Por terras do Médio Tejo não há quem nunca tenha ouvido falar e poucos serão aqueles que pelo menos uma vez não tenham visitado a Feira dos Santos de Mação. Aliás, esta tradição de encher as ruas da vila com vendedores ambulantes já completou 217 anos, esta quarta-feira 1 de novembro, e traz visitantes de vários pontos do País. Caracteriza-se pela variedade na oferta contando com espaços distintos e específicos de venda. Mação ganha, assim, uma dimensão, um movimento e um colorido únicos. O presidente da Câmara Municipal (CM), Vasco Estrela, falou ao mediotejo.net e disse que o feriado de Todos os Santos é porventura dos dia em que Mação “tem mais gente” mas adiantou a necessidade de “recriar” a Feira para que possa perdurar no tempo.
No espaço de recriação do mercado à moda antiga, Agostinho Godinho e a mulher, Lurdes, fazem o comércio de brinquedos tradicionais em madeira. Quem sobe em direção ao edifício da Câmara Municipal de Mação, junto ao Largo dos Combatentes, encontra uma tenda montada para o efeito, onde associações, instituições de solidariedade social e escolas apresentam bancas recheadas de produtos caseiros, artesanais e agrícolas, fazendo a ponte entre os vários pontos da vila por onde se estende a Feira do Santos.
Agostinho e Lurdes talham e montam brinquedos em madeira, para depois venderem nas feiras de Norte a Sul do País o produto infantil que sai das suas mãos de artífices, embora o público alvo possam ser os adultos no caso “dos jogos de paciência”.
Na banca, chamando a atenção de todos quanto passavam, os brinquedos tradicionais antigos e também os criativos, nascidos de imaginações mais recentes, aguardavam a compra após saírem da oficina localizada em Aboboreira, no concelho de Mação, onde marido e mulher trabalham a tempo inteiro.
Para a ajudar a ganhar a vida Agostinho dedica-se também ao setor agro-florestal, mas este ano com os incêndios “ardeu tudo. Tenho muita madeira queimada, alguma dá para aproveitar mas outra estraga-se”, desabafa ao mediotejo.net.

“São mais de 300 modelos de brinquedos pintados apenas com quatro ou cinco cores” indica Agostinho. Os moldes, normalmente em MDF “uma madeira fininha” explica, são a base do brinquedo, depois “é fazer por peças, várias de cada vez” para rentabilizar o tempo, sendo que um carro “demora cerca de uma hora a ficar pronto” para a brincadeira.
Na era digital, os brinquedos eletrónicos parecem não fazer mossa nos de madeira. “Vamos sobrevivendo! No próximo fim-de-semana estamos em Marvão” e depois por aí adiante de exposição em exposição, terra em terra onde haja crianças.
Naquele espaço do mercado antigo há muita procura dos tradicionais bolos dos santos, broinhas, pão caseiro, legumes, ervas aromáticas, licores, tremoços, mel, tigeladas, couves e outros produtos da terra que oferecem, nomeadamente aos forasteiros, o cheiro e o sabor da tradição, elucidando-os sobre as origens da Feira.
Também ali a turma de Ciências dos alunos do 11º ano da Escola Básica e Secundária de Mação armaram a sua banca para vender os produtos que eles próprios ou os pais confecionaram. “O objetivo é angariar dinheiro para a viagem de finalistas” a acontecer na Páscoa de 2019, explicou Clara Minhoto. Mas a tarefa de angariação de verbas “começou logo no 10º ano” acrescentou Maria Margarida. Provavelmente na edição de 2018 lá estarão outra vez, vestidos a rigor como se tivessem parado no tempo, por volta do ano 1800, ano da criação da Feira.

