Comissão de Utentes da Saúde do Médio Tejo assinala 20 anos de atividade e enaltece parcerias com autarquias, ACES e CHMT Foto: mediotejo.net

A abertura da sessão evocativa dos 20 anos de trabalho da Comissão de Utentes da Saúde do Médio Tejo (CUSMT), que decorreu ao final da tarde de sábado, 18 de março, na Biblioteca Municipal de Torres Novas, coube ao presidente da Câmara Municipal de Torres Novas, Pedro Ferreira, que sublinhou a “resistência” de uma associação “atuante e persistente”, constituída por um grupo de pessoas muito participativas e presentes.

“Não é uma associação que aparece de seis em seis meses para dizer alguma coisa. É uma associação que procura, permanentemente, o diálogo com os parceiros e com os poderes. Quando as coisas correm bem, para melhorar, quando correm mal, para reivindicar”, reforçou o autarca, notando que, aos dias de hoje, “as coisas não têm corrido tão bem”, por isso mesmo, a CUSMT é “cada vez mais atuante e persistente”.

Fazendo referência ao “estado da saúde” na região do Médio Tejo, Pedro Ferreira lamentou, enquanto autarca, nem sempre poder corresponder às necessidades sentidas, por não ter autonomia para tal, lembrando que “há uma política nacional, condicionada a tempos melhores ou piores em termos económicos, que por vezes compromete tudo o que é desejável.”

“Vinte anos são 20 anos. Merecem o respeito de toda a região e merecem o nosso aplauso”, concluiu o presidente da autarquia torrejana, evocando “todo o trabalho e dedicação” da CUSMT “numa área tão importante como é a Saúde.”

Utentes da Saúde assinalaram duas décadas de atividade. Foto: mediotejo.net

Convidado a intervir na cerimónia, Francisco Dinis, deputado do PS na Assembleia da República, evidenciou o mérito da CUSMT, em manter viva, há duas décadas, sem interrupções, a sua atividade, numa altura em que é “muito difícil” fazer vingar movimentos ou associações.

“Hoje, a realidade com que se encaram, não é a mesma com que se encaravam há 20 anos, ou até, há 10 anos. O mundo mudou, a forma de comunicar também mudou, a forma de captar a atenção ou de trazer pessoas para esses movimentos, associações ou comissões, também é diferente. Por isso, é de salientar a resiliência que é precisa para levar avante este trabalho que é tão importante para a nossa região e para o nosso país”, afirmou.

“O Serviço Nacional de Saúde (SNS), está como nunca esteve, sob um ataque cerrado. Não há que ter medo de dizê-lo. Longe vão os tempos em que o SNS, com tranquilidade, dava resposta às necessidades, com estabilidade, com sustentabilidade. Ia fazendo o seu próprio caminho. Hoje, tem um embate difícil, com muitos movimentos e muitas forças que o querem ver derrubado. Por isso, todos somos poucos para o salvaguardar”, evidenciou o deputado, defendendo o “SNS como o motor de resposta à Saúde em Portugal”.

Em representação do Centro Hospital do Médio Tejo (CHMT), falou o presidente do Conselho de Administração, Casimiro Ramos, que na sua intervenção agradeceu a cooperação da CUSMT enquanto parceira do CHMT.

“Desde sempre tenho expressado que vemos a CUSMT, as autarquias, forças de segurança, Instituições Particulares de Solidariedade Social, bombeiros e demais entidades, como parceiros. E assim tem sido com a CUSMT, pelo que agradecemos o contributo constante ao longo dos anos, contribuindo para melhorarmos os cuidados de saúde que prestamos a todos os nossos utentes. Faço votos para que esta cooperação assim continue”.

ÁUDIO | Casimiro Ramos, presidente do Conselho de Administração do CHMT

Em relação aos desafios do CHMT , Casimiro Ramos evidenciou o trabalho que está a ser feito no âmbito da melhoria do acesso aos serviços e garantiu aos utentes a máxima dedicação naquela que é a grande missão da instituição, “diminuir e sofrimento e salvar vidas”, o que pressupõe “facilitar o acesso das pessoas ás urgências, às cirurgias e às consultas”.

