O restaurante ‘Tulipa’ reabre renovado esta quinta-feira. Oferece mais 16 lugares, um novo balcão, casas de banho remodeladas, um visual mais sóbrio e alguns apontamentos em verde, a cor da esperança para combinar com o otimismo do proprietário António Larguinho. Mais de dois meses de portas fechadas, embora com serviço take away, 11 trabalhadores, nenhum despedimento, recurso ao lay-off simplificado no contexto da pandemia e agora mostrar o seu melhor, para ultrapassar a fase mais crítica. Apesar do otimismo, António admite que a sustentabilidade financeira será difícil se a lotação a 50% se mantiver por muito tempo. E teme que não haja saída se chegar uma segunda vaga da pandemia que obrigue a um retrocesso e a novas medidas de confinamento.
O restaurante ‘Tulipa’, que começou como bar e evoluiu para o serviço de refeições, nasceu há cerca de 18 anos no Pego (Abrantes). Antes da pandemia, durante a semana, servia diariamente entre 90 a 100 refeições. Agora o futuro revela-se incerto. Obrigado a encerrar durante dois meses, o proprietário António Larguinho aproveitou para remodelar o restaurante. Investiu cerca de 70 mil euros, avançou com obras, que já estavam pensadas há dois anos. Abre ao público esta quinta-feira, o primeiro dia para ultrapassar a fase mais crítica destes tempos de covid-19.
O que será diferente? Perguntamos. Por certo muita coisa exceto “a qualidade que é para manter e os preços”, garante António. O ‘Tulipa’ apresenta-se “mais jovem, com bom ar. Uma das salas foi aumentada, temos mais 16 lugares”, indica. Um investimento com capitais próprios que representa “um risco” num dos setores mais afetados pela pandemia.
“O problema é que ninguém sabia que a covid-19 ia aparecer. As obras estavam programadas e começaram na última semana de fevereiro. A 12 de março encerra tudo… e não havia como recuar”, conta. Contudo, independentemente da pandemia “investia na mesma, porque era um risco calculado tal como a crise de 2010. Como estávamos preparados aguentámos e agora também estávamos preparados para tempos menos bons… ninguém esperava que fosse isto. As consequências ainda são desconhecidas mas as decisões estavam tomadas”.

Agora, na hora de reabrir e relançar um restaurante renovado, começa por ter de cumprir as regras impostas pelo Governo segundo as orientações da Direção-Geral da Saúde (DGS); ou seja, a redução do número de clientes em 50%, da qual resulta menor proveito financeiro, e mais custos, designadamente com os materiais de desinfeção e equipamentos de proteção individual para os trabalhadores.
Os restaurantes e os cafés que reabriram desde a passada segunda-feira devem privilegiar o uso das esplanadas e o serviço ‘take away’ e incentivar o agendamento prévio, segundo as orientações da DGS, que obrigam ainda a um distanciamento mínimo de 2 metros entre clientes, ementas descartáveis ou que possam ser desinfetadas entre cada utilização. São muitas as exigências, que não desmotivam António Larguinho e a sua equipa.
Aconselha por isso a que os clientes “marquem mesa. Grande parte deles chega de Abrantes é melhor garantir mesa. As marcações têm sempre prioridade”, nota.
Entre as medidas a adotar, a autoridade de saúde destaca a redução da capacidade máxima do estabelecimento, por forma a assegurar o distanciamento físico recomendado de dois metros entre as pessoas, privilegiando a utilização de áreas exteriores, como as esplanadas (sempre que possível) e o serviço ‘take-away’. A disposição das mesas e das cadeiras “deve garantir uma distância de, pelo menos, dois metros entre as pessoas, mas os coabitantes podem sentar-se frente a frente ou lado a lado, a uma distância inferior”.
As empresas devem impedir que os clientes modifiquem a orientação das mesas e das cadeiras, permitindo que os trabalhadores o façam, mas sempre garantindo a distância necessária.

