O antigo mercado diário foi tema de discussão na última sessão de Assembleia Municipal de Abrantes. Após o presidente da Câmara, Manuel Jorge Valamatos (PS) ter anunciado em reunião de executivo o lançamento de um concurso internacional para a reconversão do edifício do antigo mercado diário em pavilhão multiusos, várias vozes defenderam na Assembleia Municipal o regresso do mercado de frescos ao antigo edifício, como o BE e o PSD. O Partido Socialista defende que o mercado de frescos deve manter-se onde está.
O tema do antigo (e atual) mercado diário começou por ser abordado pela bancada do Bloco de Esquerda, na última sessão de Assembleia Municipal, na sexta-feira, 11 de dezembro, quando o deputado Pedro Grave lançou um repto às restantes bancadas para se pronunciarem sobre o concurso agora lançado pela Câmara Municipal para reconversão do antigo mercado diário num pavilhão multiusos.
“Quem não o fizer agora ou não for claro, ficará irremediavelmente ligado à decisão tomada em reunião de Câmara pela maioria PS, com o voto favorável do vereador do PSD”, disse Pedro Grave na sua intervenção.
O eleito lembrou que a posição do Bloco de Esquerda “é sobejamente conhecida” voltando a recordar que os bloquistas defendem “criar as condições para o regresso do mercado de frescos ao antigo mercado diário, eliminar a alínea do PUA que estipula a demolição do edifício do antigo Mercado Diário”, e que “o edifício não pode ser pensado como uma “ilha”, pelo que outras funcionalidades (…) têm que ser consideradas, levando em conta as atuais e futuras necessidades, tanto na cidade como no concelho”.

Na sua intervenção, o deputado do BE relembrou também “os responsáveis da remodelação do edifício do antigo Mercado Diário, efetuada em 1948, os ilustres António Varela, arquiteto modernista, e Jorge de Sena, como engenheiro civil”, tendo defendido que “a mestria de ambos lhe deu a imagem que ainda hoje mantém e que urge preservar”.
“Para lá da memória comunitária, não podemos ignorar o valor adicionado pela ligação do edifício a estes dois vultos maiores da arquitetura, pintura, poesia e drama do séc. XX. Se valor faltasse, veja-se a forma e o interesse com que os munícipes aderiram e aderem à defesa do edifício, que se vem tornando numa causa viva e abrangente da comunidade abrantina, sendo cada vez mais evidente que a não demolição do nobre e memorável edifício, assim como o regresso do mercado de frescos, são reivindicações justas e incontornáveis”, afirmou.
Pedro Grave disse ainda que “hoje ninguém ignora que a conceção do edifício onde funciona atualmente o mercado de frescos é um falhanço monumental ao nível do conforto, da mobilidade e outras condições essenciais para o exercício de tais atividades, o que por sua vez tem tem produzido graves reflexos a nível económico e social, facilmente demonstrável pelo cada vez mais reduzido número, tanto de comerciantes como de clientes. De notar que os comerciantes demonstraram recentemente o seu desagrado pela situação, numa reportagem publicada num jornal regional”.

O BE acusa o Partido Socialista de “tenta alterar a perceção do que pretende fazer ao edifício, mas importa realçar que, a exemplo do que fez a sra. ex-presidente da Câmara, também o atual sr. presidente faltou aos compromissos assumidos perante esta Assembleia Municipal e que consistiam em trazer o futuro do antigo mercado a debate, quer em reunião de Câmara, quer em sessão de Assembleia”.
Pedro Grave acrescentaria que, “ainda que o sr. presidente alegue que trará o assunto a esta Assembleia, o facto é que, com os votos favoráveis da ‘sua equipa’, o voto a favor do vereador do PSD e voto contra do vereador do BE [em reunião de executivo], já fez lançar um concurso público internacional, com pressupostos específicos e fechados, para elaboração de projeto de reconversão do antigo mercado municipal de Abrantes em multiusos, onde não se incluiu nos pré-requisitos o regresso do mercado de frescos, inquinando qualquer hipótese de debate sério nos fóruns devidos e prometidos”.
A bancada do BE classifica como “ultraje maior” a oferta de prémios monetários “aos projetistas vencedores, que serão pagos também pelos muitos munícipes que pretendem debater e ver debatidas outras soluções”.

