É consensual entre os historiadores apontarem o ano de 1148 como sendo o ano da conquista do castelo de Abrantes aos Mouros, por D. Afonso Henriques. No livro “História de Abrantes aos quadradinhos”, de Eduardo Campos e Sara Morgado, aponta-se a madrugada do dia 8 de dezembro desse ano para a conquista do castelo abrantino.
Outro aspeto consensual tem a ver com a importância da localização estratégica militar de Abrantes, numa colina e numa encosta sobre o rio Tejo, que se refletiu na época da Reconquista e durante as Invasões Francesas. Também a nível económico essa localização, à beira Tejo, foi muito importante uma vez que até meados do séc. XX Abrantes funcionou como porto fluvial estratégico no comércio tradicional, de e para Lisboa.
Convém sublinhar que a história de Abrantes não começa no séc. XII. Antes disso estiveram por cá, entre outros, os romanos e os mouros, conforme atestam recentes escavações arqueológicas no castelo que revelaram uma ocupação proto-histórica, romana e islâmica.
Na cronologia histórica de Abrantes destaca-se a data de atribuição de foral, em 1179, por D. Afonso Henriques, documento confirmado por D. Sancho II em 1237 e reformado em 1510 por D. Manuel I.
Há registos de que Abrantes, no séc. XVI, era uma das maiores e mais populosas terras do reino. Nessa altura teria 3.436 habitantes, e dentro dos seus muros existiam quatro conventos de ordens religiosas e 13 igrejas e capelas.
Como quase todas as cidades medievais, a construção da cidade começou com o castelo. O crescente povoamento levou a que os habitantes fossem saindo das muralhas e ocupando as zonas envolventes. Por isso é que na zona do castelo a malha urbana tem uma configuração radial, sendo mais regular na zona de expansão urbana, cuja transição se faz a partir do eixo da Rua Grande, conforme consta nos registos do património nacionais.
A mesma fonte refere que “o limite do núcleo urbano estruturou-se a partir dos edifícios conventuais, erguidos no séc. XVI. Na sequência da demolição da muralha a Oeste e Sul, organizou-se o tecido urbano do séc. XX”.
Devido à sua localização, num morro, junto ao rio e no centro do país, Abrantes sempre assumiu um papel de primordial importância do ponto de vista militar.
Há pouco mais de 200 anos foram as Invasões Francesas que aqui deixaram marcas e nessa época “Abrantes atingiu o seu maior relevo ao tornar-se numa das bases fundamentais para o movimento das tropas aliadas que combatiam o poder napoleónico”, lê-se no livro “Abrantes Cidade”, do arquiteto José Santa-Rita Fernandes.

Na segunda metade do séc. XIX, vários acontecimentos estiveram na base do progressivo desenvolvimento regional. Referência para a construção das pontes rodoviária e ferroviária que vieram “desencravar” esta região e criar novas oportunidades.
A forte adesão da população ao movimento republicano nos finais do séc. XIX e inícios do séc. XX deu a Abrantes um papel importante na implantação da República e terá contribuído para a sua elevação a cidade em 1916.
Foi há 101 anos, a 14 de junho de 1916, que se registou a elevação de Abrantes à categoria de cidade, marco histórico que agora comemoramos.
O séc. XX foi “decisivo” para a história de Abrantes, conforme escreve Nelson Carvalho na nota de apresentação do livro “Cronologia de Abrantes no século XX”, de Eduardo Campos. A elevação de Abrantes a cidade, a consolidação da imprensa, o intenso movimento associativo, o reforço dos serviços de saúde e de ensino, a melhoria das acessibilidades e a industrialização foram alguns dos aspetos que marcaram a história desta cidade no período em referência.

