Centro de Saúde de Alferrarede. Foto: CMA

Questionado sobre a situação que se vive no polo de Alferrarede, concelho de Abrantes, o ACES Médio Tejo confirmou ao nosso jornal que são seis mil os utentes inscritos nesta unidade de saúde que não têm médico de família atribuído. Para o atendimento destes utentes, a entidade pública de saúde afirma disponibilizar 40 horas semanais de prestação de serviços médicos, o que admite “não ser suficiente”. O presidente da União de Freguesias de Abrantes e Alferrarede, Bruno Tomás, não esconde a sua preocupação.

A ausência da médica que ali assegurava as consultas de recurso, por motivo de férias, levou a que durante o mês de agosto não sejam realizadas consultas nesta unidade e os utentes tenham de se deslocar à sede da Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados (UCSP) de Abrantes, situação que se espera ver regularizada no mês de setembro.

“Temos tentado alargar o número de horas médicas disponíveis, temos inclusivamente propostas de contratação de médicos aposentados, mas estamos a aguardar despacho superior e publicação em Diário da República”, explicou o ACES Médio Tejo.

A freguesia de Alferrarede tem-se deparado com o problema da falta de médicos de família, resultante do facto de, em dois anos, se terem aposentado os cinco médicos que aí prestavam serviços e nenhum ter entrado para os substituir.

Nenhuma das vagas disponíveis nos sucessivos concursos de acesso à carreira médica para a UCSP de Abrantes foram ocupadas, apesar dos “incentivos existentes por ser considerada uma zona carenciada”, justificou o ACES Médio Tejo ao nosso jornal.

São já 6.000 os utentes frequentadores sem médico de família atribuído na extensão de Alferrarede. Foto ilustrativa: Freepik

Apesar dos esforços para colocar novos médicos em Abrantes, as vagas apenas têm sido preenchidas nas Unidades de Saúde Familiar (USF) e em número insuficiente para abarcar todos os utentes do polo de Alferrarede.

O acesso aos cuidados de saúde de proximidade para os utentes de Alferrarede agravou-se especialmente pelo facto de a médica que trabalha nesta extensão em regime de prestação de serviços estar ausente por motivo de férias, regressando apenas no mês de setembro.

“Os utentes podem dirigir-se à consulta de recurso na sede da UCSP de Abrantes que durante esta quinzena de agosto funciona às segundas, quartas e quintas-feiras à tarde”, referiu o ACES Médio Tejo.

Centro de Saúde de Alferrarede. Foto: mediotejo.net

Anteriormente a esta situação, os utentes que procuravam uma consulta médica de recurso tinham de se deslocar a esta extensão de saúde de madrugada e aguardar numa fila que rapidamente ultrapassava o número diário de consultas disponibilizado para atender os utentes necessitados.

A situação foi confirmada pelo presidente da União de Freguesias de Abrantes e Alferrarede, Bruno Tomás, em declarações ao nosso jornal. “Várias pessoas me procuraram e abordaram para perceber o que é que estava a acontecer e relatavam que tinham de sair extremamente cedo de casa para conseguir uma consulta”, fez saber Bruno Tomás.

“É desumano uma pessoa que está doente e precisa de uma consulta médica ser obrigada a sair de casa às 04h00 e às 05h00 da manhã para conseguir uma consulta de recurso. Não se pode colocar a população a mendigar ao Estado uma consulta”, sublinha.

Bruno Tomás, presidente da maior União de Freguesias do Médio Tejo. Foto: arquivo mediotejo.net

Para o responsável, trata-se de uma situação “muito preocupante” para o seu executivo. “Destes anos todos de executivo que esta equipa tem é a situação mais dramática. É insustentável nós termos mais de 6 mil de utentes sem cuidados de saúde primários, o que depois se reflete nas urgências do nosso hospital e nas consultas de recurso, tendo de ir às quatro ou cinco da manhã para arranjar uma consulta”, afirma.

Para dar uma resposta ao problema, Bruno Tomás explica que o executivo da junta a que preside tem reunido com regularidade com a vereadora Raquel Olhicas, responsável pelo pelouro da saúde na Câmara de Abrantes, e mantido um contacto direto com o presidente da autarquia, Manuel Jorge Valamantos, no sentido de tentar encontrar uma solução eficaz para a situação que se vive atualmente no concelho.

