No âmbito do Dia de Tomar, que se celebra a 1 de março, o mediotejo.net publica um Suplemento Especial com reportagens, entrevistas e um passeio guiado pela cidade templária, traçando também o retrato das 11 freguesias que compõem o concelho.
Várias figuras públicas tomarenses aceitaram responder a algumas perguntas do mediotejo.net sobre a importância e o significado de viverem na cidade templária e quais os aspetos que consideram mais relevantes em Tomar.
Alda Faria, Maria Helena Mota Lima, Luís Maria Graça, Tó Carvalho, Luís Salazar, Jorge Rivotti e João Victal falam um pouco de si e dão a sua opinião sobre o que Tomar representa para cada um.
Alda Faria: Tomar “é como se fosse uma família”
O nome da tomarense Alda Faria está intimamente ligado à Festa dos Tabuleiros. A própria diz que fez o seu primeiro tabuleiro quando tinha 19 anos, em 1950, e desde aí nunca mais parou.

Pertenceu a várias comissões da festa mas nunca aceitou ser mordoma apesar de ter sido desafiada várias vezes. Até porque nunca houve uma mulher à frente da organização da festa maior de Tomar. Presidente do Club Thomarense, a coletividade mais antiga de Tomar, Alda Faria, aos 86 anos, mantém-se autónoma e não deixa de diariamente ir ao também centenário café Paraíso.
Diz que sempre gostou muito de Tomar. Na sua juventude viajou pelo mundo mas não resistiu a regressar às suas origens. “Gosto muito da minha terra e estou sempre disponível para a minha terra”, afirma com convicção. Aos inúmeros pedidos de tabuleiros ou de flores de papel nunca diz não. Um trabalho voluntário que aumenta de quatro em quatro anos quando se realiza a festa.
O seu local de eleição em Tomar é o café Paraíso, um local de convívio onde se encontra “o antigo e o novo”, numa referência às diferentes gerações que se cruzam no emblemático café.
Elege também o Mouchão pela sua beleza e enquadramento com o rio Nabão. “O Paraíso é para conviver e o Mouchão para relaxar”. Fala de Tomar como “uma família onde todos se conhecem e todos se ajudam”.

Maria Helena Mota Lima: “Tomar é uma terra boa, de gente boa”
A diretora e filha do fundador do Museu dos Fósforos elege o café Paraíso como um dos melhores locais de Tomar. É no centenário café da Corredoura que Maria Helena Mota Lima bebe o seu café diariamente. “Gosto muito de vir aqui mas também gosto muito da minha casa (um 6° andar) onde apanho muito sol”, afirma.
Há décadas que junta as suas amigas no “canto das velhas” do café Paraíso, mas lamenta que o grupo seja cada vez mais pequeno, porque as amigas vão morrendo. Restam duas.

Diz que também gosta das esplanadas na praça da República, no coração do centro histórico da cidade. Aos 90 anos, Maria Helena mantém-se autónoma e faz a sua vida diária sem ajuda. Quase todos os dias vai ao “seu” museu dos fósforos, a “menina dos seus olhos”. Todas as caixas de fósforos, e são mais de 40 mil, passaram-lhe pelas mãos.
Enquanto vai falando, pede para não lhe tirar fotografias. Diz que gosta de passar despercebida. “Nunca gostei de dar nas vistas”. Essa discrição faz com que pouca gente saiba que foi o seu pai e Maria Helena que, nos anos 80, deram o museu dos fósforos à câmara ou que doou o terreno para o lar da misericórdia, só para dar dois exemplos.
“É bom viver em Tomar, é uma terra boa, de gente boa”, conclui.

