Grifos nas escarpas do Tejo. Fotografia: José Freitas

O impacto dos passadiços recém-inaugurados junto a uma colónia de grifos (gyps fulvus), com três núcleos, e um casal de abutre-do-egipto (neophron percnopterus), que nidificam nas escarpas da margem esquerda rio Tejo, no concelho de Gavião, está a ser avaliado pelo Instituto Nacional de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), confirmou a instituição ao nosso jornal.

Na semana passada o mediotejo.net noticiou que nas escarpas junto ao Tejo, no concelho de Gavião, nesta primavera não há ovos nem crias em nenhum dos ninhos de grifos identificados pelo Instituto de Conservação da Natureza, bem como no de um (raro) casal de abutre-do-egipto. A garantia foi dada ao mediotejo.net o biólogo Carlos Pacheco, especialista em aves necrófagas, que desde os anos 1990 acompanha no terreno o estudo destas espécies protegidas.

“Não houve reprodução devido à proximidade excessiva” de humanos, nos passadiços da recém inaugurada Rota da Sirga, explicou.

Inauguração do PR8, na margem esquerda do Tejo, traçado na União de Freguesias de Gavião e Atalaia, e designado Rota da Sirga. Créditos: mediotejo.net

O mediotejo.net questionou nessa altura o ICNF, que responde agora oficialmente. A Direção Regional da Conservação da Natureza e Florestas do Alentejo confirma que “não foi consultado relativamente à implementação de passadiços no concelho de Gavião, no designado PR8 – Rota do Sirga”, encontrando-se “neste momento a avaliar a ocorrência e a identificar a extensão dos impactes causados pela construção e utilização desta infraestrutura, nomeadamente nas colónias de grifos”.

Confirma também que “o passadiço, formalmente inaugurado pelo município no dia 27 de março, localiza-se na proximidade de 2 colónias de grifos e de um ninho de abutre-do-egipto”.

A instituição explica ainda que, “desde 31 de março, tem vindo a monitorizar estas 2 colónias, não tendo sido inicialmente, verificada qualquer evidência de perturbação”. Todavia, “no final do mês de abril, confirmou-se o abandono da colónia de Vale de Cerejeira, e a colónia de Vale da Marinha apresentava evidências de ter sido parcialmente abandonada”.

Por outro lado, garante, “a permanência do casal de abutre-do-egipto, que se encontra a nidificar”.

O abutre-do-egipto é uma das espécies ameaçadas , que segundo o ICNF, permanece em Gavião. Fotografia: José Freitas

Mais informa que “foi comunicada a situação identificada à Câmara Municipal de Gavião e solicitada a implementação de medidas que condicionem a utilização do passadiço da Rota da Sirga”.

Na semana passada, o biólogo Carlos Pacheco, especialista em aves necrófagas, criticou “a construção de passadiços prejudiciais” ao ambiente, designadamente o da Rota da Sirga, por “perturbar” a nidificação dos grifos e o abutre-do-egipto, uma vez que, segundo afirmou ao nosso jornal, desapareceram sinais de qualquer nidificação nos 22 ninhos de uma colónia de grifos ali existente, com três núcleos, e o desaparecimento de um casal de abrute-do-egipto – espécie ainda mais rara nestas paragens, pois só nidifica em zonas inóspitas e tranquilas.

O biólogo, que não se manifesta contra os investimentos de lazer, critica que a pressão turística, e as respetivas infraestruturas, sem qualquer tipo de parecer ou estudo de impacte ambiental, alheia à fauna existente, “inviabilize” a reprodução das aves que têm naquele local “as boas escarpas” que necessitam para a nidificação. “O fator limitante destas espécies é o habitat de nidificação”, insistiu.

Os locais de nidificação para os grifos são cada vez mais escassos. “Há animais que voam até 200 quilómetros para se alimentar”, diz o biólogo Carlos Pacheco. Fotografia: José Freitas

Por seu lado, o presidente da Câmara de Gavião, José Pio, garantiu que a questão da preservação da fauna e da flora “foi acautelada” pela equipa projetista da Rota da Sirga. Por isso, a escolha do percurso e os passadiços passarem por baixo dos ninhos dos grifos.

“O ninho mais baixo está a trinta metros” do local de passagem, referiu, na semana passada, o presidente ao nosso jornal – contudo, o biólogo Carlos Pacheco considera que 500 metros é a distância mínima necessária para não haver perturbação.

O autarca esclareceu também que, antes de construir a infraestrutura (um investimento municipal na ordem dos 200 mil euros) o município “não pediu qualquer parecer, nem solicitou um estudo de impacte ambiental, porque não é obrigatório”.

No entanto, assegurou que a Câmara está disponível “para alterar e resolver algum problema que venha a ser identificado no futuro”.

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A sua formação é jurídica mas, por sorte, o jornalismo caiu-lhe no colo há mais de 20 anos e nunca mais o largou. É normal ser do contra, talvez também por isso tenha um caminho feito ao contrário: iniciação no nacional, quem sabe terminar no regional. Começou na rádio TSF, depois passou para o Diário de Notícias, uma década mais tarde apostou na economia de Macau como ponte de Portugal para a China. Após uma vida inteira na capital, regressou em 2015 a Abrantes. Gosta de viver no campo, quer para a filha a qualidade de vida da ruralidade e se for possível dedicar-se a contar histórias.

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2 Comentários

  1. Encontrava-me muito entusiasmada com a possibilidade de visitar os passadiços do Gavião. Ao ler a notícia que fala dos prejuízos para as colônias de grifos e abutres mudei de ideias e desisti da visita.
    Sugiro que permitam apenas visitas em períodos não prejudiciais para as aves, ou então garantam a distância de segurança apontada pelos especialistas.

  2. À Mediotejo.net a Câmara Municipal do Gavião (CMG) afirmou que está disponível para alterar e resolver algum problema que venha a ser identificado no futuro. Estando este agora identificado pelo ICNF, espera-se que a CMG condicione a acessibilidade do percurso de modo efetivo, em termos operacionais. Mal será que a solução passe por um qualquer aviso informativo que depois muitos pacóvios não respeitam.

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