Termina a 15 de outubro a campanha de angariação de fundos lançada pela linguista Vera Ferreira para assegurar a continuação do ensino do minderico nas escolas de Minde. Conheça a sua causa e saiba como apoiá-la.

Na da marroa dos salgados do Brasil (pastelaria) “Praça Velha”, num dos largos da vila de Minde, no concelho de Alcanena, pode comprar-se cinqueto (pão), beber uma regatinha (água) ou um joão da garota (café), mas são poucos os clientes que dão uso ao vocabulário rico e variado do minderico.

Reconhecida internacionalmente em maio de 2011 como uma língua individual autónoma e viva, o minderico – que se pensa ter sido inicialmente um socioleto (surgida num grupo socioprofissional, entre cardadores e comerciantes das mantas de Minde), com os primeiros registos a datarem do século XVII -, encontra-se em risco de desaparecer.

São apenas 24 os falantes fluentes de minderico, 150 os ativos e mil os passivos (entendem mas não falam), sobretudo devido à quebra de transmissão intergeracional nos últimos 40 anos.

Vera Ferreira, linguista documental, tomou em mãos a tarefa de provar que o minderico é uma língua com vocabulário e estrutura gramatical diferente do português – onde tem a sua base, com influências de moçárabe, espanhol, português antigo – e que é possível revitalizá-la.

Feito o trabalho de recolha e documentação com o apoio da Fundação Volkswagen, no ano letivo 2012/2013 iniciou, já no âmbito do Centro Interdisciplinar de Documentação Linguística e Social (CIDLeS), que criou em Minde com outros investigadores, um projeto de revitalização do minderico, com as crianças nas escolas, com professores e a comunidade.

Sem reconhecimento oficial que permita introduzir o minderico no ensino como uma disciplina autónoma, Vera Ferreira lançou a 13 de agosto uma campanha de angariação de fundos na Internet (‘crowdfounding’) para criar material didático que sirva de apoio às aulas para cada um dos anos do primeiro ciclo (uma vez por semana para cada um dos quatro anos).

Até 15 de outubro precisa reunir 8.900 euros para assegurar a continuação do minderico na escola (com as aulas e o manual) e a formação dos professores que integram a língua na expressão dramática, não só sobre a estrutura gramatical mas também do ponto de vista pedagógico, porque ensinar uma língua ameaçada não é a mesma coisa que ensinar uma segunda língua. Por isso as aulas são feitas em interação com a comunidade.

A empresa de ilustração Princess Pea, que tem sede em Minde, associou-se à campanha e o escritor, ilustrador e realizador de filmes de animação Afonso Cruz vai criar um livro bilingue para crianças para fomentar a escrita e a leitura em minderico.

Se a campanha conseguir chegar aos 12.000 euros, o projeto alarga-se então à comunidade, com dois workshops por cada período letivo, sobretudo para os encarregados de educação dos alunos inscritos, e a elaboração de um livro de receitas locais em minderico.

Mas, se até 15 de outubro, não chegar ao mínimo estipulado, o dinheiro entretanto doado é devolvido e a campanha cai por terra.

Até 2 de outubro, tinham sido angariados 1300 euros, doados sobretudo por estrangeiros, talvez porque não haja a noção de que basta muito pouco – “um euro pode fazer toda a diferença” -, lembra Vera Ferreira.

“Das cerca de 6.500 línguas existentes no mundo, mais de metade irá desaparecer no espaço de uma geração. A cada 15 dias morre uma língua, e com isto quero dizer que desaparece o último falante”. E, com elas, todo um legado social e cultural, representando uma perda enorme para a diversidade, a multiculturalidade e o multilinguismo.

Apoiar esta causa:

Diretamente na plataforma Hubbub:

https://hubbub.net/p/minderico

no site do CIDLeS:

http://www.cidles.eu

na Facestore:

https://www.facebook.com/pages/CIDLeS/345122738852829?sk=app_519984624691308

no espaço que o centro ocupa no antigo mercado de Minde

ou ainda adquirindo o dicionário minderico-português em:

www.cidles.eu/shop/order-dicion%C3%A1rio-bilingue-pia%C3%A7%C3%A3o-portugu%C3%AAs/ ou na Princess  Pea http://princesspea.net/shop2015/categoria-produto/as-nossas-causas

Sentiu-se pela primeira vez jornalista quando aterrou à noite e sem hotel marcado em Windhoek para cobrir o processo de independência da Namíbia. Era estagiária no semanário África, área que a levou à agência Lusa, a cujos quadros pertence há quase 25 anos. Foi editora adjunta da Editoria África e, mais recentemente, da Editoria Lusofonia/Mundo, com passagem, como redatora, na Editoria Economia. É, contudo, ao distrito de Santarém (que a adotou) que regressa sempre. Gosta da diversidade, da pluralidade, da diferença. Acredita que o mediotejo.net pode mostrar que há mais vida para além da que marca a chamada “atualidade”.

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