Um desafio que o CHMT percorre através de um conjunto de medidas que tem vindo a implementar. Entre as quais, um protocolo com o ACES Médio Tejo, que permite encaminhar “doentes não urgentes” identificados na triagem de urgência para um centro de saúde, assegurando vaga no dia seguinte. Com 15 a 20 vagas garantidas, por dia, Casimiro Ramos reconhece que a aceitação dos utentes não tem sido a esperada, muito por “uma questão cultural.”

Por outro lado, destacou um projeto recente com alguns Lares Residenciais e Centros de Dia da região, que tem como objetivo “desviar” ou “diminuir” as visitas às urgências hospitalares dos utentes daquelas instituições. Para tal, vai ser destacada, semanalmente, uma equipa médica de enfermagem para fazer essas visitas nas referidas instituições, contribuindo assim para “desentupir as Urgências”.

Muito em foco na sessão, esteve o tema dos Cuidados de Saúde Primários e as dificuldades sentidas em responder com eficácia, rapidez e qualidade aos utentes da região, o que contribui em larga escala para o entupimento das urgências hospitalares, com “doentes não urgentes, que não encontrando resposta no seu centro de saúde, recorrem ao hospital.

Um facto que Diana Leiria, diretora executiva do ACES Médio Tejo, não negou, evidenciando as dores sentidas no terreno, muito por culpa da falta de investimento.

“É inegável. Os números mostram que o investimento é praticamente todo feito nos cuidados hospitalares e que os cuidados de saúde primários levam uma fatia muito pequena. Embora, todos os anos, Governo após Governo, todos digam que os Cuidados de Saúde Primários são o pilar do SNS e todos sintam uma paixão enorme pelos Cuidados de Saúde Primários, mas depois, digamos que o financiamento não corresponde a essas palavras”.

Uma situação que se reflete negativamente no terreno, como exemplificou Diana Leiria: “Falta de recursos humanos, (e no nosso caso, uma incapacidade de captar e reter novos médicos de família). Mas também, [carência de investimento] nas instalações, climatização, viaturas para os domicílios ou equipamento básico”.

Uma realidade que a responsável espera ver modificada a partir do próximo ano, por via da execução do PRR – Plano de Recuperação e Resiliência.

ÁUDIO | Diana Leiria, Diretora Executiva ACES Médio Tejo

Quanto aos concelhos do Médio Tejo com maiores constrangimentos ao nível dos Cuidados de Saúde Primários, a diretora executiva do ACES, destacou Ourém, Abrantes, Mação e Sardoal.

Ainda assim, Diana Leiria afirma que “apesar de todas as dificuldades”, conseguem realizar-se “muitas consultas por dia, muitos domicílios e, de alguma maneira, responder às necessidades das populações”.

Por sua vez, Maria Augusta de Sousa, Bastonária da Ordem dos Enfermeiros entre 2004 e 2011, através de um apresentação sustentada em números e dados estatísticos oficiais, fez um retrato da Saúde em Portugal, alertando para a urgência e de um investimento sério no SNS.

“A Saúde é o negócio [mais rentável] a seguir às armas. É disto que estamos a falar. O privado investe e procura pelos mais diferentes meios, secar o que consegue. Isto explica a fuga de médicos e a fuga de enfermeiros. Portanto, é preciso alterar as condições que são oferecidas aos profissionais pelo SNS (…). Considero que o SNS precisa de passar por um processo de mudança e temos de ter capacidade para o fazer, de forma integrada [ao nível dos processos e das organizações]. Se não fizermos isto, mais cedo ou mais tarde, estamos a alimentar a doença e não a saúde”, defendeu Maria Augusta de Sousa.

No entanto, a antiga bastonária não deixou de notar a evolução do SNS ocorrida ao longo dos anos.

“Se olharmos para 1975, praticamente metade dos partos não tinham assistência. Hoje, aproximadamente 100 por cento, são realizados com assistência. Este dado parece-me importantíssimo para percebermos que há uma evolução. E se olharmos para a taxa de mortalidade infantil, comparada com outros países, Portugal está abaixo da média europeia, o que é um ganho civilizacional importantíssimo. Não esquecendo também, que o Programa Nacional de Vacinação permitiu controlar ou eliminar 13 doenças em Portugal. Isto aconteceu, porque temos um SNS, que permite que isto aconteça”.

