Grupo de Teatro Palha de Abrantes leva ao palco ' O aniversário', em exibição solidária com o povo ucraniano. Foto arquivo: mediotejo.net

O Grupo de Teatro Palha de Abrantes comemora o seu vigésimo aniversário no próximo mês de junho, mas a festa começou antes e está para durar. O grupo renovou a imagem gráfica, subiu ao palco com “A Partilha”, cedeu-o a um grupo convidado e organizou um workshop de teatro. Este sábado, dia 21, chegou a data de estrear a peça “O Aniversário”, que vale por dois pois junta o seu ao do casal que entra em cena, cada um no seu “lar doce lar”. Até ao fim do ano, há mais novidades.

Até chegar ao lar da Rua de São Pedro, O Grupo de Teatro Palha de Abrantes esteve no Convento de São Domingos, passou pela Santa Casa da Misericórdia, inaugurou o Cineteatro São Pedro com o espetáculo “Restos” e ocupou uma “casinha” na Rua da Sardinha. Chegaram a ensaiar na casa de Helena Bandos, fundadora do grupo em 1998 e que dedicou três décadas dos 79 anos de vida ao teatro, desde os tempos do grupo criado com alunos da Escola Dr. Solano de Abreu no ano letivo de 1988/89.

A saída de alguns locais, recorda, foi feita com prazos estabelecidos de “48 horas” e a do atual depende do início das obras do futuro Museu de Arte Contemporânea Charters de Almeida. Foi aqui, no numero 24 do antigo Edifício Carneiro, perto do Castelo de Abrantes, que conversámos com a encenadora da peça baseada no texto “A Festa” do dramaturgo italiano Spiro Scimone (em conjunto com Rita Nazaré) e Roberto Marques, um dos atores. Como cenário tivemos o criado para este sábado, que marca a primeira vez que entram em cena na sede.

Fotos: mediotejo.net e GTPA

O espetáculo está esgotado, mas não vale a pena ficar triste já que a sessão das 21h30 transformou-se em duas e às 23h00 aguarda-se nova enchente, se tiverem mais de 15 reservas. Casa cheia, aliás, cozinha cheia pois é entre o fogão antigo e a mesa com o cinzeiro que decorre a trama familiar. Três homens em palco, incluindo uma mãe de bata e barba encarada como empregada pelo homem com quem casou há 30 anos e o filho que apesar de não gostar do pai segue-o no comportamento.

Em pleno aniversário do casal, as prendas trocadas entre ela e ele, interpretados por José Luís Moreira e Vítor Mendes, são a violência das palavras que deixam nódoas negras invisíveis. Sonhos e esperanças da dona de casa perdidos entre as tarefas domésticas e a indiferença. Um quotidiano marcado por discussões frequentes quando o ressonar do marido se transforma na gota de água que faz transbordar o copo da esposa. A mesma esposa que não o deixa dormir porque deixa a luz acesa depois de ler as orações.

Aproveitamos para perguntar se a família que sobe ao palco este sábado é diferente da “família” Grupo de Teatro Palha de Abrantes. Ambas comemoram aniversários e se numa falamos de conflitos, terão sido os últimos 20 anos vividos pela segunda num “lar doce lar”? Helena refere que nunca se tem um “lar doce lar” ininterrupto. Houve “altos e baixos”, mas os altos ganharam aos “momentos de crise” e, no seu caso, a criação e permanência do grupo representa o “realizar de um sonho”.

Fotos: mediotejo.net e GTPA

Não tem sido uma luta fácil, acrescenta, pela crescente falta de interessados em integrar a equipa ou sentar-se na plateia, apesar da itinerância pelos espaços culturais das freguesias do concelho lhes continuar a assegurar aplausos numerosos. Roberto conhece-os há cerca de cinco anos, quando aceitou o convite para integrar o elenco de “Arlequim nas Ruínas de Lisboa”, depois de ter passado pelos “décors” dos “Morangos com Açúcar”.

Experiências diferentes, diz, as do teatro e da televisão, unidas pelo elemento comum de “decorar texto”, ainda que n’“O Aniversário” não tenha tido necessidade de decorar o nome da personagem pois é igual ao seu. Na sua opinião, o teatro é mais exigente por equivaler a “um direto”. Na “hora H”, não surge um “corta”, nem um “repete” e não “há espaço para erros”.

O público não irá fazer zapping caso Roberto se engane na interpretação do papel que diz espelhar uma realidade atual em que, para muitos filhos, “a mãe serve para fazer”. Em cena também terão de entrar a responsabilidade, a humildade e a persistência, as três virtudes de um ator identificadas por Helena.

Fotos: mediotejo.net e GTPA

A peça “O Aniversário” segue para Leiria no dia 28 de abril e o programa comemorativo continua com o workshop orientado pelo ator e encenador Marco Mascarenhas nos dias 12 e 13 de maio. Até ao final do ano também estão previstos o espetáculo de um grupo convidado, a festa oficial de aniversário a 23 de junho na Praça Barão da Batalha, o fórum sobre o teatro amador da região a 22 de setembro (com uma homenagem à atriz abrantina Catarina Avelar) e o lançamento de um livro sobre o grupo.

Não sabemos qual será o desejo que irão vai fazer quando trincarem as velas, mas para os próximos 20 anos falam em continuidade com as surpresas negativas e positivas que integram o quotidiano de qualquer família. A do Grupo de Teatro Palha de Abrantes vai continuar a morar na Rua de São Pedro por tempo indeterminado e, quando saírem, voltam a trabalhar para construir o “lar doce lar” que todos anseiam conscientes de que “a vida é uma luta”, como diz Helena. Dentro e fora do palco.

Nasceu em Vila Nova da Barquinha, fez os primeiros trabalhos jornalísticos antes de poder votar e nunca perdeu o gosto de escrever sobre a atualidade. Regressou ao Médio Tejo após uma década de vida em Lisboa. Gosta de ler, de conversas estimulantes (daquelas que duram noite dentro), de saborear paisagens e silêncios e do sorriso da filha quando acorda. Não gosta de palavras ocas, saltos altos e atestados de burrice.

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