Deveria o município estar a apoiar uma obra a pedido da Igreja? As opiniões dividiram-se em Alcanena. Foto: mediotejo.net

O Memorial à antiga Igreja de São Pedro, destruída em 1915, causou alguma discussão na sessão de Assembleia Municipal de 25 de fevereiro. A CDU alertou que se estava a cruzar os limites do princípio de separação da Igreja do Estado ao ser o município a financiar esta obra escultória, proposta pela paróquia de Alcanena, que vai ser instalada na Praça Marechal Carmona, onde se situava o edifício. Em resposta, o presidente Rui Anastácio (Cidadãos por Alcanena) explicou que a escultura vai ser paga por um mecenas e que neste caso em específico está em causa a memória histórica do concelho. 

Corria o ano de 1915 quando a Igreja de São Pedro (ou Santa Maria, há divergências quanto ao orago) em Alcanena foi alvo de um violento incêndio. Nunca se encontrou o responsável, mas as suspeitas recaem ainda hoje sobre os republicanos radicais, tradicionalmente associados à maçonaria ou à carbonária, e a tensão anti-Igreja que se vivia à época.

Atualmente existe outra Igreja nas imediações da destruída, mas a memória deste incidente permanece no imaginário popular alcanenense, estando bastante ligado ao contexto político que faria nascer o concelho de Alcanena, separando-se este de Torres Novas, há mais de um século.

A Fábrica da Igreja Paroquial de Alcanena pediu à Câmara Municipal para instalar na Praça Marechal Carmona, atualmente um espaço público mas onde se situava o antigo edifício religioso, um memorial à Igreja destruída.

Na sessão de assembleia municipal de 25 de fevereiro o projeto foi apresentado aos deputados, depois da instalação da obra já ter sido aprovada em reunião de executivo. O design da peça inclui um texto alusivo ao monumento, mas não se chegou a ler o conteúdo do mesmo aos presentes.

As criticas partiram da bancada da CDU. Carla Pereira começou por frisar que não estava em causa a liberdade religiosa, tendo feito notar que o Estado Português é laico e há pressupostos de separação da Igreja a cumprir. A peça escultória está estimada, referiu, em 7.315 euros e o município já aprovou um financiamento à Paróquia de Alcanena de 20 mil euros em 2021. “Isto mete aqui uma questão ética”, afirmou.

A argumentação da deputada gerou rapidamente contestação, com Tiago Guedes (PS) a referir que os 20 mil euros mencionados foram para os festejos do centenário, não para esta obra em concreto. Mas “é uma questão que pode ser debatida”, disse.

A mesma explicação foi reiterada por Rui Anastácio, referindo que os 20 mil euros atribuídos pelo município se destinaram a obras de reabilitação da Igreja. “A Câmara Municipal não está a gastar dinheiro, é um mecenas a financiar”, reiterou, adiantando ainda que toda a instalação da peça vai ser acompanhada por um arqueólogo e a praça vai ser embelezada com laranjeiras. 

O presidente recordou ainda que em reunião de executivo a oposição socialista mencionou que não fazia sentido levar o tema a Assembleia Municipal, mas que se entendeu que era preferível. “É um monumento alusivo a um monumento”, constatou, “achámos por bem trazer o assunto à Assembleia Municipal porque deve ser decidido por todos nós”.

Ainda dentro da discussão, O presidente da junta de Serra de Santo António, Eurico Justo (Cidadãos por Alcanena), argumentou que apoiar as obras da paróquia não se trata necessariamente de apoiar a Igreja, mas instituições locais que possuem espaços que são de usufruto coletivo. 

A instalação da escultura foi aprovada por maioria, com abstenção da CDU. 

Cláudia Gameiro

Cláudia Gameiro, 32 anos, há nove a tentar entender o mundo com o olhar de jornalista. Navegando entre dois distritos, sempre com Fátima no horizonte, à descoberta de novos lugares. Não lhe peçam que fale, desenrasca-se melhor na escrita

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1 Comentário

  1. Talvez o dito mecenas tenha problemas de consciência com o assunto pois não era vivo e por
    explicação dada numa reunião da Igreja não se percebeu o que queria com esta obra.
    Problemas de famílias antigas ricas que deveriam ser evitados, pois vai criar divergências na nossa terra dado as pessoas envolvidas.
    A Camara devia perder tempo com coisas importantes.

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