Foto: mediotejo.net

A Junta de Freguesia de Ortiga, através da sua Assembleia de freguesia, preparou um ofício onde pretende sugerir à Infraestruturas de Portugal, IP, a alteração da denominação da antiga estação ferroviária Alvega-Ortiga, que agora funciona como apeadeiro. A proposta que pretende retificar a designação para Ortiga-Mação foi enviada à Câmara Municipal tendo o executivo assentido, na reunião pública de quarta-feira, dia 27, acompanhar a freguesia nesta sua intenção e proposta, indo apoiar na colocação deste assunto à IP através de ofício.

Vasco Estrela, presidente da Câmara de Mação, notou ainda assim que não se pode apagar a história da ligação que outrora existiu e que uniu as duas margens do rio, entre a freguesia de Alvega, concelho de Abrantes, e Ortiga, concelho de Mação, quando há dezenas de anos a travessia se fazia de barca entre as duas terras para tratar de variados assuntos, desde trocas comerciais, aceder à estação em causa, consultas médicas, farmácia, e até trazer alunos de Ortiga para estudar no antigo externato de Santo António/Escola Dr. Fernando Loureiro.

ÁUDIO: Vasco Estrela expôs o ponto de situação desta proposta, dando a conhecer o seu ponto de vista e da autarquia perante a hipótese de alteração do nome da antiga Estação ferroviária

“Na altura havia ligação entre Alvega e Ortiga, e ainda hoje há grande proximidade, mas as pessoas de Ortiga creem que não faz, hoje, qualquer sentido aquele nome [Alvega-Ortiga]. A Assembleia de Freguesia sugere que seja retificada a situação e solicitam que a Câmara se possa associar à proposta”, introduziu o autarca durante a reunião de Câmara pública de quarta-feira, dia 27 de janeiro.

Foto: mediotejo.net

O edil referiu ainda “não saber se a IP estará disposta a fazer uma alteração deste nível e com este impacto, porque tem sempre algum impacto. É mais uma questão de orgulho, não deverá causar nenhum problema com a freguesia de Alvega, muito menos com o concelho de Abrantes, com quem obviamente temos ótimas relações”.

Nesse sentido, o executivo deliberou associar-se à freguesia de Ortiga, “para questionar a Infraestruturas de Portugal para saber se há alguma possibilidade de fazer alteração ou evidenciar mais o nome de Ortiga e do concelho”.

Vasco Estrela comprometeu-se a “clarificar” a questão com o Município de Abrantes e a freguesia de Alvega, frisando que “não há nenhum problema e não se vai armar nenhuma guerra por causa desta situação; entre boas vizinhanças é assim que as coisas devem ser tratadas, mas também compreendo e não podemos ter outra atitude senão acompanhar a posição da Assembleia de Freguesia de Ortiga”, referiu.

O lugar de Estação de Ortiga, comunidade que envolve a antiga estação Alvega-Ortiga. Créditos: mediotejo.net

Freguesia de Ortiga considera que o apeadeiro tem “nome desadequado que urge corrigir” pois “nada liga” o território de Ortiga a Abrantes e “nenhum habitante” daquele concelho se serve daquela estação

A Assembleia de Freguesia de Ortiga volta a defender a alteração ao nome da estação de caminhos de ferro, agora apeadeiro, junto ao lugar da Estação de Ortiga – topónimo dado pela localização da infraestrutura em causa. À semelhança do que já aconteceu nos anos 80, altura em que aquela comunidade levou a cabo uma robusta manifestação para que o nome da estação Alvega-Ortiga fosse alterado, tendo inclusivamente sido pintados os painéis identificativos, os ortiguenses propõem agora que a empresa responsável, Infraestruturas de Portugal, IP, possa retificar essa designação.

Em ofício a que o mediotejo.net teve acesso, a freguesia justifica dar agora este passo tendo por base a informação veiculada sobre projeto da empresa para melhoria das condições de mobilidade e acesso dos utilizadores em cinco estações da Linha da Beira Baixa: Vila Nova da Barquinha, Santa Margarida (Constância), Tramagal e Alferrarede (Abrantes) e Alvega-Ortiga (Mação).

A curva do rio Tejo entre Ortiga e Alvega, junto ao Monte da Várzea, em Casa Branca. Créditos: mediotejo.net

“Aproveitando a oportunidade das atuais instalações virem a ser merecedoras de obras e dado que:
1 – A linha da Beira Baixa foi inaugurada em Setembro de 1891, vão decorridos 129 anos;
2 – Ortiga fazia parte da Freguesia de Penhascoso e pertenceu ao Concelho de Abrantes, até 21 de Novembro de 1895, tal como a Freguesia de Alvega então pertencia e ainda hoje pertence. Daí talvez o terem decidido, sem oposição de maior, pelo nome de Alvega-Ortiga, para a estação ferroviária;
3 – A Barca de Ortiga, no rio Tejo que, antes da inauguração da Linha da Beira Baixa, se situava na zona agrícola ainda hoje conhecida por Courela da Barca, bem mais próxima da Ortiga, com a inauguração e funcionamento desta foi deslocada para jusante, para a própria Alvega, a fim de facilitar o acesso à Estação Ferroviária aos seus habitantes e outros povos da margem esquerda do rio Tejo;
4 – Embora pertencendo aos dois concelhos, por entendimento entre as Câmaras Municipais de Mação e de Abrantes , a barca passou a estar sob administração direta da Câmara Municipal de Abrantes. Atente-se que Alvega, por esses tempos históricos, detinha fortes influências políticas a nível local, regional e central, para lá do imenso poder económico das grandes casas agrícolas então ali existentes;
5 – Esta barca, garantindo a ligação direta da população da margem esquerda (habitantes de Alvega e seus Casais) à Estação Ferroviária e das pessoas que da margem direita se deslocavam para idas aos médicos ou para aquisições nas farmácias de Alvega, foi utilizada até à construção da designada Ponte do Pego (via rodoviária e via ferroviária), sobre o rio Tejo;
6 – Sem procura, por força da opção rodoviária feita pelas populações da margem esquerda, a barca, por desnecessária, foi eliminada e em função das alterações político/administrativas verificadas não há nada, absolutamente nada, que justifique o manter-se o nome da Estação Ferroviária como Alvega – Ortiga”, pode ler-se entre os argumentos do ofício da Assembleia de Freguesia ortiguense.