Algumas datas para a história
Com base em diversas fontes, publicamos uma coletânea de algumas das datas mais marcantes da história de Abrantes.
1148 – D. Afonso Henriques conquista Abrantes e o seu castelo aos Mouros.
1173 – D. Afonso Henriques doa a povoação à ordem de Santiago da Espada
1173 – Doação do castelo de Abrantes e o seu termo à ordem de Santiago
1179 – D. Afonso Henriques concede o primeiro foral a Abrantes
1215 – Edificação da igreja de Santa Maria do Castelo
1237 (30 de março) – Confirmação da carta de foral por D. Sancho II
1385 – Abrantes ponto de encontro das tropas de D. Nuno Álvares Pereira e de D. João I, antes da partida para a Batalha de Aljubarrota
1509 – Início da construção do convento de São Domingos
1518 (10 de abril) – Concessão de carta de foral a Abrantes por D. Manuel I
1605 – Construção do atual edifício da Câmara Municipal (conclusão em 1609)
1641 – Abrantes elevada ao estatuto de “Notável Vila”
1807 (23 de novembro) – Abrantes é tomada pelas tropas do general Junot durante as Invasões Francesas
1863 (7 de novembro) – Inauguração do primeiro troço da linha ferroviária do Leste que ia de Santarém a Abrantes
1870 – Concluída a ponte rodoviária sobre o rio Tejo
1884 (16 de março) – Lançado o primeiro “Jornal de Abrantes”, dando-se início à imprensa periódica na cidade
1889 – Inauguração da ponte ferroviária sobre o rio Tejo
1891 – Entra em funcionamento a Linha da Beira Baixa.
1900 (8 de julho) – Inauguração da praça de touros de Abrantes
1909 (31 de janeiro) – Inauguração do animatógrafo (cinema) no largo do Príncipe Real
1909 (2 de maio) – Instalação da energia elétrica na cidade
1916 (14 de junho) – Abrantes elevada à categoria de cidade
1921 – Inauguração do Museu regional D. Lopo de Almeida
1933 – Construção do edifício do mercado diário
1949 – Construção do cine-teatro São Pedro no lugar da igreja com o mesmo nome, demolida em 1943.
1951 (21 de janeiro) – Inauguração da barragem de Castelo de Bode
1985 (27 de outubro) – Inauguração do hospital Distrital de Abrantes
Entre 1987 e 1995 – Construção da Central Termoelétrica do Pego pela EDP – Eletricidade de Portugal
1999 (6 de outubro) – Inauguração da Escola Superior de Tecnologia de Abrantes
2000 (18 de março) – Entrada em funcionamento do troço do IP6 (atual A23) que liga Abrantes a Mouriscas
2013 (28 de janeiro) – Criação da União das Freguesias de Abrantes (São Vicente e São João) e Alferrarede por agregação das mesmas

A lenda de “Abre-antes”
Todos nós conhecemos trocadilhos com a palavra Abrantes, uns mais brejeiros, outros mais sérios. Um pouco semelhante à lenda de Santa Iria, em Tomar, há em Abrantes uma lenda que pode estar na origem do topónimo da cidade e que também o seu lado brejeiro.
Tudo começa com uma relação incestuosa entre a donzela Záhára, filha do Alcaide do Castelo, o mouro Hibrahim-Zaid, ou Abraham-Zaid (de onde terá derivado o nome Abrançalha) e Samuel, filho bastardo do mesmo homem, que desconhecia a relação, tal como os dois amantes não sabiam que eram irmãos.
Quando D. Afonso Henriques conquistou estas terras aos mouros, Samuel foi preso. Um dos cavaleiros do reino, de seu nome Machado, ao ver Záhára a ser levada também para as masmorras recolheu-a e entregou-a aos cuidados de um monge.
Entretanto a donzela é novamente entregue ao seu pai, por ordem de D. Afonso Henriques antes de partir para outras batalhas.
Completado o triângulo amoroso Záhára, Samuel e Machado, a história complica-se com ciúmes entre os cavaleiros que cobiçavam a mesma mulher.
Numa conversa a sós, Záhára promete fidelidade a Samuel, diálogo que é interrompido pela entrada abrupta de Abraham-Zaid. Surpreendido e preocupado ao ver os dois juntos, o pai mouro diz ao seu filho Samuel que, pelas suas virtudes, não deve hostilizar o cavaleiro Machado.
Samuel fica mais tranquilo com a declaração de amor e fidelidade de Záhára. Inicia-se então uma conversa reveladora entre a donzela e o seu pai.
Záhára ao perguntar ao seu pai se deve abrir a porta de casa no caso de o cavaleiro Machado surgir à sua procura, Abraham-Zaid dá a resposta que é a base da lenda: “Abre Antes a porta”!
A donzela, pensando no seu amor por Samuel, ainda argumenta que seria melhor não abrir a porta e ficar em silêncio para que o cavaleiro ficasse a pensar que não estava ninguém em casa. Mas o pai, reforça a resposta, elogiando as virtudes da filha: “Abre Antes a porta”, “Abre Antes a porta”!
Possuído por ciúmes, Samuel ao ouvir a resposta de Abraham-Zaid, começou a injuriar a sua amada e o seu pai repetindo as palavras “Abre-Antes, Abre-Antes…”, frases que se propagaram entre a população da localidade e que motivaram conversas jocosas sobre o cavaleiro e Záhára.
A partir daí o Castelo deixou de ser conhecido como Castelo de Tubucci para passar a ser conhecido como Castelo de Abre-antes, derivando mais tarde para Abrantes.
Para um “happy end” da história, resta dizer que Samuel se tornou cavaleiro e, com D. Afonso Henriques, ajudou a ganhar várias batalhas. Quanto a Záhára e Machado pode dizer-se que “viveram felizes para sempre”.