O dia de hoje é de luto. De dor. De perplexidade. De incompreensão face à intolerância. De medo relativo face ao futuro que se aproxima. Dezenas de mortos e feridos, famílias dizimadas, desejo de vingança e acerto de contas, políticos, militares e líderes religiosos e filosóficos pronunciaram-se, de modo quase unânime no mundo ocidental contra a barbárie imposta por um punhado de pessoas que, em nome do seu Deus, continuam a tentar impor um regime que é minoritário no mundo, pelo uso do terrorismo, da força, da violência, da estupidez ignóbil e inaceitável.
O que fazer? Como fazer? Onde fazer? Com que recursos o fazer? Como modificar visões e vontades radicais junto de pessoas que não são razoáveis, nem moderadas, nem respeitam o seu Deus. Se Deus é amor, tolerância, apelo a valores genuínos de sensibilidade e afetos, gritos de união e paz, como pode o radicalismo ser uma mensagem de um qualquer Deus?
Não quero ser nem parecer xenófobo, nem pretendo justiça do género “amor com amor se paga” mas que caminho nos sobra? Sobretudo quando o Estado Islâmico nos envia uma mensagem que diz apenas que os “Estados cruzados” devem preparar-se para “dias bem sombrios” e que “aquilo que vos espera será mais duro e mais amargo, com a permissão de Alá”. Quem interpreta a vontade de um defunto desta forma? Com que autoridade? Com que visão? Com que propósito nobre de elegias ao amor e solidariedade entre povos, assente na liberdade, na tolerância, no respeito pela diversidade?
Os países ocidentais, na sua vertente humanista, estão a deixar gente boa e, no meio destes, os seus inimigos. Os radicais, além disso, até já formam (eu diria antes que deformam) pessoas do nosso mundo ocidental, zangadas com a vida, revoltadas com a humanidade, ávidas de fazer o mal pelo mal e capazes de fazerem justiça pelas suas mãos e serem soberanos com a vida daqueles que não pensam como eles.
Para onde caminhamos? Como podemos combater, sem ódios, sem vinganças, sem ser “olho por olho, dente por dente” esta mole de seres vivos que se parecem com pessoas mas não são pessoas humanas?
Confesso que não sei. Confesso que não tenho muita esperança de que o mundo ocidental consiga “amaciar” os radicais do mundo árabe. Conheço muçulmanos bons – a maioria – mas é natural que, sem muita explicação, a tentação seja tomar o todo pela parte. Será um erro mas como evitar estes erros se a incompreensão não gera respostas positivas, satisfatórias, de esperança?
Já nunca mais estaremos seguros até que consigamos desmantelar o “Estado Islâmico”. Vai ser difícil fazê-lo sem eliminar as estruturas e os seus seguidores. E sem investir em condições duradouras e fortes de mitigação de extremismos e radicalismos. Será isso possível durante os anos que me faltam de vida? Não sei mas tenho mais dúvidas do que certezas.
Diz-nos a TSF que “a Torre Eiffel ganhou as cores da bandeira da Bélgica. Em Berlim, nas Portas de Bradenburgo, aconteceu o mesmo. Lisboa iluminou os Paços do Concelho. Nas ruas de Bruxelas também há homenagens”. O que é que isso contribui para eliminar a raiz dos problemas?
Começo a ficar cada vez mais adepto da “tolerância zero” mas há um lado em mim que diz que não pode ser assim. Como convencer para a “razão” quem acha quem tem essa razão do seu lado e considera que somos nós que não temos razões para discutir sequer um modelo de sustentabilidade humana com base no respeito da diversidade e na multiculturalidade? Como aceitar que vivam no nosso mundo sabendo que nos veem como inimigos? Não sei. Não sei como alguém pode desatar este nó cego e que cega a visão de seres que, como eu, nasceram pessoas…
Entretanto, Obama fez mais pela união de vontades com Cuba e com tudo o que isso representa, com esta visita, do que anos de sanções e bloqueios. E fez bem.
E, no meio de tudo isto, olho para a minha célula familiar e vejo quão frágil é a vida e a forma tonta e fútil como damos valor a coisas efémeras, sem qualquer valor civilizacional, sem celebrarmos devidamente a vida daqueles que pertencem à nossa vida. E a forma como nos arrependemos depois por não termos amado como devíamos, por não termos elogiado como era merecido, por não termos dado de nós como os outros desejavam, mereciam e pediam em silêncios comprometedores sem que disso nos apercebêssemos…
Hoje vivo um dia triste. Negro. Sombrio. De perda. De derrota humanitária. De difícil aceitação de muito daquilo que me rodeia, no mundo em geral e no meu mundo, em particular. Sinto-me insignificante, impotente, incapaz, derrotado, inconformado.