Foto: mediotejo.net

Por fim, refere-se que, “contrariamente ao que acontecia em 1891, desde há largos anos a esta parte: a) A Estação Ferroviária com a designação de Alvega – Ortiga, localiza-se na Freguesia de Ortiga, Concelho de Mação e assim, a manter um nome desadequado que urge corrigir. b) Nada liga este território de Ortiga, onde se localiza a Estação Ferroviária, ao Concelho de Abrantes. c) Nenhum habitante da margem esquerda do rio, toda ela concelho de Abrantes, se serve da Estação de Alvega – Ortiga, pois que não tem qualquer meio que lhe possibilite atravessar o rio ou seja, passar da margem esquerda (Alvega, concelho de Abrantes) para a margem direita (Ortiga, concelho de Mação), onde se situa a Estação Ferroviária”.

“Face ao exposto e porque, tal como a Infraestruturas de Portugal (I. P.) é disso claro exemplo, o devir histórico dos territórios e das instituições é processo dinâmico, há que corrigir as anomalias e anacronismos que tais processos vão originando e daí, a sugestão que levamos à Junta de Freguesia de Ortiga, no sentido de por si própria ou, como mais desejável, em conjunto com Câmara Municipal de Mação, junto da I.P., requerer a alteração/correção do nome da Estação de Alvega-Ortiga para Ortiga – Mação”, conclui o documento.

Neste âmbito, recuperamos uma entrevista da jornalista Paula Mourato ao investigador de história local, João Filipe, de Ortiga, onde se referem as várias reivindicações, lutas e manifestações levadas a cabo por este povo reconhecidamente bairrista e defensor das suas raízes e tradições. Entre as quais, a situação da designação da antiga Estação, atualmente a servir como apeadeiro.

Aqui, João Filipe recorda algumas das batalhas onde o povo não conseguiu ser bem sucedido já no passado, quando junto dos responsáveis políticos tentou alterar, por exemplo, o nome atribuído à Barragem de Belver, localizada na freguesia de Ortiga.

“Apesar dos protestos escritos levados a efeito pela Liga junto dos responsáveis, as respostas escritas destes são pouco menos que ofensivas”, considera João Filipe. Do mesmo modo, a estação ferroviária de Alvega-Ortiga, toda ela em território ortiguense.

Manifestação na década de 1980, com apoio da Liga Regional de Melhoramentos de Ortiga, contra o facto da estação se designar Alvega-Ortiga situando-se integralmente no território de Ortiga, concelho de Mação. Créditos: DR

Chegou inclusivamente a acontecer, no pós-25 de Abril, anos 80, uma manifestação junto da Estação no sentido de se corrigir a sua designação.

O local de passagem para a outra margem era precisamente junto à Estação de Alvega-Ortiga onde aguardava a barca do Ti’Vitorino, figura que muito diz aos povos de ambas as margens, pois durante décadas atravessou quem ali chegava e queria passar o rio Tejo até Alvega, ou vice-versa. No caso de Ortiga, teve papel preponderante ao transportar jovens de Ortiga que fizeram estudos no Colégio de Santo António, hoje Escola Dr. Fernando Loureiro, caso do próprio investigador ortiguense, João Filipe.

O barqueiro acarinhado pelas povoações de Ortiga e Alvega, e por todos conhecido como Ti’ Vitorino. Fez durante anos a travessia, unindo as duas margens do rio Tejo, permitindo o transporte das populações. Créditos: DR

Em 2014, foi colocada uma placa de homenagem no cais de Alvega, por parte da comunidade educativa do antigo Colégio de Santo António, relembrando o barqueiro Vitorino Fernandes. A placa reza assim: “Homem de inexcedível perícia e força hercúlea, a cada um sempre acudiu ao chamamento da passagem para a outra margem e com a sua bonomia os estudantes foi passando”.

Ler mais:

Mação | Ortiga, um topónimo pouco pacífico em terra de gente determinada e consciente que a união faz a força

 

Joana Rita Santos

Formada em Jornalismo, faz da vida uma compilação de pequenos prazeres, onde não falta a escrita, a leitura, a fotografia, a música. Viciada no verbo Ir, nada supera o gozo de partir à descoberta das terras, das gentes, dos trilhos e da natureza... também por isto continua a crer no jornalismo de proximidade. Já esteve mais longe de forrar as paredes de casa com estantes de livros. Não troca a paz da consciência tranquila e a gargalhada dos seus por nada deste mundo.

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