Por outro lado, Maria Augusta de Sousa evidenciou o aumento da esperança média de vida, como fator positivo. E destacou que “apesar de tudo, é bom percebermos, que em Portugal, o sistema de gestão das doenças crónicas nas unidades de cuidados de saúde primários é o melhor da Europa. É preciso que nos orgulhemos disto.”

No final da sua intervenção, dirigiu-se à CUSMT e reforçou a importância do trabalho que os seus membros têm vindo a desenvolver na luta por melhores cuidados de saúde na região: “As comissões têm duas hipóteses, ou limitam-se a reivindicar, (e vocês não fazem isso, o que eu congratulo), ou exigem condições para terem uma voz participativa nas decisões. Portanto, neste sentido, é muito importante que se apoiem em dados concretos e atuem pela via do diálogo, para conseguirem influenciar decisões.”

CUSMT quer projetar o futuro e ser parceira na luta pela dignificação do SNS

No encerramento da cerimónia, Manuel José Soares, porta-voz da CUSMT, esclareceu que o grande objetivo da Comissão com a organização daquele evento, não passou tanto pela intenção de “glorificar o passado”, mas sobretudo por reforçar a importância da continuidade do projeto, numa altura em que tanto se fala das fragilidades do SNS e das necessidades dos utentes.

ÁUDIO | Manuel José Soares, CUSMT

“Desde março de 2003, data da sua constituição, que a Comissão de Utentes vem afirmando que a saúde é o bem mais importante do ser humano. E não nos cansamos de repetir que a humanidade produz riqueza e saber suficientes para que todos tenham acesso a cuidados de saúde.  Mas, apesar da criação e funcionamento do Serviço Nacional de Saúde – o mais importante e valioso serviço público da população portuguesa – há problemas que se repetem e agravam, com consequências negativas para utentes, trabalhadores e o próprio SNS”, afirmou Manuel José Soares, para justificar a existência da CUSMT, antes de explicar a sua forma de atuação.

“Na região (e também a nível nacional), há 20 anos que damos a nossa contribuição. Somos um movimento de opinião e reivindicativo. Sempre o dissemos e dizemos: intervimos social e politicamente. (…) Em todo o Médio Tejo, através de abaixo-assinados, reuniões, manifestações, encontros, sessões de esclarecimento e vigílias, contactos com as instituições, a Comissão de Utentes tem exercido a sua ação reivindicativa e feito propostas. (…) Os objetivos das comissões de utentes continuam a ser a sensibilização e informação das pessoas para o direito a cuidados de saúde e para a defesa do SNS, conferidos pela Constituição da República Portuguesa, que consagra princípios fundadores da democracia e do espírito do 25 de Abril”, afirmou.

ÁUDIO | Manuel José Soares, CUSMT

“Somos pela colaboração e empenho das autarquias no esforço de melhorar a prestação de cuidados de saúde de proximidade. Disso há bons exemplos no Médio Tejo (como os transportes), mas temos muitas dúvidas, tendo em conta, algumas das notícias sobre a descentralização dos serviços de saúde. Também não percebemos muitas das quezílias e problemas burocrático e/ou legais entre autarquias, administração central e unidades de saúde. Haja diálogo, bom senso e ação. As populações agradecem!”, concluiu o porta-voz da Comissão de Utentes da Saúde do Médio Tejo.

Natural de Torres Novas, licenciada em jornalismo, apaixonada pelas palavras e pela escrita, encontrou na profissão que abraçou mais do que um ofício, uma forma de estar na vida, um estado de espírito e uma missão. Gosta de ouvir e de contar histórias e cumpre-se sempre que as linhas que escreve contribuem para dar voz a quem não a tem. Por natureza, gosta de fazer perguntas e de questionar certezas absolutas. Quanto ao projeto mais importante da sua vida, não tem dúvidas, são os dois filhos, a quem espera deixar como legado os valores da verdade, da justiça e da liberdade.

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