Por seu lado, João Salvador Fernandes, dando voz à bancada do Partido Social Democrata, lembrou que “desde que se colocou a hipótese de demolição do edifício do antigo mercado diário que o PSD de Abrantes e opôs a esse insensível e insensato objetivo”. Para os sociais democratas o edifício do antigo mercado é “um claro exemplo da alma abrantina”, afirmando o eleito que o PSD “releva a importância identitária daquele espaço que faz parte do nosso sentido coletivo enquanto comunidade”.
O deputado social democrata recordou as “várias” propostas apresentadas pelo PSD em defesa do antigo mercado diário, designadamente aquela que defendia “um processo de revisão do PUA de modo a expurgar desse documento a previsão de arrasamento do edifício”, salientando a petição pública que reuniu cerca de mil assinaturas.
João Salvador Fernandes reconheceu ainda que “esta luta foi acompanhada por outras forças políticas, não negamos o seu contributo” bem como os contributos de movimentos de cidadãos “mais ou menos organizados”. E disse que o PSD “não pode aceitar” que o PS e o presidente da Câmara sejam considerados “como os salvadores do edifício do antigo mercado. Não podemos porque é falso e não podemos porque o sr. presidente da Câmara, enquanto vereador, deu o seu voto favorável à demolição”. Ainda assim manifestou-se “agradado” pelo presidente “emendar a mão”.
Contudo, João Salvador Fernandes diz que o PSD “sempre desejou que o mercado diário voltasse para aquele edifício. Não sendo tal possível sugerimos o concurso internacional mantendo a traça inicial do edifício”, afirmou, lembrando que o vereador do PSD aprovou, em reunião de Câmara, o concurso internacional para um multiusos porque “pode e deve acolher o mercado diário e até semanal”.
O deputado manifesta-se “incerto” quanto “à pegada desta crise económica gerada pela pandemia nos pequenos produtores e nas pessoas que compram e vendem frescos. Tendendo a estes dois pressupostos confiamos no que nos foi apresentado”, disse, tendo no entanto afirmado dar preferência “a projetos que permitam, dentro do conceito de multiusos, garantir que o edifício mantém funcionalidades enquanto mercado diário e/ou semanal”.
Quanto ao edifício do novo mercado diário, João Salvador Fernandes diz não servir os interesses dos munícipes e que deve ser dada outra utilidade ao edifício.

Em defesa da posição socialista, o presidente da Junta de Freguesia de Abrantes e Alferrarede, Bruno Tomás, afirmou que o atual mercado diário “necessita é de pessoas e os vendedores de serem ajudados” com a presença de clientes. Reafirmou a ideia já transmitida pelo presidente da Câmara Municipal, Manuel Jorge Valamatos, que o PS “é pela manutenção do novo mercado diário”, e acrescentou que “o primeiro passo para colocar em prática as nossas ideias” passa por “ganhar eleições”.
Assim, a bancada do PS lança o desafio ao presidente da Câmara no sentido de trazer à Assembleia Municipal o projeto para o pavilhão multiusos, quando este existir, porque “foi esse o compromisso assumido”, reforçou Bruno Tomás.
Da sua parte, Manuel Jorge Valamatos assegurou que trará o projeto “à consideração de todos”. Insiste que o mercado diário “é uma referência para nós. Temos um mercado e está a funcionar. Precisa é de gente! Quer para vender, quer para comprar”. Até porque, fez notar, o edifício do novo mercado tem “boas acessibilidades”. Garante que quando o mercado de frescos encerrou por via da ASAE “o antigo mercado tinha tanta gente como tem agora o novo mercado”.
O presidente garantiu ainda que a traça do edifício do antigo mercado será mantida. “Vamos mexer na ficha técnica, não mexer nas fachadas mas queremos ampliar o edifício”, referiu, ao mesmo tempo que manifestou vontade de “levar o nosso concelho para a frente! Temos de ser audazes”, reforçou o autarca.
Em dezembro de 2019, a Câmara anunciava a vontade de transformar o antigo mercado diário de Abrantes num pavilhão multiúsos, moderno e funcional, mantendo o rosto e a identidade do edifício.
“Queremos um espaço capaz de acolher qualquer evento de grande dimensão, seja para concertos, conferências, e temos um exemplo bem recente que agudizou este sentido. Esta última Feira Nacional de Doçaria provou que Abrantes tem capacidade e competência para atrair muita gente. E queremos ter um multiusos que consiga acolher uma Feira Nacional de Doçaria com muita dignidade”, disse na ocasião Manuel Valamatos, quando questionado pelos jornalistas sobre se havia decisão política sobre o futuro do antigo mercado diário, depois de encerrado o capítulo negocial sobre o cineteatro São Pedro.
O executivo municipal entende que o edifício não pode voltar a ser um mercado, devendo ser adaptado para receber grandes eventos, exposições, concertos, com estacionamento e cinema comercial.

