Esta semana não poderia deixar de refletir sobre o PSD, sobre o Congresso de Espinho e sobre o futuro deste partido. Com base no passado e na viagem que fiz no passado fim de semana.

Há muitos anos que eu não me deslocava a um Congresso do PSD. Durante mais de uma década, talvez quase duas décadas, não houve um único destes magnos encontros a que eu não tivesse assistido. Lembro-me bem dos congressos da época Cavaco (devo ter começado a assistir no início dos anos 90, uma vez que o primeiro Congresso da JSD onde estive foi em 1988, em Tróia), das lutas após a saída de Cavaco, entre Fernando Nogueira, Durão Barroso e Santana Lopes, sobretudo no Coliseu.

Creio que o primeiro a que assisti foi no Pavilhão Carlos Lopes, em Lisboa, em 1990. Lembro-me do Congresso de 1992, no Porto, no Pavilhão Rosa Mota, tendo eu saído do quartel da Figueira da Foz, onde cumpria serviço militar, para me juntar ao meu saudoso pai, no Porto.

Não posso esquecer nunca o mítico congresso do Coliseu de Lisboa. Nesse congresso, no dia de encerramento, estava eu e o meu amigo Jorge Lopes, da Chamusca, sentados a meio da plateia do Coliseu de Lisboa, quando um cavalheiro pediu para se sentar num lugar vago entre nós. Percebemos quem era e que acabar de ser eleito vogal do Conselho de Jurisidição Nacional do PSD, preparando-se para ser chamado ao palco. Enquanto esteve sentado, foi simpaticamente conversando connosco, desconhecidos mas companheiros de militância. Hoje é Presidente da República: Marcelo Rebelo de Sousa, uma figura menor nesse congresso. No ano seguinte seria Presidente do PSD, num Congresso onde tive o privilégio de estar na sala de contagem dos votos, liderada pela Dra Leonor Beleza, de onde só pudemos sair 5 minutos depois de a mesma ter saído com os resultados na mão, a fim de evitar fugas antecipadas de informação. Que adrenalina e que saudades desses tempos…

Depois, em termos de congressos com emoção, veio logo Tavira em 1998. E a seguir, em 1999, Durão Barroso emerge em Coimbra. Andava eu já nas listas para o Conselho Nacional, de saída da JSD. E Barroso e Santana sempre em luta. E eram lançados novos quadros, recuperados outros e aguardavam-se sempre as densas intervenções doutrinárias, misturadas com picardias. Aprendia-se muito no meio das “bicadas”. Aprendi muito, pelo menos eu o posso afirmar.

Em Viseu, no ano 2000, tive o privilégio de fazer parte da entourage de Santana Lopes. Ter-me-á achado piada e algum potencial e, confesso, eu olhava para ele como um aprendiz de Jedi olha para o seu Mestre. Fui até uns dias mais cedo para Viseu, com Pedro Santana Lopes, Rui Gomes da Silva, Henrique Chaves e Manuel Frexes, para preparação detalhada da tática. Hoje em dia apenas mantenho contacto com Rui Gomes da Silva, depois de me ter sentido de certa forma traído por Santana Lopes (que continuo a admirar pelo carisma) e de ter perdido naturalmente o contacto com os demais. De posições cimeiras na lista para o Conselho Nacional acabei por entrar na lista candidata à Comissão Política Nacional. Santana Lopes fez-me acreditar que eu seria o mais forte quadro com potencial de combate a Relvas; e eu aceitei o desafio. Cavei aí a minha distância para o “Relvismo”, com algumas consequências subsequentes, e acabei por ser traído por Santana Lopes mais tarde quando, ao receber das mãos de Barroso o PSD, manteve o mesmo Relvas como Secretário-Geral e nem uma palavra me dirigiu, depois de me ter pedido que iniciássemos um percurso alternativo a Relvas no distrito e me ter sugerido que fizesse uma intervenção no Congresso onde entronizou Relvas. Da minha parte ficámos imediatamente conversados. E definitivamente conversados, diga-se.

Mais tarde, quando Santana “ensaiou” um regresso, por interpostas pessoas tentou uma abordagem mas recusei sempre voltar a conversar sobre PSD e listas para o PSD com ele. Disse que não queria ouvi-lo a três amigos comuns. Nunca mais conversámos mas continuo a não conseguir evitar ser seduzido pela forma como ele interage com os afetos dos militantes e das pessoas.

E desde então, ainda que tenha estado em mais um ou outro congresso, como Lisboa, em 2002, Oliveira de Azeméis, em 2004, Pombal em 2005, fui perdendo a ligação. E saindo de cena. Seguro de que aquele mundo não era o meu e que eu queria fazer coisas mais interessantes e maiores na vida.

Voltei este fim de semana aos congressos do PSD. Revi amigos, gostei de os rever, reatei amizades suspensas, marquei distâncias para aqueles a quem não pretendo dar confiança, tentei compreender o que tinha mudado. E vim triste. Tirando a extraordinária intervenção de Santana Lopes, a recheada comunicação de Paulo Rangel e os ensaios de provocação de José Eduardo Martins e Pedro Duarte, dois companheiros desde a “escola da JSD”, dos quais sou amigo, pouco mais interesse político teve este congresso. No meio de tudo isto surgiu a patética intervenção de Aguiar Branco, seguramente encomendada por alguém. No meio de desafios a que todos os barões, candidatos a barões e enfant terribles concorressem a câmaras municipais, revelou o tamanho da sua ambição: ser ele mesmo candidato à assembleia municipal da terra onde costuma passar férias. Confesso que soube a pouco e o tornou um ser ainda mais ridículo do que aquilo que eu já o considerava ser. E depois a tola teimosia de elevar Maria Luís Albuquerque a Rising Star. Nem comento mais…

O PSD de hoje é menos social-democrata do que os seus slogans. Alguns dirigentes continuam no mesmo registo de amiguismo e “controleirismo”. Poucos são os que se dão à maçada de preparar as suas intervenções com substância doutrinária. E estamos na fase dos crocodilos: alguns fortes predadores, dentro de água, com os olhos de fora, espreitando de modo camuflado e esperando a melhor oportunidade para atacar a presa. E a presa é Pedro Passos Coelho e os fiéis que ficarem a seu lado. Sim, porque alguns fugirão, como sempre fugiram no passado, para irem jurar fidelidade eterna ao crocodilo que revelar maior capacidade para se impor.

Terei pena por Pedro Passos Coelho. Que conheci em finais dos anos 80 e que viu, na altura, em mim, um puto com pinta e no qual valia a pena apostar. Foi ele quem me convidou para o Conselho Nacional e foi por isso que conquistei o meu espaço e acabei na Comissão Política Nacional da JSD, liderada por Jorge Moreira da Silva, hoje seu número dois.

Os congressos do PSD de hoje terão, porventura, menor interesse mediático e menor adrenalina política mas não deixam de continuar fiéis ao seu passado: taticismo misturado com estratégia, lealdade com interesse, convicções com conveniências, gente densa misturada com vulgares caciques disfarçados de barões e baronetes.

É, também, por isso que continua a ser um espelho fiel de Portugal e da forma de ser das pessoas, das empresas, das organizações.

Pedro Marques

Pedro Marques, 47 anos, é gestor, gosta de ler, de exercício físico e de viajar

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