O Partido Social Democrata e o Bloco de Esquerda apresentaram a sua renúncia de mandato autárquico depois do presidente eleito pelo Partido Socialista recusar que aqueles partidos integrassem o executivo. José Felício (PS) vai comunicar agora à Comissão Nacional de Eleições, ao Governo e à Câmara Municipal a decisão dos eleitos daqueles dois partidos e perceber qual será o passo seguinte. A convocação de eleições intercalares pode estar em cima da mesa, mas apenas seis meses após o ato eleitoral de 26 de setembro.
Perante o impasse e após terem sido, por duas vezes, rejeitadas as propostas do PS para a composição do executivo da Junta de Freguesia da União de Alvega e Concavada (Abrantes), na quinta-feira, 25 de novembro, dia em que o PS iria voltar a colocar a primeira proposta em cima da mesa, sem a integração de membros da oposição no executivo, PSD e BE decidiram apresentar a sua renúncia ao mandato autárquico.
No cerne da questão está a recusa do presidente eleito pelo PS, José Felício, em integrar elementos dos dois partidos no executivo da Junta de Freguesia, quando, apontam esses partidos, os socialistas não obtiveram maioria, tendo ganho as eleições autárquicas por 23 votos, sendo que os dois partidos da oposição obtiveram mais mandatos que a lista liderada por José Felício. No entanto, para o eleito do PS, governar com uma lista que não é a sua não faz sentido, tendo admitido, e proposto, entregar a presidência da Assembleia à oposição, sugestão que não foi aceite, mantendo-se o impasse negocial.
O PS elegeu 3 elementos, o PSD igualmente 3 e o BE outros 3. Na primeira reunião, a 16 de outubro, o presidente de Junta apresentou uma proposta com 3 elementos, todos do PS, tendo sido rejeitada com 6 votos contra, do PSD e BE, e 3 a favor dos socialistas. Na segunda reunião, a 21 de outubro, tal como o mediotejo.net noticiou, a proposta apresentada pelo PS para formação de executivo, com os mesmos nomes – Carlos Alberto da Cruz Francisco e Vera Alexandra Catarino – voltou a ser chumbada por BE e PSD, que insistiram em ter eleitos seus, como vogais, na equipa liderada pelo socialista José Felício.
Logo nessa segunda tentativa de instalação da Junta de Freguesia, o presidente descartou formar executivo com pessoas “em quem não tem confiança”, ou seja, um executivo de acordo com o proposto pelos restantes dois partidos, integrando, além do presidente socialista, o cabeça-de-lista do PSD, António Moutinho, e o cabeça-de-lista do BE, Eduardo Jorge.

Defendendo atualmente a mesma posição, ou seja “de indisponibilidade para atender à pretensão da oposição de os incluir na lista para o executivo”, José Felício sublinha que “quem ganha as eleições forma a equipa com quem quer trabalhar e propõe a lista na lógica de quem ganha governa”, PSD e BE optaram por apresentar renúncia de mandato, primeiro o PSD – José Felício chegou na quinta-feira à reunião já com o documento de renúncia em sua posse – e depois o BE – que apresentou a renúncia durante a reunião, falhando desta forma mais uma tentativa de instalação da Junta de Freguesia da União de Alvega e Concavada.
Com o PSD fora da equação, e apelando ao “bom senso” José Felício ainda passou a palavra ao Bloco de Esquerda para dar conta da sua posição no que toca à formação do executivo, mas Eduardo Jorge depressa esclareceu que também o BE mantinha a mesma posição.
“A nossa posição é a mesma. A partir do momento que o senhor presidente inviabilizou qualquer possibilidade de acordo quando referiu que não confiava em nós. Também não houve nenhuma tentativa de conversação […] a democracia diz que tem de haver entendimento, nunca houve institucionalmente contacto do PS, uma tentativa de algum acordo com o Bloco de Esquerda”, avançou Eduardo Jorge.
Sendo assim, “e para que não se continue a perpetuar no tempo, e desculpe o termo, brincarmos às assembleias, também vamos pedir a nossa renúncia e quem de direito tomará as decisões que entender”, afirmou o cabeça-de-lista, acrescentando que “o comunicado do BE foi claro: continuaríamos disponíveis para encontrar uma solução. Nunca essa solução foi procurada, simplesmente chegam aqui e apresentam as vossas propostas. Têm esse direito e nós também temos o direito de concordar ou não. O senhor está eleito, o PS ganhou, não ganhou com maioria e teríamos de entrar num acordo, não foi possível”.