E a Feira de 2017 corria bem para os feirantes e barraqueiros, que em número superior a 150 negociavam com os compradores, muito por causa da meteorologia admirável para esta época do ano sem frio e sem cargas de água, poupada mais uma vez pela Providência.
Na tenda de recriação do mercado à moda antiga “as associações e instituições estão muito satisfeitas porque a venda de produtos tradicionais e caseiros está a correr muito bem” afirmou o presidente da Câmara, Vasco Estrela, considerando quarta-feira “o pior dia da semana para decorrer esta Feira, apesar de ser feriado” mas ainda assim “uma aposta ganha”, referiu.
As peças de vestuário, diferenciadoras daquele espaço de venda de produtos regionais, pertencem aos próprios feirantes. “Muitas peças de roupa antigas que foram deixadas nas instituições, outras herança de familiares ou amigos, outras costuradas para ocasiões especiais ou mesmo para esta ocasião”, dá conta Vasco Estrela. A ideia é “ter neste local, de uma forma mais ou menos fiel, aquilo que era a feira à moda antiga”.
Uns cem metros à frente, no antigo Quartel dos Bombeiros, decorria a Feira de Artesanato que contava com cerca de 10 expositores. De rendas a bordados, de bijutaria a doces caseiros, de objetos em madeira a suplementos naturais e cosméticos. O autarca esclarece tratar-se de “um conjunto de pessoas que há muitos anos dinamiza as feiras de artesanato no concelho de Mação, produtos também das pessoas que têm aqui uma oportunidade de mostrar aquilo que fazem, ganhar algum dinheiro e dar mais um bocadinho de vida” a esta Feira.

Liliana da Silva em representação da Terra de Aromas, o seu negócio, que segue o lema ‘Sinta os Aromas da Terra e siga a Vida’. E é justamente pela terra, Mação, que sente o apelo: “Quero que isto vá para a frente!”, afirma, referindo-se à situação económica debilitada que Mação se encontra após os incêndios que consumiram cerca de 80% do concelho este verão. Liliana reside em Setúbal mas tem raízes na vila, garante possuir “o bichinho da terra”, por isso, fez questão de marcar presença com aquilo que sabe fazer. “Sou acupuntora e dia 5 de novembro vou estar no auditório do Centro Cultural Elvino Pereira para demonstração gratuita de tuina, ventosas e biorressonância”, adianta. Uma sessão integrada no programa da CLDS 3G, Opção Mação.
Enquanto isso a Associação de Concertinas de Proença-a-Nova, animava as ruas até à hora de almoço conduzida pelo mestre Marcolino Farinha Nel, para depois das 14h00 chegar a arruada da Filarmónica União Maçaense.

Este ano notou-se “menos afluência de feirantes em certos tipos de produtos, nomeadamente na zona dos fatos feitos que antigamente tinha muita procura, hoje há poucos feirantes com esse tipo de produto, precisamente pela evolução dos tempos, por aquilo que é o dinamismo económico das grandes superfícies” reconheceu Vasco Estrela.
O caminho da Feira é adaptar-se “a estas novas circunstâncias e perceber, por um lado aquilo que as pessoas procuram e por outro lado aquilo que os feirantes têm para oferecer. Não podemos cair no imobilismo e havemos de encontrar forma de a recriar e reinventar, para que esta Feira possa perdurar por muitos anos”, acrescentou.
Sem abrir muito o véu das novas possibilidades, Vasco Estrela deu conta do fervor de ideias de mudança da CM para este evento. O presidente disse tratar-se de “uma partilha que terá de ser feita com várias pessoas” mas adiantou que “a aposta na feira à moda antiga é muito importante, mantendo o artesanato. A parte dos cereais é intocável”. Quanto ao mercado, posicionado na parte mais nova da vila “eventualmente arranjar novos espaços, concentrar a feira pode ser uma possibilidade, perceber bem que espaços estão a ficar vagos, perceber que tipo de atrativos temos de ter, se vale a pena ter mais um dia de feira ou até diversões. Vamos reposicionar a Feira na vila de forma a não perder as características iniciais” garantiu.
Até porque a Feira dos Santos funciona também como incentivo económico das gentes da vila. “Para o comércio local e para os restaurantes é bom” considerou, recordando que o dia 1 de novembro “é provavelmente dos dias em que Mação tem mais gente”. Além disso, “proporciona que outras pessoas nos visitem e que fiquem a conhecer melhor a vila, sendo uma Feira no contexto regional com alguma importância e tradição”.
Junto ao Jardim Municipal vendiam-se os cereais, os frutos secos e os cestos de vimes; no centro histórico, as latoarias, as árvores de frutos, as flores, os queijos, os oleados, os panos para a apanha da azeitona e outros utensílios para fins agrícolas. No Largo dos Bombeiros Voluntários de Mação encontrava-se equipamento diverso, desde utensílios agrícolas a tratores e outros acessórios. E até a venda de frangos assados não faltou.
A Feira dos Santos foi criada por provada falta que fazia a Mação e aos concelhos vizinhos. Afirmou-se de tal forma que, mais de dois séculos depois, continua a ser uma das maiores da região.