(Da esquerda para a direita) Lídia Catarino, Fernando António Baptista Pereira, Maria Teresa Desterro, Luíz Oosterbeek e Miguel Cabral Moncada

As I Jornadas Interdisciplinares de Arqueologia, Conservação e Restauro e Património do Instituto Politécnico de Tomar decorreram em novembro, em Tomar e Mação, respetivamente. O objetivo passou por permitir que a interdisciplinariedade se concretize na prática de lecionar dos professores universitários e também nos trabalhos de investigação.

O arqueólogo Luíz Oosterbeek deu conta em Mação “da transformação da esmagadora maioria das instituições de ensino superior em supermercados de diplomas” e avançou que a partir de 2018, o IPT terá uma cátedra da UNESCO intitulada “Humanidades e Gestão Cultural Integrada do Território”. A segunda edição das Jornadas acontecerá dentro de ano e meio.

Se lhe perguntarem que empregos que irão desaparecer nos próximos 10 anos, provavelmente não pensaria nestes dois: analista de sistemas e programador de software. “Hoje já não existe nenhum software de ponta que seja feito por pessoas, mas sim por computadores”, explicou o professor coordenador e pró-presidente do Instituto Politécnico de Tomar (IPT), Luíz Oosterbeek, à assistência que praticamente enchia o auditório do Centro Cultural Elvino Pereira, em Mação, no segundo dia das I Jornadas Interdisciplinares da Unidade Departamental de Arqueologia, Conservação e Restauro e Património do Instituto Politécnico de Tomar (UDACRP).

De acordo com a organização, estas primeiras Jornadas tiveram o propósito de reabrir o debate entre a comunidade científica (docentes, alunos) e demais interessados sobre o tema em destaque, à luz dos novos pressupostos concetuais, procurando tornar-se num espaço de reflexão sobre diversos aspetos concernentes ao conhecimento e preservação do Património e à promoção de um desenvolvimento sustentável face à agenda 2030.

Assim, dentro da temática da Arquitetura, Conservação e Restauro e Património, o debate alargou-se a vários intervenientes incluindo aos alunos de Conservação e Restauro do IPT e revelou o trabalho dos membros da UDACRP que foi desta forma apresentado à comunidade académica em que se integra bem como à restante sociedade.

Maria Teresa Desterro

Segundo a diretora da UDACRP, Maria Teresa Desterro, a iniciativa do IPT surgiu porque “pela primeira vez o ensino superior começou a ser organizado em termos interdisciplinares”. Recordou que “durante o século XX todo o conhecimento estivesse espartilhado em comportamentos estanques e foi preciso chegar ao século XXI para se perceber que a interdisciplinariedade é fundamental e o caminho para progredirmos, porque todas as ciências precisam do contributo umas das outras”.

Maria Teresa Desterro explicou ao mediotejo.net que o IPT “está organizado por unidades departamentais que fazem essa interdisciplinariedade entre vários cursos” por isso, enquanto diretora da Unidade de Arqueologia, Conservação e Restauro e Património “considerei que era importante partilharmos os nossos conhecimentos, darmos a conhecer os temas sobre os quais temos investigado nos últimos tempos”.

Dando conta que o projeto das jornadas é para continuar no futuro esclareceu que o objetivo passa por “permitir que esta interdisciplinariedade se concretize na nossa prática de lecionar e sobretudo nos trabalhos de investigação”. As Jornadas mostraram que “hoje em dia o conhecimento é transdisciplinar”.

Em Mação, na mesa redonda sob o tema ‘Humanidades, Ciências, Tecnologias e Sustentabilidade. Desafios e Responsabilidades para o Ensino Superior’ o arqueólogo Luíz Oosterbeek, perante uma plateia largamente constituída por alunos do IPT, chamou a atenção para o problema da empregabilidade.

“Há uma viragem que está a acontecer muito rapidamente a nível internacional, por um lado a transformação da esmagadora maioria das instituições de ensino superior em supermercados de diplomas. Já nem sequer é para criar operários qualificados mas para fazer de conta que o desemprego não é um problema tão grave, ao mesmo tempo criam-se universidades cada vez mais de elite e essas não cometem esse erro”, sustentou.

