Reduzindo o número de GAL, “na ótica dos territórios, dos produtos locais, do desenvolvimento dos territórios, o risco das políticas públicas não chegarem a essas pessoas é enorme”, afirma Miguel Torres, presidente da Federação Minha Terra, considerando “uma medida desse género altamente prejudicial para os territórios”. A expetativa passa pela possibilidade “dos políticos perceberem a utilidade das equipas de ação local, da estratégia de desenvolvimento local que vão definindo com a comunidade”.
As 58 Associações de Desenvolvimento Local na Federação representam, no seu conjunto, mais de 90% do território nacional e as suas capacidades de iniciativa e concretização dizem diretamente respeito a mais de quatro milhões de portugueses, habitantes em zonas rurais.
Com o aviso para a qualificação dos GAL à porta, provavelmente até final do ano, para o quadriénio 2023/2027, a preocupação adensa-se nos autarcas e naqueles que durante três décadas fizeram um trabalho de proximidade com os agentes locais, para desenvolver e executar operações, designadamente através de fundos comunitários, incluindo fomentar as suas capacidades de gestão de projetos.
Isto porque, manifestações e intervenções públicas de decisores políticos, designadamente do Governo, apontam uma intenção de agregação, no sentido de ganhar escala, “um ajuste dos GAL aos territórios das CIM (Comunidades Intermunicipais)”, disse ao nosso jornal o presidente da Federação Portuguesa de Associações de Desenvolvimento Local, Miguel Torres.
O assunto foi abordado na última reunião de executivo de Sardoal, com o presidente Miguel Borges a dar conta da “preocupação” dos autarcas do Médio Tejo, a verificar-se uma possível agregação, “com a qual não concordamos”, disse o autarca.
Recorda-se que atualmente existem 54 GAL no Continente, sendo três na sub-região do Médio Tejo – Tagus – Associação para o Desenvolvimento Integrado do Ribatejo Interior; ADIRN – Associação para o Desenvolvimento Integrado do Ribatejo Norte e Pinhal Interior – Associação de Desenvolvimento do Pinhal Interior Sul. A confirmar-se a intenção de agregar, o Médio Tejo passará a ter um GAL para o território dos 13 concelhos do território.
“O que nos preocupa é o que nos preocupa há 30 anos: o desenvolvimento dos nossos territórios. Isto é, como é que os Grupos de Ação Local e as estratégias de desenvolvimento local são definidas para cada um dos territórios, a partir das parcerias que se estabelecem com as associações de desenvolvimento local, com as autarquias, com as juntas de freguesia, com as empresas, com as escolas; com o conjunto de atores no território”, começou por dizer Miguel Torres em declarações ao mediotejo.net.
As estratégias de desenvolvimento local são pensadas a partir das dificuldades, debilidades, de cada um dos territórios. “Numa lógica de proximidade e de co-construção com o território das soluções que serão as possíveis para cada um, em função das oportunidades que existem. Aquilo que nos preocupa é que essa lógica da proximidade, do trabalho em rede, da co-construção de soluções, não se perca”, acrescentou o responsável.
Miguel Torres deu conta que “160 municípios subscreverem declarações” de apoio aos GAL considerando que tal panorama, ou seja, de nova estratégia que pode reduzir as políticas de proximidade, “evidencia uma total desconsideração pelo trabalho dos GAL” nos últimos 30 anos, esperando que tais “preocupações” não se reflitam em medidas específicas. O responsável avançou que, na Comunidade Intermunicipal do Médio Tejo, os autarcas já promoveram um debate sobre este assunto.
Reduzindo o número de GAL, “na ótica dos territórios, dos produtos locais, do desenvolvimento dos territórios, o risco das políticas públicas não chegarem a essas pessoas é enorme”, afirma Miguel Torres considerando “uma medida desse género altamente prejudicial para os territórios”. A expetativa passa pela possibilidade “dos políticos perceberem a utilidade das equipas de ação local, da estratégia de desenvolvimento local que vão definindo com a comunidade”.
Entre as funções dos GAL – também como plataforma de mediação entre o público e o privado – contam-se: o reforço da capacidade dos agentes locais para desenvolver e executar operações, incluindo fomentar as suas capacidades de gestão de projetos; definir um procedimento de seleção não discriminatório e transparente e critérios objetivos para a seleção das operações, que evitem conflitos de interesses; respeitar a coerência com a estratégia de desenvolvimento local de base comunitária ao selecionar as operações, estabelecendo prioridades de acordo com o seu contributo para os objetivos e metas das estratégias; preparar e publicar convites à apresentação de propostas ou um procedimento contínuo de apresentação de projetos, incluindo a definição de critérios de seleção; receber e avaliar os pedidos de apoio; selecionar as operações e fixar o montante do apoio e, se for caso disso, apresentar as propostas ao organismo responsável pela verificação final da elegibilidade antes da aprovação; e monitorizar a execução da estratégia de desenvolvimento local de base comunitária e as operações apoiadas, e realizar ações específicas de avaliação ligadas a essa estratégia.
O apelo da Federação Portuguesa de Associações de Desenvolvimento Local aos decisores políticos passa agora pela “valorização” desse trabalho de proximidade com três décadas ainda que a nova estratégia possa eventualmente trazer uma majoração financeira, o que também não está garantido.
Miguel Torres espera que “de repente não se introduzam ruídos que possam dificultar esta ação”. Ruídos que partem de conceitos – da escala, da dimensão do território, da dimensão da intervenção – “pouco relevantes para aquilo que importa nestes processos”, considera.
A Federação Minha Terra acredita que “a escala não se impõe, a escala constrói-se a partir do território. Acreditamos que a massa crítica se constrói a partir desses processos e portanto para nós é muito importante que sejam muito valorizados a partir da realidade comunitária, das parcerias que se vão estabelecendo” no sentido de valorizar os territórios e os processos de desenvolvimento e sobretudo “a possibilidade das pessoas viverem bem, terem boa qualidade de vida nos territórios que optaram para viver”.
No aviso para a qualificação dos GAL a Federação quer dar continuidade ao trabalho desenvolvido durante os últimos 30 anos sem que os processos de desenvolvimento sejam assim “processos impostos administrativamente”.
O presidente da Minha Terra esclarece “não ser claro” a possibilidade de existência de uma mais-valia financeira anexada à nova estratégia nem tão pouco é claro que se verificará uma redução do números de GAL. “Se tiver de haver uma redução de Grupos de Ação Local que seja porque o território assim o entende, ou seja, como resultado da estratégia local que está a ser feita e que não seja um processo de imposição administrativa”, reforça.
Para a Federação Minha Terra, o Programa LEADER revelou-se uma ferramenta na definição das políticas de desenvolvimento local, procurando promover a coesão regional, a valorização e visibilidade dos territórios, o estímulo para o surgimento e implementação de projetos, públicos e privados, que “criaram e criam a diferença nos territórios em todas as suas dimensões: patrimonial, social, ambiental e económica, gerando empregos e contribuindo para a qualidade de vida e bem-estar das populações”.
As 58 Associações de Desenvolvimento Local na Federação representam, no seu conjunto, mais de 90% do território nacional e as suas capacidades de iniciativa e concretização dizem diretamente respeito a mais de quatro milhões de portugueses, habitantes em zonas rurais.