ÁUDIO | EDUARDO JORGE, CABEÇA DE LISTA DO BE:
A verdade é que no dia 21 de outubro José Felício já havia sugerido a renuncia em bloco dos partidos da oposição ao dizer “[…] não é possível haver novas eleições, só daqui a quatro anos. Há uma forma, é apresentar demissão em bloco. Eu como partido ganhador não o vou fazer. Se os senhores entendem que há uma forma de fazer isso, as duas listas que apresentem a demissão”, sugeriu.
Agora, o presidente rejeitou as criticas do BE por posteriormente à segunda reunião ter falado em “instrumentalização” e “argumentos para pressionar os eleitos” bloquistas.
Em comunicado enviado às redações, o BE lembrou que “o cabeça de lista eleito pelo PS, partido que venceu as eleições por uma margem mínima, voltou a propor, para a composição do executivo da União de Freguesias de Alvega e Concavada os mesmos nomes que já tinham sido rejeitados no dia 16 de outubro. Como era previsível, a lista foi novamente rejeitada por BE e PSD”. E continuou: Na sua intervenção o cabeça de lista do PS “usou diversos argumentos para pressionar os eleitos na lista Bloco de Esquerda”.

Pela sua “gravidade”, o BE destacou aquilo que chama de “o infeliz uso de uma possível caducidade dos contratos de trabalhadores ao serviços da U.F. de Alvega e Concavada, numa clara tentativa de responsabilizar a oposição”, pode ainda ler-se no comunicado.
José Felício, em declarações ao mediotejo.net, e também durante a reunião, rejeita a acusação de instrumentalização, tendo afirmado que o problema da renovação dos trabalhadores “não é um argumento, é uma realidade que temos e que nos preocupa”.
No entanto, Eduardo Jorge voltou a pedir a palavra para lembrar que a decisão partia de José Felício. Recorda-se que, segundo a Lei, o presidente eleito é o único que pode apresentar propostas para os vogais e deve “apresentar tantas propostas quantas as necessárias para que se alcance um consenso com a Assembleia de Freguesia ou com o plenário de cidadãos eleitores, conforme os casos, seja apresentado novas listas ou recorrendo à eleição uninominal dos vogais”.
De acordo com Eduardo Jorge o BE entendeu ser “um tipo de chantagem porque estava nas mãos do senhor presidente criar um executivo. Apresentar, fazer uma proposta fosse de acordo com as nossas pretensões ou não e assim não haveria o problema que houve com os funcionários, porque não se entende como é que se marca para um mês depois uma assembleia quando todos queríamos rapidez em resolver o assunto”.
Em resposta José Felício explicou que independentemente da data da reunião “em relação aos contratos já não havia nada a fazer”. Ou seja, para a renovação dos mesmos, os trabalhadores teriam de receber uma carta um mês antes do terminus do contrato – dia 30 de novembro – dando conta da intenção de prolongamento do contrato de trabalho, o que teria de acontecer até 30 de outubro, tendo sido a segunda tentativa de instalação dos órgãos autárquicos a 21 de outubro.
Na origem da renúncia dos eleitos do PSD e do BE estão, então, as críticas ao PS, tendo em consideração a defesa dos interesses da união de freguesias e da população face ao impasse “criado na constituição da equipa da Junta, pois o Partido Socialista pretende governar sem ter em consideração a vontade dos eleitores que ficou bem expressa nas urnas”, argumenta o PSD e “embora a lista do BE estivesse disponível para encontrar uma solução que fosse ao encontro da vontade expressa pelos eleitores, o PS nunca se mostrou disponível para apresentar uma proposta dentro desse quadro”, justificam os bloquistas.
ÁUDIO | JOSÉ FELÍCIO (PS) LÊ O DOCUMENTO DE RENÚNCIA DO PSD
ÁUDIO | JOSÉ FELÍCIO (PS) LÊ O DOCUMENTO DE RENÚNCIA DO BE
Para o PSD, o impasse “estava a gerar uma situação de autogestão da Junta por tempo indeterminado, e não é correto que a população se mantenha nesse impasse por tempo indeterminado. Achamos por bem que a solução mais viável seria a renúncia” passando novamente a decisão à população, disse ao nosso jornal António Moutinho.