(Da esquerda para a direita) Lídia Catarino, Fernando António Baptista Pereira, Maria Teresa Desterro, Luíz Oosterbeek e Miguel Cabral Moncada

Luíz Oosterbeek destacou a Filosofia, a História e a Antropologia como ciências fundamentais para o século XXI.

“Há efetivamente uma produção maciça de pessoas que não raciocinam, que são técnicos altamente qualificados preparados para profissões que em grande medida vão desaparecer, mas com muito baixa capacidade crítica”, afirmou, referindo “a história da Arábia Saudita, que dá direitos a um androide que não dá às mulheres… é um bocadinho mais que uma piada”.

Constatando que “as pessoas que circulam na rua agarradas aos smartphones e que se deixam atropelar alegremente já são robots”, questionou também sobre “o que é um indivíduo cultural?”. Concluiu: “É uma pessoa que gosta da diversidade. Que se interessa e é cativada por aquilo que é diferente. Há cada vez menos dessas pessoas. É por isso que os enlatados das televisões vendem tanto: quanto mais iguais forem mais se agarram a uma massa de robots”.

Durante as Jornadas, o também diretor do Museu de Mação defendeu que “três eixos emergem como prioridades para o avanço da ciência e para a governança dos territórios: um melhor e mais partilhado conhecimento sobre os recursos; a necessidade de integração de estratégias, campos de saber e mecanismos de operacionalização; e a urgência de retomar uma centralidade das Humanidades nos processos de produção, transformação e socialização dos conhecimentos”, ou seja, “não faz sentido hoje as Humanidades sem as Ciências”.

A mesa redonda, moderada por Maria Teresa Desterro contou ainda com as participações de Fernando António Baptista Pereira (Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa), Lídia Catarino (Universidade de Coimbra) e Miguel Cabral Moncada (IPT).

I Jornadas Interdisciplinares de Arqueologia, Conservação e Restauro e Património 2017, do Instituto Politécnico de Tomar

Presente no evento, o presidente da Câmara Municipal de Mação, Vasco Estrela, atestando que vivemos “numa sociedade diferente” lembrou que em Lisboa “vive-se a Web Summit, num mundo que só está virado para as novas tecnologias” defendendo que há mais vida para além do computador.

E lançou um desafio ao IPT: “que de alguma forma se possa envolver e ter um papel importante nos nossos territórios, na reconstrução da devastação provocada pelos incêndios (…) o IPT tem conhecimentos suficientes para ajudar os Municípios naquilo que deverão fazer, naquilo que será o nosso futuro, mais sustentável, tendo em conta a realidade em que estamos inseridos, as inevitabilidades dos incêndios florestais e do nosso património que queremos preservar”.

Foi ainda partilhado que a partir de 2018, o IPT terá uma cátedra da UNESCO intitulada “Humanidades e Gestão Cultural Integrada do Território” não sendo “a gestão do património cultural mas a gestão cultural – complexa, reflexiva e crítica – do território, não é a gestão dos palácios e dos monumentos, é a gestão de tudo compreendendo que não se pode separar” indicou Luíz Oosterbeek.

Inicialmente as Jornadas foram pensadas para ocorrerem de forma bianual “mas como o saldo foi muito positivo vamos pensar se poderão ocorrer dentro de ano e meio” avançou Maria Teresa Desterro.

Fernando António Baptista Pereira

O encerramento das Jornadas esteve a cargo de Fernando António Baptista Pereira, atual assessor do Ministro da Cultura, Luís Castro Mendes, com a sessão “A História da Arte na Era Epistemológica do ‘Campo Expandido’ – Os Novos Estudos do Património”.

O primeiro dia das Jornadas, a 7 de novembro, decorreu no Campus do IPT.

Paula Mourato

A sua formação é jurídica mas, por sorte, o jornalismo caiu-lhe no colo há mais de 20 anos e nunca mais o largou. É normal ser do contra, talvez também por isso tenha um caminho feito ao contrário: iniciação no nacional, quem sabe terminar no regional. Começou na rádio TSF, depois passou para o Diário de Notícias, uma década mais tarde apostou na economia de Macau como ponte de Portugal para a China. Após uma vida inteira na capital, regressou em 2015 a Abrantes. Gosta de viver no campo, quer para a filha a qualidade de vida da ruralidade e se for possível dedicar-se a contar histórias.

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