Luís Graça: “Encontramos em Tomar um equilíbrio de serenidade”
Luís Maria Pedrosa Graça nasceu em Tomar há 69 anos. É um tomarense que conhece bem a sua terra e as suas gentes. Já escreveu vários livros dedicados a Tomar e aos seus monumentos e é colaborador assíduo da imprensa local.
Da sua cidade destaca “o aspeto monumental e paisagístico”. “O Convento de Cristo e todos os edifícios religiosos de Tomar têm características artísticas únicas. Tomar é um repositório de todos os estilos artísticos”, refere.
Como o seu local favorito da cidade escolhe a Mata dos Setes Montes “pela envolvência paisagística e pelo silêncio”.

Reforça que gosta muito de viver em Tomar. “Conheço os quatro cantos do mundo mas acho que Tomar, apesar de tudo, tem um certo número de características que jogam umas com as outras. Encontramos aqui um equilíbrio de serenidade”, afirma Luís Graça.
Uma história marcante da sua juventude aconteceu em 1965 quando, enquanto aluno do Colégio Nuno Álvares, publicou no jornal dos finalistas uma entrevista onde criticava um vereador à época. O visado sentiu-se ofendido e abriu-lhe um processo ao abrigo da liberdade de imprensa. O que salvou Luís Graça de um castigo foi a amnistia presidencial de Américo Tomás.
Para terminar, quando lhe pedimos que complete a frase: Tomar, para mim, é… responde “uma essencialidade”.

Para João Victal, Tomar “é tudo”
O tomarense João Victal elege a Festa dos Tabuleiros “e tudo o que ela evoca” como o que de melhor Tomar tem, ou não fosse ele o mordomo das últimas três festas.

É uma tradição enraizada nas gentes nabantinas, “mexe com muita coisa, aprofunda a união entre as pessoas que se juntam independentemente de eventuais divergências. As pessoas sentem-se envolvidas na festa que acaba por ser a imagem de Tomar”, defende o mordomo.
Quando lhe perguntamos se aceitaria ser novamente o principal responsável da organização da festa dos Tabuleiros, a primeira resposta é não, “já chega, foram três”. Para João Victal “está na altura de vir gente mais nova, não deixo de ajudar e de participar na festa mas acho que devo passar o testemunho”.
Na cidade, aponta como vários locais favoritos a zona do rio Nabão, o Mouchão, a Mata dos Sete Montes com a sua Charolinha, o Convento de Cristo e o Açude de Pedra. Na sua memória de 56 anos tem “lembranças muito boas do açude quando se podia lá andar”. Da sua juventude em Tomar recorda-se quando integrava grupos que, ao sábado à tarde ou ao domingo de manhã, iam fazer pic-nics ao aqueduto dos Pegões, à Mata dos Sete Montes ou ao açude de Pedra.
Refere ainda o prazer que lhe dá “passear nas ruas velhinhas” do centro histórico da cidade. Na sua opinião, Tomar “tem qualidade de vida”, fator que o fez nunca abandonar a sua terra.“Tenho feito viagens, já tive duas propostas para trabalhar noutras cidades, mas decidi ficar, gosto muito de cá estar”. Para João Victal, Tomar “é tudo”.
Jorge Rivotti: Tomar é “um castelo de vontades”
Nasceu no Brasil há 54 anos mas viveu e cresceu em Tomar até ao virar do século. Da cidade destaca “a tranquilidade e ao mesmo tempo o som constante da água na catarata do Mouchão”. Mas o seu local favorito é a Mata dos Sete Montes.

Apesar de já não viver na cidade há mais de 15 anos (reside e trabalha em Lisboa) “as memórias e as passagens por lá, falam-me de uma cidade com um potencial, por vezes não aproveitado, o qual, na sua plenitude, poderia proporcionar um maior enriquecimento na vivência social e económica”.
Da sua adolescência pela terra dos Templários um feito que realça é a de ter sido campeão de hóquei em patins pelo Sporting de Tomar, ainda como iniciado. “Um grande momento de todos os bons momentos”.
Para Jorge Rivotti, Tomar é “um castelo de vontades ao fundo da minha alma Corredoura“.
Luís Salazar: “Tomar é a minha terra”
Luís Salazar, advogado de 71 anos, nasceu em Mirandela mas vive em Tomar desde 1969. E é por isso que considera Tomar a sua terra. Aqui chegou para cumprir o serviço militar e por cá ficou. É o segundo advogado mais antigo de Tomar depois de Bento Moucho.