Reconhece não ser benéfico para a Junta estar em gestão corrente mas “também não é benéfico para quem está na oposição, disposto a trabalhar e a ajudar a construir, e a encontrar soluções na Freguesia e não faz sentido o presidente não ter confiança para trabalhar com ninguém da oposição. Neste caso a Junta não encontrou uma solução de acordo com os resultados eleitorais”.
Explica que o PSD aguardou “até à ultima hora” por uma eventual terceira proposta alternativa do presidente da Junta, mas “não houve nenhum contacto” tendo passado mais de um mês desde a segunda tentativa de instalação dos órgãos autárquicos.
O pedido de renúncia do mandado do PSD foi enviado na terça-feira passada por correio para o presidente da Junta de Freguesia de Alvega e Concavada que o aceitou. Nesta última sessão o PSD já não se encontrava, por isso, entre os eleitos.
ÁUDIO | ANTÓNIO MOUTINHO, CABEÇA-DE-LISTA DO PSD
Perante a atual situação, em declarações ao nosso jornal, José Felício explicou que a Junta de Freguesia “vai funcionar em gestão” corrente. Ou seja, “pagar a água, pagar a luz, pagar os funcionários e pouco mais. Não podemos tomar decisões nenhumas”, lamentou.
Questionado se o cenário de eleições intercalares é uma possibilidade, José Felício disse desconhecer e por isso irá procurar respostas “a quem de direito”, uma vez que entende “não fazer sentido governar quatro anos em gestão”.
O próximo passo a tomar passa por comunicar as renúncias à Comissão Nacional de Eleições, ao Governo e à Câmara Municipal de Abrantes.

Quanto à falta de disponibilidade para negociar, o presidente negou. Considerou, no entanto, “não fazer sentido formar um executivo de uma Junta de Freguesia com um grupo de pessoas que não são do mesmo partido. Não nos revemos na sua forma de pensar. E quando disse que não confiava nas pessoas é basicamente isto. Garantidamente se fosse o contrário essas pessoas também não o quereriam fazer. Queriam as pessoas da sua confiança”, opinou.
Além disso, mesmo formando executivo com o PSD e com o BE, calcula “que iria parar à mesma situação que vai parar agora: aquilo duraria pouco”, acrescentou.
Ao nosso jornal recordou ainda que “um dos partidos, há quatro anos, aprovou um governo de minoria do PS dizendo que quem ganha governa. Não sei o que é que mudou”, criticou, referindo-se ao PSD de António Moutinho que há quatro anos foi candidato pelo CDS/PP.
Para José Felício a melhor opção passa mesmo por eleições intercalares, isto se a Lei assim o possibilitar. Já perante a hipótese de governar em gestão durante quatro anos manifestou disponibilidade mas apenas “até que se torne insuportável”.
ÁUDIO | JOSÉ FELÍCIO, PRESIDENTE DA JUNTA DE FREGUESIA
Tratou-se da terceira reunião presidida pelo candidato que encabeçou a lista mais votada à Assembleia de Freguesia da União das Freguesias de Alvega e Concavada, para formação do executivo para os próximos quatro anos e instalação da Junta de Freguesia, após serem conhecidos os resultados eleitorais de 26 de setembro de 2021. A reunião teve lugar na quinta-feira, 25 de novembro, na Casa do Povo, em Alvega.
O partido mais votado foi o PS com 360 votos, tendo reeleito o presidente da Junta em funções. A lista do PSD encabeçada por António Moutinho conseguiu 337 votos, e a lista do Bloco de Esquerda, tendo Eduardo Jorge como cabeça-de-lista, obteve 280 votos.
Assim, após renúncia de todos os elementos do PSD e do BE o cenário de eleições intercalares pode, de facto, ser uma realidade, devido à renúncia dos 3 elementos do PSD e dos 3 elementos do BE, juntamente com os respetivos suplentes que também se afastaram. Detinham a maioria na Assembleia de Freguesia, órgão por instalar mas que fica, também desta forma, sem possibilidade de quórum.