ÁUDIO | Bruno Tomás, presidente da União de Freguesias de Abrantes e Alferrarede

Embora reconheça que o trabalho do executivo municipal “não tem muito espaço” nesta matéria, Bruno Tomás recorda que o projeto “Bata Branca”, à semelhança do que irá acontecer na freguesia de Mouriscas, vai também ser implementado no polo de Alferrarede. “Algum aumento de horas hipotético da doutora que lá está, tentar fazer a contratação de algumas horas de outros médicos”, exemplifica.

No curto prazo, trata-se de uma “situação preocupante”, embora a médio e longo prazo se espere um apaziguar das dificuldades, em grande parte devido à criação da nova Unidade de Saúde Familiar do Norte do Concelho, projeto que já está aprovado pela autarquia, afirma o presidente da União de Freguesias.

“Vai dar cobro a estas e outras situações também de outras freguesias, o que pode minimizar e mitigar estes constrangimentos de acesso à saúde. Mas efetivamente, no curto espaço de tempo, ou seja, para amanhã, isto é algo que nos preocupa imenso e parece que estamos de mãos e pés atados”, acrescenta.

À tutela, o presidente da União de Freguesias deixa uma crítica, acrescentando que, embora sejam necessárias medidas imediatas para “mitigar” o problema , a longo prazo é necessário resolver.

“Há questões basilares que este governo tem de tomar conta e uma delas é tomar conta de quem já tomou conta de nós. São principalmente os nossos idosos que recorrem mais aos cuidados de saúde primários. (…) Este é o verdadeiro problema que nós temos e estamos extremamente preocupados”, sublinha Bruno Tomás.

Centro de Saúde de Alferrarede. Foto: mediotejo.net

“Isto é uma responsabilidade do Ministério da Saúde, a resposta aos cuidados de saúde primários. O município de Abrantes já tem vários programas e protocolos para ir dando cobro à falta de médicos, retirando do seu orçamento municipal, dos impostos dos abrantinos, para que se consiga minimizar a falta de médicos”, afirma.

O Agrupamento de Centros de Saúde (ACES) Médio Tejo indicou que são mais de 70 mil utentes os utentes que estão sem médico de família nos 11 municípios da região, uma realidade que “assume maior dimensão” em Ourém, Abrantes, Alcanena, Mação e Sardoal.

“O ACES Médio Tejo regista um total de 225.522 utentes frequentadores e 33% destes utentes não têm médico de família atribuído”, deu conta a entidade de saúde a um pedido de esclarecimento do mediotejo.net, tendo referido que, “para dar resposta a estes utentes, o ACES Médio Tejo e a ARSLVT [Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo] têm recorrido a todas as alternativas possíveis”.

Com exemplo, o ACES Médio Tejo, que agrega 11 municípios, aponta o “recrutamento de médicos em prestação de serviços, pagamento de horas suplementares aos médicos existentes, reforço das equipas dos Atendimentos Complementares, e contratação de médicos aposentados”, medidas que se têm revelado insuficientes.

“Inclusivamente, temos em desenvolvimento parcerias com algumas IPSS no sentido de recrutar mais horas médicas”, sublinhou a entidade publica de saúde, tendo admitido que, no entanto, e “apesar de todos os esforços, e face à dimensão do problema, estas horas médicas disponibilizadas aos utentes que estão sem médico atribuído não são suficientes”.

Esta realidade, indicou ainda o ACES Médio Tejo, “assume maior dimensão nos concelhos de Ourém (exceto Centro de Saúde de Fátima), Abrantes, Alcanena, Mação e Sardoal, onde a percentagem de utentes sem médico atribuído é superior aos 33% da média” daquele ACES.

À semelhança de Mouriscas, o projeto ‘Bata Branca’ vai também ser implementado no polo de Alferrarede. Foto ilustrativa/Lusa

Na UCSP de Abrantes, os polos de Rio de Moinhos e Mouriscas estão sem consultas médicas, podendo estes utentes recorrer à consulta de recurso atrás mencionada. Prevê-se que o polo de Mouriscas veja a situação resolvida a partir de setembro, dada a recente celebração de um protocolo entre o Ministério da Saúde e uma IPSS local, no âmbito do projeto “Bata Branca”.