No final da sessão o presidente da Assembleia Municipal, António Gomes Mor, leu uma intervenção do munícipe José Rafael Nascimento em nome próprio e em nome do grupo informal ‘Os Amigos do Mercado de Abrantes’.
Este grupo de cidadãos apela “a todas as forças políticas abrantinas, representadas ou não nesta Assembleia Municipal, que defendam e exijam o regresso do mercado diário ao edifício histórico de onde foi indevidamente retirado e a que, por direito natural, pertence”. Apelando também “a que se recomende ao executivo municipal que o concurso público de conceção para a elaboração do projeto de reabilitação e requalificação do antigo mercado seja precedido e solidamente alicerçado num estudo de mercado e num plano de negócios que garantam a sua viabilidade e sucesso”.
José Rafael Nascimento começou por considerar que “em 29 de setembro de 2016, esta Assembleia permitiu que se cometesse o erro histórico de inscrever na Revisão do Plano de Urbanização de Abrantes (PUA) a chamada ‘operação estratégica’ de demolição e substituição do edifício-berço do mercado coberto por um edifício-miradouro sem utilização definida”.

Continua referindo que “a consciência e o sentimento dos cidadãos abrantinos, assim como o discernimento e a persistência das forças políticas contrárias à demolição do edifício histórico do mercado, opuseram-se e evitaram, pelo menos temporariamente, a concretização do grave atentado patrimonial e identitário que se anunciava”.
Contudo, declarou, “a ameaça de demolição não está definitivamente afastada, uma vez que a referida ‘orientação estratégica’ continua deliberadamente inscrita no PUA, com plena força legal, não parecendo haver vontade da maioria autárquica em anulá-la, nem em classificar este edifício modernista como património municipal, o que legitima as maiores preocupações”.
Considerando “pior” se “o concurso público internacional que o executivo camarário aprovou há duas semanas exigir apenas a preservação das duas fachadas principais do edifício, a elaboração do Projeto de ‘Reconversão do Antigo Mercado Municipal de Abrantes em Multiusos’ permitirá que tudo o resto seja demolido, ou seja, o suposto compromisso de não demolição do antigo mercado não passará de um inconcebível eufemismo”, nota José Rafael Nascimento.
Recorda que “além da preservação deste edifício, a causa dos Amigos do Mercado de Abrantes prende-se também com a revitalização do mercado diário. É por demais evidente que Abrantes não possui, há muitos anos, um Mercado Municipal atrativo e dinâmico, de que a cidade e o concelho possam verdadeiramente beneficiar e orgulhar-se”.
Acusa a autarquia de descurar “durante anos o antigo mercado” o que “embaraçosamente obrigou a ASAE a intervir” e diz que “a decisão posterior de investir mais de um milhão e meio de euros num edifício novo provou ser desastrosa. O insólito projeto revelava-se à partida inapropriado e desaconselhável para mercado diário de frescos, sendo consensual que não atrai nem satisfaz clientes e vendedores”.
Recorda igualmente que “este novo edifício foi também concebido numa lógica de ‘multiusos’, visando inclusivamente a realização de eventos. É, pois, falacioso o argumento de que Abrantes não possui um ‘multiusos’ com esta valência e de que este edifício não possui outras vocações úteis. Se as mesmas não servem as necessidades de Abrantes, esse erro deve ser reconhecido e assumido, não fazendo o mercado diário pagar por ele” leu o presidente da Assembleia Municipal.
E garante que o grupo não se deixa “impressionar por ‘bonecos’ vistosos e sedutores, bons para ganhar prémios, mas insuficientes para garantir que os edifícios não fiquem às moscas”.
Ter um novo Mercado referenciado em prémios de arquitetura não poderá se um excelente cartão de visita para a cidade de Abrantes como uma Cidade moderna, progressista e inteligente? O novo Mercado só está “às moscas” porque os hábitos de consumo mudaram, quem é que, hoje, vai diariamente às 7 ou 8 h da manhã, como antigamente, quando temos as grandes superfícies abertas de segunda a domingo até às 22h ?
Há uns anos a esta parte que, as estratégias da maioria política abrantina, seguem a linha mestra da “birra”, ou seja fazem “birra” para fazer avançar projectos que em pouco ou nada beneficiam a cidade e o concelho e “embirram” com quem tenta demonstrar que esse talvez não seja esse o melhor caminho. Para defender a tese política da “birra” que seguem, usam frequentemente a máxima “eu não lhe admito”. Em Abrantes?!?! – Tudo como dantes.