas uma crónica é uma estreia. E eu gosto destes desafios.