O ACES Médio Tejo tem 2.706 quilómetros quadrados e abrange 11 municípios com cerca de 225 mil utentes/frequentadores, sendo composto pelos municípios de Abrantes, Alcanena, Constância, Entroncamento, Ferreira do Zêzere, Mação, Ourém, Sardoal, Tomar, Torres Novas e Vila Nova da Barquinha, todos no distrito de Santarém.

Abrantes prepara nova USF e prevê requalificação do Centro de saúde de Alferrarede

Segundo noticiámos no mês de julho, Abrantes encontra-se a preparar a criação de uma nova Unidade de Saúde Familiar (USF) para servir as freguesias do norte do concelho, que deverá ficar instalada em Alferrarede. O presidente de Câmara afirma ter disponível uma verba de 1,5 milhões de euros para construir o novo edifício e mais 300 mil euros para requalificar o centro de saúde de Alferrarede e efetuar melhorias naquele equipamento.

Foto: mediotejo.net

À data e perante a questão da falta de médicos de medicina geral e familiar que se mantém, o autarca notou que a Câmara Municipal e as entidades competentes de saúde têm estado a trabalhar no sentido de construir uma nova USF para o norte do concelho.

Questionado sobre o projeto, o presidente da União de Freguesias de Abrantes e Alferrarede afirma não conhecer “especificidades”, mas explica que ao seu executivo foi garantido que este “não encerrará e ficará ao serviço da saúde”.

“Não irá ser transformado para outra coisa, para outro serviço público. Aquele serviço público que é ali prestado, em cuidados de saúde, irá continuar. É lógico que se for criada uma Unidade de Saúde Familiar que dê resposta a estes utentes todos e mais alguns, nas outras freguesias aqui em redor, é lógico que é complementar”, acrescenta.

Bruno Tomás recorda que na extensão de Alferrarede se mantém o serviço de medicina dentária e um conjunto de serviços públicos prestados à comunidade no âmbito da saúde.

“O que foi dito pela autarquia à JF não foi a especificidade de serviços que iriam lá ficar, mas foi dito e garantido que aquela unidade não fechará portas e continuará a prestar o serviço público de cuidados de saúde à população”, conclui.

David Martins, médico dentista, e Sandra Carvalho, asseguram o funcionamento do Gabinete de Saúde Oral em Abrantes. Foto: arquivo mediotejo.net

Manuel Jorge Valamatos já havia explicado em sede de Assembleia Municipal, a 23 de junho, que se tratará sobretudo de uma “nova organização por via de uma nova estrutura”.

“A sul temos a USF Beira Tejo, que tem vindo a responder e queremos melhorar naturalmente, e temos a USF D. Francisco de Almeida com um nível de rentabilidade e de resposta com grande determinação porque o que mudou foi a organização. Não é propriamente o espaço físico”, começou por mencionar.

“Mas muitas vezes para uma nova organização implica um novo espaço físico. Vamos ter um novo espaço físico, (…) recebi uma mensagem, vamos ter 1,5 milhões de euros já aprovados, mais 300 mil euros para melhorar o atual centro de saúde de Alferrarede, e fazer a nova construção”, deu conta.

Centro de Saúde de Alferrarede, no concelho de Abrantes. Foto: mediotejo.net

Os arquitetos da autarquia estão a trabalhar em conjunto com a ARS LVT no que toca ao projeto e construção do edifício. “Estamos a trabalhar na construção organizacional para o norte do concelho, que irá dar outras respostas que hoje não conseguimos fazer naquela zona do concelho”, disse, notando como exemplo “as fragilidades muito evidentes que vão acontecendo em Rio de Moinhos e nas Mouriscas”.

Manuel Jorge Valamatos referiu que se pretende “criar condições e novos posicionamentos organizacionais e a Câmara diretamente criar condições estruturais” para fazer face às necessidades quanto ao acesso a cuidados de saúde primários e acesso a médicos de medicina geral e familiar.

Atualmente a frequentar o Mestrado em Jornalismo na Universidade da Beira Interior. Apaixonada pelas letras e pela escrita, cedo descobri no Jornalismo a minha grande paixão.

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