A limpeza e desinfeção dos espaços deve respeitar as orientações anteriormente emitidas pela DGS, sendo que os proprietários devem desinfetar, pelo menos seis vezes por dia, todas as zonas de contacto frequente (maçanetas de portas, torneiras de lavatórios, mesas, bancadas, cadeiras, corrimãos).
O mesmo deve ser feito com “os equipamentos críticos (tais como terminais de pagamento automático e ementas individuais”, após cada utilização.
A sala está completa mas os clientes irão sentar-se, a partir de agora, de forma intercalada “mesa sim, mesa não para respeitar os dois metros de segurança. As pessoas vão ter de entrar de máscara” explica. À entrada haverá uma máquina automática para desinfetar as mãos, e nas várias zonas de acesso, designadamente nas casas-de-banho, terão embalagens com desinfetante. “As regras vão ser cumpridas. E o cliente tem de fazer a parte dele”, nota António Larguinho.
Cumpre assim mais uma orientação estabelecida, quanto à necessidade de higienização das mãos com solução à base de álcool ou com água e sabão à entrada e à saída do estabelecimento por parte dos clientes, que devem respeitar a distância entre pessoas de, pelo menos, dois metros e cumprir as medidas de etiqueta respiratória.
O processo de higienização obedece “a mais custos, máquinas, líquidos, desinfetantes. São produtos certificados, caros. Há muitos no mercado mas não são certificados. Nós cumprimos a regras. Agora é fácil adquirir esses produtos, há um mês não era. Logo no início, olhei para os países vizinhos e encomendei. Tenho stock para dois/três meses”, refere.
Além dos proprietários, no restaurante ‘Tulipa’ trabalham 11 pessoas. Todos em lay-off embora parte deles apenas a meio tempo para dar resposta ao serviço de take away. “O movimento que tínhamos [antes da pandemia] obrigava a ter uma equipa reforçada. São muitas horas. Abrimos de manhã, servimos almoços e jantares, aos fins-de-semana, folgas… a equipa para funcionar a 100% tem de ter 11 a 12 pessoas. A que estava é a que está. Não tenho interesse em despedir ninguém. Se conseguimos ultrapassar a covid-19 juntos também havemos de ir para a frente juntos. Tenho trabalhadores comigo há 12 anos. Somos uma família”, considera o empresário.
António explica que, segundo as regras, também os trabalhadores usam máscara “exceto a parte dos quentes, grelhadores, fogões não é obrigatório. No atendimento ao público, balcão e mesas é obrigatório”.

Quando fizemos esta reportagem, António Larguinho ainda não havia decidido se todos os trabalhadores regressam do lay-off. “São muitos… mas penso que vamos dividir os horários. A melhor hipótese por agora é metade do horário em lay-off e outra metade a trabalhar. Vamos analisando, porque desconhecemos qual a adesão das pessoas. Penso positivo, creio que os clientes virão. Penso que não terão medo de partilhar o espaço com outras pessoas, mas vamos vendo. Se tudo mudar, entram todos [os trabalhadores] ao serviço em horário completo”.
O ‘Tulipa’ já conta com marcações para o dia da abertura e para sexta-feira. António observa “uma preocupação do cliente de querer vir. As pessoas estão há muito tempo confinadas em casa e querem sair. Penso que na segunda ou terceira semana de junho quase que normaliza, é a minha expetativa!”, afirma. Até porque as aldeias não contam este verão com as tradicionais festas populares. O que pode significar “um balão de oxigénio para o sector da restauração”.
O ‘Tulipa’ irá abrir às 09h00 para servir almoços, jantares e lanches “para dar continuidade no verão à oferta de mariscos”. Ainda assim, o horário será mais curto, com fecho às 23h00 quando no passado encerrava às 00h0. O dia de descanso semanal mantém-se à terça-feira. A aposta permanece a mesma: na comida tradicional, nos famosos “lombinhos na frigideira” e também nos petiscos como o bucho e tripa, especialidade pegacha que o ‘Tulipa’ tem disponibilizado em serviço take away durante o encerramento e que pretende continuar à quarta-feira.
Tal solução “foi boa aposta. Não serviu para ganhar dinheiro mas serviu para pagar alguns salários. Porque estamos há dois meses e uma semana em lay-off e ainda não recebemos qualquer apoio” do Estado, garante o empresário. Considera que “a resposta deveria ser mais rápida. Nós tivemos capacidade, com capitais próprios, para pagar os ordenados mas muitos não tiveram”.
Apesar do otimismo António Larguinho teme que o negócio não seja financeiramente rentável “se durante muito tempo permanecer a capacidade em 50%. Porque durante a semana servimos almoços a trabalhadores, com uma hora para comer. Se tínhamos capacidade para 100 pessoas – agora temos para 116 – dividido ao meio representa 50 lugares e o restaurante está cheio. As pessoas não esperam”, diz. Contudo, contas feitas “só um mês depois”, refere.
Se o desconfinamento correr mal “temos duas hipóteses: o vírus aparece novamente e volta tudo à estaca zero, ou vamos andando e vendo. Se voltarmos a ter os estabelecimentos fechados, possivelmente em novembro, dezembro, época de Natal e Passagem de Ano, se tivermos regras mais apertadas, aí não será fácil!”, assegura.
Por isso, defende “cautela” e promete abrandar “nos investimentos”. O último, porventura “só conseguirei recuperar em três ou quatro anos. O futuro ninguém sabe”. Para já, o empresário respondeu aos desafios do presente e mantém uma equipa unida para trabalhar o futuro de um serviço de referência na gastronomia regional e um dos pilares da sociedade e do turismo no interior do país.