Apesar de reformado mantém-se no ativo como advogado. “Ajuda-me a viver. É bom uma pessoa acordar de manhã e ter um objetivo”, defende.
Luís Salazar diz que gosta de Tomar “em termos de meio social”. “Foi aqui que me integrei e desenvolvi a vida profissional e adotei como terra. Verdadeiramente sou tomarense embora as minhas raízes sejam transmontanas”, sublinha.
Quando lhe perguntamos qual o seu local favorito em Tomar, responde que é “deformado profissional” e passa a maior parte do tempo no escritório, a ler, em casa ou a viajar.
“Sempre apreciei o café Paraíso pois era ali que habitualmente nos anos 70 reunia com amigos sendo certo, pelo decurso normal do tempo, que os mesmos vão desaparecendo e hoje praticamente não tenho ninguém da minha idade com quem falar”, desabafa o causídico.
À pergunta: “como é viver em Tomar”, responde que “os tempos de hoje nada têm a ver com os de então (anos 60 e 70)”. “A vida profissional transformou-se radicalmente e reflexo disso é o marasmo económico em que a cidade vive, que se reflete em todas as profissões e até no ambiente de tristeza que os tomarenses vivem e sem esperança no futuro a curto prazo”, critica.
Apesar de se chamar Luís Salazar, refere que nada tem a ver com António de Oliveira Salazar. E a propósito lembra-se que, como alferes, participou no funeral do antigo ditador em 1969 no lugar do Vimeiro, em Santa Comba Dão. Aliás, sublinha que a sua família foi perseguida politicamente. O seu pai, aos 18 anos, em 1931, foi deportado para Timor.
Por fim pedimos que completasse a frase: Tomar, para mim, é… “a minha terra”, responde prontamente.
Tó Carvalho: “Sou mais tomarense do que alguns de cá”
Com 79 anos completados a 27 de fevereiro, António Carvalho, ou Tó Carvalho, como é mais conhecido, continua a pintar. No anexo da sua casa e espalhadas pelo país estão cerca de 300 obras que retratam o mundo rural português dos anos 50 e 60 do século passado.

Questiona-se porque continua a pintar uma vez que “os responsáveis autárquicos não são recetivos a apoiar e incentivar os artistas”. Tó Carvalho refere-se ao facto de já ter recebido promessas de vários responsáveis camarários para instalação do seu espólio artístico num espaço digno, mas até agora nada se concretizou. Esta frustração leva-o a afirmar que se sente “fortemente desiludido com a política e com os políticos em geral”. No entanto, ainda mantém alguma esperança “de que esta câmara seja receptiva à criação de um espaço que enriqueça o parque cultural de Tomar”.
Em termos profissionais foi funcionário (criador de publicidade) no grupo Mendes Godinho de 1959 a 1983. Exerceu as funções de mordomo da Festa dos Tabuleiros em 1978 e 1987 e foi vereador e presidente da Comissão Municipal de Turismo na primeira Câmara eleita após o 25 de Abril. Outra atividade que marcou a sua vida foi a fundação do CIRE – Centro de Integração e Reabilitação de Tomar, em 1975.
Apesar de ter nascido em Castelo Branco, veio para Tomar aos oito anos e por isso considera-se “mais tomarense do que alguns de cá”.

Da cidade destaca o Convento de Cristo, o Mouchão, a igreja de Santa Maria do Olival, o rio Nabão, a paisagem, os tomarenses e a amizade criada com a comunidade local.
É no Mouchão que se sente “em paz de espírito”. Só lamenta “que o tivessem transformado em ginásio canino”.
Em suma, para Tó Carvalho viver em Tomar “é uma paixão / desilusão”.