No número 39 da Rua Direita de Rio de Moinhos, o povo aguardou por Cristina Pires-Cox que cumpriu este sábado, 21 de agosto, uma caminhada de 2.103 km e que durou cerca de 9 meses – de Inglaterra a Portugal – para angariar fundos destinados à criação de um equipamento social para idosos nesta freguesia do concelho de Abrantes.
Cristina não chegou sozinha, alguns amigos, incluindo o presidente da Junta de Freguesia, Rui André, caminharam a seu lado. A última etapa fez-se desde Castelo do Bode, passando por Martinchel, pelo cruzamento de Aldeia do Mato, depois Pucariça até chegar a Rio de Moinhos. Uma causa solidária que abraçou em memória de seu pai e em nome de sua mãe.

“O primeiro passo” de um objetivo por concretizar; a criação de um equipamento social para idosos no referido número 39 da Rua Direita. Trata-se de uma Quinta doada à Junta de Freguesia pela benemérita Rosa Vieira da Cruz e que serviu, no passado, de residência ao ilustre médico Manuel Pádua Ramos, dos anos 40 aos anos 70 do século passado.
A construção de um equipamento social para idosos “era voltar a valorizar esta Quinta. Deixa de ser uma casa privada para ser uma casa coletiva, uma casa da comunidade”, referiu Rui André, dando conta que a Junta de Freguesia tenta também sensibilizar a proprietária da casa ao lado, que no passado foi um posto de correios, no sentido do edifício crescer e poder “duplicar eventualmente o número de utentes”.
O presidente da Junta notou que a construção “não é para se concretizar em dois ou três anos, demora mais um tempo” mas “é um gesto para concretizar, aquilo que pensamos. Um projeto de todos”.

Cristina Pires-Cox, que vive em Inglaterra há 30 anos, filha dos riomoinhenses Adolfo Pires e Alda Pires, não nega as suas raízes e o carinho que nutre pela freguesia, tendo “muitas memórias de infância e juventude” e recorda “as muitas histórias e narrativas contadas pelo meu pai acerca das gentes e da terra de Rio de Moinhos. O meu pai não queria que o passado se perdesse no tempo e que as gerações mais novas deixassem de dar valor às sua raízes”, disse.
Num passado recente, a saúde dos pais de Cristina deteriorou-se e esta deixou a família em Inglaterra para estar 6 meses em Rio de Moinhos a cuidar deles. Nesses meses avaliou as suas necessidades para determinar o melhor cuidado para lhes dar e afirma ter aprendido muito nas conversas com o seu pai, que acabou por falecer.

Com a chegada de pandemia e o confinamento durante meses seguidos “as fragilidades e necessidades dos idosos tornaram-se ainda mais evidentes e todas as conversas que tive com o meu pai começaram a fazer ainda mais sentido. Rio de Moinhos necessita sem dúvida de uma residência para os seus idosos, um lar para os acolher de maneira a que possam viver o resto dos seus anos com todo o apoio necessário, para terem uma velhice digna e feliz”, disse Cristina.
Assim nasceu a iniciativa “Caminhada solidária de Inglaterra para Portugal” em novembro de 2020.
Desta vez, chegou a Portugal no dia 5 de julho tendo caminhado os últimos quilómetros no sentido de cumprir os 2.103 – de Londres a Rio de Moinhos. A tarefa “correu bem” apesar das dificuldades que enfrentou com a pandemia e de não ter conseguido angariar o dinheiro que esperava, referiu Cristina ao mediotejo.net.

A solidariedade juntou, até ao momento, três mil euros, cheque que entregou este sábado à Junta de Freguesia de Rio de Moinhos, mas a angariação de fundos continua por mais um ano em www.justgiving.com/crowdfunding/cristina-pirescox.
“Pensava conseguir mais”, confessa, afirmando perceber que “em período de pandemia são muitas carências e há muita gente a fazer pedidos”.

Por outro lado, defende mais iniciativas de cidadania, nomeadamente de cariz social. “As pessoas devem iniciar mais projetos que envolvam a comunidade” de forma a criar um sentimento de pertença, defende Cristina.
“Vamos ser inspiração uns para os outros, vamos mostrar que uma pequena aldeia como Rio de Moinhos, e o seu povo maravilhoso, pode alcançar quando se está unido e determinado. Vamos ser um exemplo para outros seguirem”, acrescentou.

Contudo, descreve a ação como “difícil! Nem sempre foi fácil encaixar a caminhada com as responsabilidades da família e as responsabilidades pessoais, confinamentos e isolamentos mas conseguiu-se e agora sabe bem chegar à meta com o coração cheio”, afirmou.
Estava previsto o percurso ser realizado “em 8 meses e meio, acabou por ser 9 meses porque tivemos restrições, confinamentos e não dava para caminhar muitos quilómetros”, explicou.
Ainda assim, em caminhadas por Inglaterra, acumulando quilómetros, Cristina tentava aproximar-se ao máximo do local que deveria estar a caminhar naquele dia, à chuva, com neve, ao frio, com vento. Calor só encontrou em Portugal, sendo que da primeira vez que veio, já no cumprimento desta ação solidária, ao regressar a Inglaterra foi obrigada a ficar em quarentena.
Esta iniciativa é então “o primeiro passo” de um sonho que pode vir a ter forma de projeto nomeadamente com recurso ao Plano de Recuperação e Resiliência no qual está previsto financiamento para projetos inovadores no âmbito da Ação Social, explicou por seu vez a vereadora da Câmara de Abrantes, Celeste Simão, presente no evento.

Celeste Simão deu ênfase aquilo que defende ser a resposta social no futuro no que ao cuidado de idosos diz respeito. “Conseguirmos ter uma resposta social intermédia […] está na altura de sairmos fora da caixa e pensar em situações intermédias que possam ser financiadas, de maneira a sossegar os filhos mas também dar aos pais aquilo que eles merecem”.
Para a vereadora não passa for “fechar” os idosos “em quatro paredes porque todos sabemos o que passámos nesta situação de pandemia, com os idosos confinados, a verem só quatro paredes e as pessoas que tratavam deles. Estamos a tempo de começar a preparar este tipo de coisas, não é para amanhã, tudo isto leva o seu tempo, mas se todos colaborarmos tanto melhor será”, apelou, falando num “trabalho de articulação” em nome de “um projeto comum”.

Por seu lado, João Paulo Rosado, presidente do Centro de Apoio a Idosos da Freguesia de Rio de Moinhos, a única IPSS da freguesia, também vê a iniciativa como “o começo” para colmatar “uma lacuna que temos na freguesia […] o Centro está a estudar” o projeto com a Junta, explicou, sublinhando ao nosso jornal “a necessidade de um estudo de viabilidade” no sentido de perceber as necessidades de Rio de Moinhos.
Depois de cortada a fita, simbolizando a chegada ao destino, da entrega do cheque com o donativo e dos respetivos agradecimentos, Rui André entregou uma lembrança a Cristina Pires-Cox, em nome da comunidade riomoinhense agradecendo “o altruísmo e dedicação a uma causa tão nobre”.
