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Depois de anos a trabalhar na área da restauração e hotelaria, João Moura da Silva decidiu investir no seu próprio negócio: tornou-se taxista. Um trabalho que não lhe é de todo estranho, uma vez que também a mãe o é, e desde pequeno aprendeu a importância de conduzir os outros ao destino. A conjuntura não o assustou: arregaçou as mangas, disponibilizando-se também para fazer compras e entregas ao domicílio e até aviar receitas de medicamentos. João segue, desde abril de 2020, ao volante daquela que assumiu ser a viagem da sua vida.

Fez a aquisição da praça em Abrantes, no Largo 1º de Maio, junto ao tribunal, em abril de 2020. A pandemia não o assustou, estava decidido a empenhar-se num negócio próprio. Tem carta de táxi há cerca de 8 anos. A mãe, Fátima, é também taxista, e por isso o jovem de 29 anos diz que se lembra desde bem pequeno do seu desempenho nesse ofício.

Trabalha desde os 16 anos: “Comecei por ser apanha-copos num bar aqui em Abrantes”, diz. Também frequentou a universidade, tendo a licenciatura em Serviço Social ficado praticamente concluída, faltando o estágio. Ainda assim, o sentido de auxílio e prestação de apoio à comunidade prevalece e é, também por isso, que ingressou no setor do transporte público.

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“Trabalhei nos últimos anos em hotelaria, e não me dei bem. É uma área de muita exploração por parte das chefias e decidi optar por criar o meu negócio”, revela. Foi então que, numa praça onde até aí a sua mãe, com 53 anos, era a mais nova, passou João a trabalhar para cativar os seus próprios clientes, manter os que a mãe também já servia e seguir as pisadas da progenitora, que diz ser ser um “tubarão” no setor em Abrantes.

“Todos temos os nossos clientes, não há ordem de saída na praça. E eu tento ter o meu próprio modelo de negócio, ou seja, cheguei para conseguir responder aos clientes regulares, pessoas mais idosas e que moram essencialmente nas aldeias do concelho, mas também tento alcançar outro tipo de clientes”, refere, notando o facto de, no início, até ter ponderado a criação de um Uber, situação que caiu por terra por não querer pôr de parte as pessoas mais velhas com menores capacidades em termos de acesso aos meios digitais.

João tem uma página no Facebook e um e-mail profissional, por forma a alcançar outro tipo de clientes, mais jovens ou até quem venha até Abrantes e precise de um guia para chegar a determinado ponto.

Grande parte dos seus trabalhos são de transporte para fora de Abrantes e não o contrário. “Os serviços, a grande maioria, são a partir de Abrantes para outros pontos mais distantes, e o trabalho é essencialmente no concelho”, relata.

Acontece que, além de taxista, companheiro de viagem, muitas vezes psicólogo ou terapeuta, conselheiro em horas difíceis, João acaba por ser também moço de recados e homem de confiança de muitos clientes fiéis.

Caso da cliente que lhe confia há largos meses a receita para aviar na farmácia, passando o taxista depois em sua casa a deixar os medicamentos.”Já tinha uma cliente que me pedia estes serviços, e por isso decidi disponibilizar o meu tempo também para isso. Faço compras no supermercado, levanto receitas de medicamentos, o que for necessário”, indica.

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Desde que lançou este seu serviço, já fez recados a pessoas com mais idade e outras com problemas de saúde e consideradas de risco, não sendo aconselhável saírem para determinadas atividades na rua. Aqui, João assume a responsabilidade de garantir que nada falta a estas pessoas que a pandemia deixa mais isoladas e distanciadas.

Quanto à perda de clientes que a pandemia de covid-19 provocou, diz ser mais flagrante às segundas-feiras. “Era dia de mercado e todas as pessoas vinham aviar-se para o mês… era um dia cheio, em que mal parávamos na praça. Só conseguíamos almoçar às 17h00”, conta.

Agora as coisas amainaram, mas o táxi continua a circular. Os transportes públicos, nomeadamente o autocarro, “o mais usado normalmente, diminui horários quando não há aulas e com a pandemia diminuiu ainda mais, e por isso continuamos a assegurar o transporte nesse sentido”.

Os táxis são um trabalho a tempo inteiro, mas João sempre que pode vai preenchendo o seu horário com outros afazeres. Quanto há tempo livre, colabora com a empresa Recadex e faz entregas ao domicílio em Abrantes, mas também costumava apoiar um amigo de infância, Luís, proprietário da empresa de animação Meganimação, apoiando em trabalhos diversos. “Também ele está a sofrer um bocado com isto, uma vez que a pandemia obrigou a empresa a parar e os serviços diminuíram muito”, lamenta.

E é nisto que João entende que devem as pessoas ganhar força e coragem quando se lançam num negócio próprio. “Qualquer pessoa que se lance por conta própria, num negócio novo, não pode ter medo e não pode deixar-se ir abaixo. Temos de procurar marcar pela diferença”, admite, assumindo a quota-parte de coragem necessária para embarcar neste novo desafio que agarrou com unhas e dentes.

Mesmo que a pandemia tenha vindo atrapalhar limitando também a capacidade de cada táxi, que tendo 4 lugares só pode transportar duas pessoas. Tal revela-se um constrangimento porque “nem todas as pessoas têm disponibilidade financeira para alugar dois táxis, e já tem acontecido virem três pessoas… Aqui têm de sair dois carros para o transporte. E as pessoas aí já não querem o serviço”, explica.

De qualquer modo, tem dois carros preparados, os dois de 4 lugares, que agora só podem levar duas pessoas de cada vez, e um deles até está de reserva para quem traga muita bagagem.

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O conforto e segurança dos clientes é palavra de ordem, para que a viagem em tempos de pandemia seja o mais segura e cómoda possível. “O uso de máscara é obrigatório, e nós temos máscaras no táxi no caso de algum cliente ter algum problema, nem que seja o elástico da que traz se partir. Damos outra”, começa.

Também o cuidado entre serviços acontece minucioso, pois “o carro é arejado entre cada serviço, com portas e janelas abertas, e mesmo entre serviços relativamente próximos conseguimos que isso aconteça”.

“Temos desinfetantes para os táxis e os interiores, álcool gel para nós e para os clientes, e um desinfetante para a bolsa do dinheiro… e o dinheiro é o que temos de mais sujo no táxi”, assevera João.

Faça chuva, faça sol, o jovem taxista está ao dispor da comunidade à distância de um telefonema, porque, por estes dias, não é na praça que aparecem clientes. À espera de dias melhores, o Táxi João Moura continuará a percorrer o concelho de uma ponta à outra, seja para levar ou deixar clientes, seja para deixar à porta, em segurança, as compras e os medicamentos que lhe pediram para aviar. Permitindo a todos aqueles que devem, e podem, permanecer resguardados e em segurança, fiquem (mesmo) em casa.

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Formada em Jornalismo, faz da vida uma compilação de pequenos prazeres, onde não falta a escrita, a leitura, a fotografia, a música. Viciada no verbo Ir, nada supera o gozo de partir à descoberta das terras, das gentes, dos trilhos e da natureza... também por isto continua a crer no jornalismo de proximidade. Já esteve mais longe de forrar as paredes de casa com estantes de livros. Não troca a paz da consciência tranquila e a gargalhada dos seus por nada deste mundo.

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