O país volta a entrar às 24h desta quinta-feira, 15 de outubro, em situação de calamidade, o que não sucedia desde abril. As medidas que se impõem não são tão restritivas como as decretadas em situação de emergência, mas desta vez o governo pretende dar passos que vão além das recomendações, tornado obrigatório o uso de máscara na rua e a utilização da aplicação StayAway Covid, em determinadas circunstâncias, agravando também as multas para aqueles que não cumpram as regras.
O primeiro-ministro António Costa disse em entrevista ao Público que sentiu necessidade de dar “um abanão” ao país, porque “as pessoas começavam a dar sinais de facilitar”, não encarando o vírus com a cautela que a Direcção-Geral de Saúde entende ser necessária. “O tempo foi passando, as pessoas foram ficando saturadas, foram-se habituando ao risco ou desvalorizando o risco”, justificou o primeiro-ministro, afastando “para já” um cenário de confinamento obrigatório, insistindo que isso só se conseguirá com um “bom comportamento” individual. “Se posso jurar a pés juntos que não serão dados passos dramáticos? Não posso. É uma questão de bom senso. Mas temos de o evitar.”
A decisão tomada em Conselho de Ministros coincidiu com o anúncio pela DGS do maior registo diário de casos positivos, desde o início da pandemia: 2.072. Mas se o número de novos casos passou a barreira dos dois mil (prevendo-se para breve a fasquia dos 3 mil, o que já era expectável nas previsões para o mês seguinte ao início das aulas), os restantes indicadores são melhores do que os registados durante o período de confinamento, em situação de emergência, nomeadamente ao nível dos óbitos e dos internamentos em cuidados intensivos, que são agora cerca de um terço dos registados em abril. Além disso, a maioria dos casos positivos não correspondem a pessoas doentes: são assintomáticos e/ou pessoas com sintomas ligeiros, que podem recuperar em casa. Mas com a chegada do frio – e, inevitavelmente, da gripe –, crescem os receios sobre a capacidade de resposta do Serviço Nacional de Saúde.
1. O que muda com a situação de calamidade, decretada de 15 a 30 de outubro?
Mudam sobretudo os poderes do governo para limitar direitos e liberdades dos cidadãos. A Lei n.º 27/2006 define que o governo pode assim dispor sobre:
a) A obrigatoriedade de convocação da Comissão Nacional de Protecção Civil;
b) O acionamento do plano de emergência de âmbito nacional;
c) O estabelecimento de cercas sanitárias e de segurança;
d) O estabelecimento de limites ou condições à circulação ou permanência de pessoas, outros seres vivos ou veículos, nomeadamente através da sujeição a controlos coletivos para evitar a propagação de surtos epidémicos;
e) A racionalização da utilização dos serviços públicos de transportes, comunicações e abastecimento de água e energia, bem como do consumo de bens de primeira necessidade;
f) A determinação da mobilização civil de pessoas, por períodos de tempo determinados.
Além disso, a declaração da situação de calamidade pode, por razões de segurança dos próprios ou das operações, estabelecer limitações quanto ao acesso e circulação de pessoas estranhas às operações, incluindo órgãos de comunicação social.
2. Vamos ser obrigados a usar sempre máscara na rua?
Talvez. Mas por enquanto, não. O Governo já recomendava o uso de máscara na via pública ”quando não for possível manter a distância de dois metros entre pessoas” e agora essa “recomendação” deverá passar a “obrigação”, caso seja aprovada pela maioria dos deputados na Assembleia da República. Contudo, o uso não será obrigatório no espaço rural ou em zonas menos densamente povoadas, onde não se esteja rodeado de pessoas a pouca distância, nem no âmbito das atividades desportivas já permitidas (jogos de futebol, por exemplo).
3. Posso estar a conversar no jardim com mais 5 amigos?
Não. Os ajuntamentos ficam limitados a 5 pessoas (até agora, era 10). Ou seja, seis amigos não podem estar a conversar num jardim, na via pública, num café ou restaurante. No caso dos estabelecimentos de restauração, podem ir jantar juntos, por exemplo, desde que fiquem em mesas separadas (por exemplo, 5 + 5 amigos).
4. Nem no caso de ser um evento académico, festejando a entrada na universidade?
Nem nesse casos. As praxes estão proibidas e as universidades e politécnicos estão impedidos de realizar festejos académicos ou atividades que não sejam de caráter letivo ou científico.
5. E se já os tiver convidado para a minha festa de anos, na próxima semana?
Nesse caso pode, desde que no total o número de pessoas presentes não ultrapasse as 50 pessoas. É esse o limite definido para reuniões familiares ou de amigos, como batizados, casamentos e similares. E para os que já estavam marcados antes de 14 de outubro, nada muda: a lei só se aplica para eventos agendados a partir desta data.
6. Faço parte de uma família numerosa e o meu agregado familiar tem 7 pessoas… quer isso dizer que não podemos ir juntos a um restaurante?
Podem, pois o limite de 5 pessoas em restaurantes e outros espaços públicos prevê a excepção dos coabitantes. No caso de serem apenas amigos, também podem ir ao restaurante mas ficando em mesas separadas, em grupos de 4 a 5 pessoas.
7. Os teatros e cinemas vão voltar a fechar?
Não. Um “ajuntamento” não é equiparado a “público”. Em todos os eventos, sejam culturais ou desportivos, mantêm-se em vigor as medidas de segurança definidas pela Direção-Geral da Saúde, nomeadamente a redução da lotação e a obrigatoriedade do uso de máscara nos recintos.
8. Vamos ser obrigadas o instalar a app StayAway Covid nos telemóveis?
Talvez. O governo terá de obter a aprovação do Parlamento nesta matéria e há já instituições, como a Comissão Nacional de Proteção de Dados, que se opõem a essa violação dos direitos de privacidade dos cidadãos. Caso avance a proposta do governo, essa obrigatoriedade será “em contexto escolar, profissional e académico, nas Forças Armadas, nas Forças de Segurança e no conjunto da Administração Pública”.
9. Que multas podem ser aplicadas agora?
Os cidadãos que não usem máscara nos locais obrigatórios podem pagar multas até 500 euros. Nos espaços de restauração, que até aqui não tinham sido alvo de grandes vistorias, vão ter assegurar “o escrupuloso cumprimento das regras em vigor quanto à lotação e ao afastamento que é necessário assegurar”, arriscando multas até 10 mil euros se não o fizerem.