O anúncio de novos canais para a Televisão Digital Terrestre (TDT) foi uma boa notícia para quem, em 2012, investiu nos descodificadores e resistiu à tentação da televisão por cabo. O processo de transição deveria ter terminado com o switch-off do sinal analógico, mas revelou-se pouco pacífico e a “telenovela TDT”, iniciada há mais de uma década, continua com episódios em que o sinal digital está muito longe da qualidade prometida. Numa altura em estão previstos mais quatro canais, ainda existem casos no Médio Tejo em que é difícil ver um…
A 26 de abril de 2012 a televisão analógica despediu-se de Portugal depois de um período de transição para a Televisão Digital Terrestre (TDT) que durou cerca de quatro meses. Uma vez terminada a operação de switch-off, o sinal digital chegou com uma imagem de maior qualidade através dos descodificadores independentes ou dos novos televisores com estes equipamentos de receção em que a população sem televisão por cabo investiu.
A “telenovela” iniciada cerca de uma década antes com o lançamento do primeiro concurso da TDT em território nacional parecia chegar ao fim, mas as reclamações por falta de sinal multiplicaram-se, confirmando o alerta feito pela DECO, associação de defesa dos consumidores, de que o processo de transição tinha sido “imperfeito” e “incómodo”.
O tema foi caindo no esquecimento até ao passado mês de junho, altura em que o Ministro da Cultura, Luís Castro Mendes, anunciou o alargamento da oferta da TDT a mais quatro canais, dois do setor público e dois do setor privado, complementando os cinco existentes (RTP1, RTP2, SIC, TVI e canal Parlamento). Uma evolução positiva se não existissem casas onde o sinal continua a ser fraco e a imagem de qualidade “superior” desaparece regularmente.

Cândida Marques, 54 anos, proprietária do minimercado “Parra” na aldeia de Árgea (Torres Novas) é um desses casos. O estabelecimento comercial que herdou dos pais fica perto da casa da mãe e é lá que liga o televisor todos os dias. Na altura do switch-off não equacionou a hipótese de aderir à televisão por cabo e comprou um descodificador de TDT para ligar ao televisor antigo.
A comerciante refere que “desde o início da TDT houve sempre muita dificuldade” e que não é exceção na aldeia pois vai ouvindo as queixas sobre a fraca qualidade do sinal partilhadas pelos clientes habituais. Salienta que no inverno é pior, especialmente nos dias de chuva, em que se torna mais regular “perder a imagem e o écran ficar aos quadradinhos, com muitas cores”.
Cândida nunca fez uma queixa formal mas sabe que alguns habitantes da aldeia reclamaram junto da PT e outros optaram pela televisão por cabo. No seu caso, manteve “a caixinha” e os novos canais da TDT são bem-vindos apesar do desabafo: “Deviam arranjar outra solução porque, realmente, há dificuldade.”

Uma “dificuldade” sentida também em Mação, a mais de 50 quilómetros de Árgea, onde a população se depara com o mesmo cenário, sobretudo a partir das 19h00. O alerta foi feito pelo vereador socialista César Estrela durante a reunião do executivo daquele município no passado dia 29 de julho, sugerindo que as entidades competentes sejam informadas, nomeadamente a MEO, da PT Portugal, atual gestora da plataforma da TDT.
Contactado pelo mediotejo.net, Vasco Estrela, presidente da Câmara Municipal de Mação, reconhece que o processo da TDT no município “foi conturbado desde o início” devido à cobertura do sinal digital na altura do switch-off ser inferior a 50% do território, a “pior do Médio Tejo”. Segundo este, a questão foi resolvida em alguns locais pela PT Portugal, nomeadamente na sede de concelho, com o reforço do sinal e noutros pelos próprios habitantes com a adesão à televisão por cabo.
O presidente da autarquia destaca a abertura da PT Portugal ao realizar contactos no último ano com as juntas de freguesia para sinalizar casos complicados e confirma que a recomendação de César Estrela será seguida de forma a “garantimos uma solução e minoramos este problema”.
Aos concelhos de Torres Novas e Mação juntam-se outros pelo país fora e a “telenovela TDT” mantém-se “no ar” mais de uma década depois da estreia. Em 2016 continuam a existir casas onde a transição do sinal analógico para o sinal digital não durou os quatro meses anunciados em 2012 e o processo parece ser como a imagem dos écrans. Começa muito bem, mas depois pára e perde-se.
Os episódios mais recentes da “telenovela TDT”
Os novos episódios da “telenovela TDT” prometem a chegada RTP3 e da RTP Memória nos próximos meses, sem publicidade comercial, assim como a abertura de um concurso para os canais de operadores privados. Para trás ficaram outros igualmente marcantes e o enredo de 2016 começa com a apresentação do projeto de lei do Bloco de Esquerda, a 13 de janeiro, para oferta de novos canais da TDT com a garantia de condições técnicas adequadas e controlo de preço.
A proposta foi enviada à Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), cujo Conselho Regulador reuniu a 30 de março sem emitir parecer por não conseguir reunir os três votos favoráveis “estatuariamente necessários”. Três meses depois, a 23 de junho, o Conselho de Ministros aprovou o alargamento da oferta de TDT a quatro novos canais, incluindo a possibilidade de alargamento a nove canais em formato SD (definição standard).
A resolução anunciada pelo Ministro da Cultura, Luís Castro Mendes, foi publicada em Diário da República a 8 de julho e no passado dia 29 publicou-se o diploma apresentado pelo Bloco de Esquerda no início do ano que deu lugar a um projeto lei conjunto deste partido com o Partido Comunista Português, o Partido Ecologista os Verdes e o Partido Socialista.
No intervalo de ambas as publicações houve tempo para um episódio extra, com as notícias sobre o envio do parecer da Autoridade Nacional de Comunicação (ANACOM) ao Parlamento informando que a rede atual apenas tinha capacidade de transporte e difusão para mais três canais, existindo a possibilidade de instalação paga de redes adicionais.