Blocos habitacionais da Rua General Humberto Delgado, Entroncamento. Imagem: Google Maps

Na proposta para a abertura de concurso para atribuição de habitação social em regime de arrendamento apoiado, processo iniciado uma vez que todas as pessoas da anterior lista já foram alojadas, o seu regulamento e os critérios foram criticados por Luís Forinho (independente, ex-Chega) e por Rui Gonçalves (PSD), sendo que no final a proposta foi aprovada por unanimidade, tendo ainda sido decidido um início de processo de revisão ao regulamento.

Ao expor o ponto na última reunião camarária de 21 de junho, Jorge Faria (PS), presidente da Câmara Municipal, ressalvou alguns critérios relevantes incluídos no regulamento, sendo que uma primeira condição de acesso é que os candidatos sejam cidadãos que residam no concelho há pelo menos três anos, bem como não tenham dívidas, entre outros fatores, pelo que Jorge Faria disse considerar que o processo “está relativamente acautelado”.

Referindo que este é um tema “muito sensível”, Luís Forinho defendeu que “apesar de entender e acho que nós temos que ajudar quem precisa, sei também que há prevaricadores que se aproveitam da nossa boa vontade e da boa vontade do contribuinte para se aproveitarem destas situações”, pelo que “nós temos de alguma forma fechar cada vez mais a malha”, não se deixando de ajudar, defendeu. 

O vereador independente disse ainda que “gostaria de ver” entre os documentos necessários para as candidaturas a de “um registo criminal limpo”, afirmando que lhe “custa imenso, como cidadão e como pagador de impostos, ver pessoas que cometem crimes e a seguir nós cedemos-lhes casas para eles habitarem”.

“Tenho contacto com pessoas que estão a usufruir desse direito dentro da nossa comunidade, que já estão no segundo contrato, que têm uma vida financeira completamente estável, alguns até se gabam que já vão no segundo carro novo, e isto custa-me imenso como contribuinte e como autarca desta cidade”, declarou ainda o edil.

Casa emparedada no Bairro Frederico Ulrich. Foto: CM Entroncamento

Luís Forinho apontou ainda alguns dos pontos que estão previstos no regulamento e que não são cumpridos pelos arrendatários, como a proibição de os moradores alterarem a tranquilidade do prédio ou prédios vizinhos, “mas todos nós sabemos das correrias, acelerações, peões que andam a fazer, ali junto ao bairro Frederico Ulrich”, entre outras condições que são impostas aos arrendatários mas que não são cumpridas, como o manter o espaço limpo, pelo que o vereador disse considerar que “era muito importante que se fizesse fiscalização”, acusou o vereador.

“Acho que antes de abrirmos um concurso para a atribuição de habitações sociais – ou poderíamos abrir em simultâneo – seria extremamente importante que a Câmara Municipal com os seus órgãos de fiscalização fiscalizasse o bom uso dessas habitações de pessoas que estão a ser ajudadas por todos nós”, afirmou ainda Luís Forinho.

Em resposta, Jorge Faria relembrou que há um conjunto de situações que resultam da lei que não podem ser alteradas, e outro conjunto que resulta da pobreza: “muitas vezes a pobreza não é tanto a falta de dinheiro mas também muito a falta de cabeça”, afirmou, acrescentando que existe igualmente uma “relatividade” entre aquilo que são competências do município e a sua obrigação de fiscalizar o cumprimento dos regulamentos, e a obrigação em garantir residência a quem dela precisa. 

“É neste equilíbrio que temos tentado jogar, e eu penso que se evoluiu muito na moralização da forma como são usadas as habitações sociais. Se está como eu gostaria que estivesse, não”, disse o autarca, exemplificando que ao longo dos anos foram sendo construídos anexos no bairro Frederico Ulrich, alguns deles autorizados pelos executivos que passaram pela Câmara, até informalmente, mas que os mesmos são ilegais, sendo que agora não é fácil iniciar o processo de demolição. 

Jorge Faria relembrou ainda que “os nossos serviços de fiscalização, sobretudo da área social, fazem um trabalho muito empenhado e muito difícil” uma vez que com “algumas pessoas que vivem nestes bairros – algumas porque há muitas que são cumpridoras”, torna-se difícil o trabalho das pessoas da área social que têm sempre a dupla preocupação, em que sejam cumpridas as regras mas ao mesmo tempo têm de desenvolver mecanismos para ajudar, porque os filhos não vão à escola ou não têm comida, exemplificou.

O líder do município entroncamentense afirmou ainda que a Câmara já procedeu a alguns despejos – em situações em que ocorreram crimes transitados em julgado naquelas casas – e que se fosse rigorosa no cumprimento do regulamento procederia a muitos mais, mas que isso iria implicar ficar com mais pessoas para alojar as quais iriam acabar por ser novamente alojadas naquele local.

“Houve uma altura em que as nossas funcionárias da área social só iam ao bairro com o acompanhamento da polícia. Houve uma altura que os nossos funcionários só iam ao bairro Frederico Ulrich reparar qualquer coisa com o acompanhamento da polícia. Houve alturas em que dentro do próprio bairro, entre ruas, tinham territórios próprios. Isso felizmente hoje não acontece”, lembrou ainda o autarca socialista.

“Há uma série de situações que nós ainda temos de trabalhar, espero que possamos fazê-lo em conjunto, para gradualmente melhorarmos as condições de vida daquelas pessoas e podermos exigir mais, mas neste momento não sei se podemos ir muito além daquilo que tem sido feito”, completou Jorge Faria na sua intervenção.

Também Rui Gonçalves, vereador do PSD, mostrou discordar de algumas das ponderações atribuídas no regulamento, dizendo que algumas pessoas contornam a lei. Jorge Faria respondeu que “no meio disto tudo há de haver algumas situações que as pessoas contornam, mas o normal é que as pessoas não têm esse comportamento”.

O vereador social democrata solicitou que a grelha e as ponderações fossem revistas, de modo a se tentar diminuir os possíveis contornos à lei que possam existir.

Luís Forinho interveio ainda novamente a solicitar uma reunião para revisão do regulamento, o qual foi aprovado pelo anterior executivo em 2017, sendo que “hoje a realidade já é outra”, considera o vereador. “Penso que seria talvez interessante fazermos uma reunião em que pudéssemos de alguma forma participar nesse regulamento com a opinião de todos, de forma a que nós pudéssemos fechar um pouco mais essa rede”, e que as habitações sejam entregues “realmente a pessoas que precisam, e não a pessoas que estão a tentar beneficiar-se com as brechas que a lei permite”, defendeu.

Ressalvando que o regulamento funciona, tendo em conta que no último concurso concorreram 32 famílias e só foram validadas quatro, Jorge Faria mostrou-se aberto a iniciar um processo de revisão.

O ponto da ordem de trabalhos manteve-se, tendo a proposta da abertura de concurso sido aprovada por unanimidade, e Jorge Faria comprometeu-se em dar início a um procedimento de revisão ao regulamento existente, o qual já será levado à próxima reunião de Câmara.

Rafael Ascensão

Licenciado em Ciências da Comunicação e mestre em Jornalismo. Natural de Praia do Ribatejo, Vila Nova da Barquinha, mas com raízes e ligações beirãs, adora a escrita e o jornalismo.

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