O diretor do Agrupamento de Escolas nº1 de Abrantes, Jorge Costa. Foto: David Belém Pereira

O Ministério de Educação aprovou o Plano de Inovação apresentado pelo Agrupamento de Escolas nº1 de Abrantes. O Plano, a ser implementado em setembro, permite que o Agrupamento organize o próximo ano letivo com mais autonomia, segundo regras próprias, e com dois semestres, respeitando o calendário escolar nacional. Mais entreajuda entre os alunos, com programas de mentoria, e promoção da educação da cidadania, valorizando o sentido crítico dos alunos e a sua participação na vida diária da escola são outros dos objetivos do Agrupamento. O mediotejo.net foi falar com o diretor Jorge Costa que explicou as diferenças e as mais valias do Plano pedagógico.

Regras próprias, avaliação semestral e flexibilidade curricular superior a 25%; ou seja, aumento de autonomia. Após ser publicada a portaria 181/2019 que define os termos e as condições em que as escolas, no âmbito da autonomia e flexibilidade curricular, podem implementar essa gestão, o Agrupamento de Escolas nº1 de Abrantes decidiu avançar com essa possibilidade, vendo agora o seu Plano de Inovação pedagógico aprovado que irá colocar em prática no ano letivo de 2020/21.

O Plano de Inovação traz de novo “a possibilidade de haver uma interação maior entre as turmas e entre alunos. E de conseguirmos atender mais facilmente aos problemas de cada um evitando que ensinemos para um aluno médio que não existe dentro da sala. Normalmente os professores ensinam de forma igual para todos, mas todos aprendem de forma diferente”, afirma ao mediotejo.net o diretor daquele Agrupamento, Jorge Costa.

A ideia passa por ir “mais além” do que atualmente “é feito com a diferenciação pedagógica. Os professores já têm esse esforço, mas é ir um bocadinho mais longe, para podermos diferenciar mais, especificamente para cada aluno”, explica.

Escola Dr. Solano de Abreu, Abrantes. Créditos. mediotejo.net

Em contexto de pandemia de covid-19 “os normativos que vamos ter de seguir, contrariam um pouco o espírito” do Plano de Inovação do Agrupamento de Escolas nº 1 de Abrantes, admite Jorge Costa, acrescentando que “este primeiro ano é mais difícil de implementar”.

O Plano de Inovação curricular mereceu uma aprovação por quatro anos e visa consolidar a nova abordagem relativa à avaliação ao serviço das aprendizagens, em todas as escolas do Agrupamento, promovendo aprendizagens indutoras do desenvolvimento de competências de nível mais elevado, permitindo a gestão de currículo de forma flexível e contextualizada.

A principal diferença prende-se com “uma maior interação, entre turmas e entre anos” na Escola Básica de Rossio ao Sul do Tejo e na Escola Básica e Secundária D. Miguel de Almeida, as duas escolas com plano de trabalho diferente dentro do Plano de Inovação do Agrupamento. Ou seja, que estas duas escolas promovam uma autonomia responsável e solidária onde todos possam aprender uns com os outros, e onde se desenvolvam e consolidem os valores que constam do perfil do aluno, funcionando em regime de ciclo.

Permite-se “a possibilidade dos alunos a qualquer momento saírem da sua aula e irem para outra, esta dinâmica é nova. Tentar que haja uma maior flexibilidade na gestão curricular dos alunos”. Além disso, “os alunos aprenderem uns com os outros. Haver uma espécie de programa de mentorias em que os alunos que são melhores em determinadas disciplinas ajudam outros que têm mais dificuldades”, refere. Nas restantes escolas do Agrupamento a forma de interação “é sempre horizontal”, ou seja, dentro do mesmo ano.

Ou seja, “há diferenças nas equipas educativas. Em algumas escolas do Agrupamento vão funcionar por ano, naquelas duas vão funcionar por ciclo, um trabalho que os professores vão gerir semanalmente. As equipas funcionam com o conjunto dos professores das turmas. Sabendo qual o perfil e os problemas que têm cada um dos alunos é mais fácil ajustarem o que é necessário para cada um. Num modelo tradicional, sem Plano, as horas são as atribuídas a cada uma das disciplinas, neste caso vão sendo diferentes ao longo do ano”, explica.

Esta exceção aplicada às duas escolas (escola do Rossio e D. Miguel de Almeida) está relacionada com “a realidade da escola e do contexto socioeconómico das famílias. Foi muito pensado tendo em conta realidades diferentes no próprio Agrupamento. Temos um contexto de pessoas com dificuldades económicas, problemas sociais, e ainda mais profundo nestas duas escolas. A tentativa é de dar àqueles alunos outras possibilidades. Se for igual aos demais será mais difícil fazerem melhor. Acreditamos que esta diferença ajuda substancialmente em termos de aprendizagem os alunos mais desfavorecidos” afirma o diretor.

O diretor do Agrupamento de Escolas nº1 de Abrantes, Jorge Costa. Créditos: David Belém Pereira

Duas escolas onde os alunos revelam notas com valores mais baixos nos exames. Mas Jorge Costas desvaloriza os rankings porque “não espelham a realidade” e alerta que “importa verificar o infoescolas, onde se verifica a tendência que cada uma das escolas tem, porque compara os alunos dentro do mesmo contexto” contrariamente aos rankings dos exames.

“Não posso comparar uma escola de alunos com um perfil social elevado com uma escola de alunos que não têm esse perfil e não posso dizer que aquela escola é melhor do que a outra. O que importa é a mais valia daquilo que fazemos” defende.

Para poder usufruir deste aumento de autonomia o Agrupamento de Escolas nº 1 de Abrantes levou alguns meses a elaborar no Plano de Inovação pedagógica, aprovado pelo conselho pedagógico no final de fevereiro de 2020. Quando a portaria foi publicada “a Escola pensou logo que fazia sentido avançarmos, portanto o trabalho foi feito durante esses meses até final de fevereiro. Depois houve ajustes e melhorias” nota.

O Plano de Inovação em contexto de pandemia

Antes da pandemia o Plano de Inovação estava a ser executado no Agrupamento nº1 e tinha sido aprovado pelo conselho pedagógico portanto estava previsto que alunos tivessem uma prática de entreajuda dentro da escola em contexto de trabalho de aula.

A pandemia poderá obrigar a uma execução dos programas à distância mas segundo Jorge Costa será viável desde que os alunos “sejam acompanhados pelos professores de modo a que se concretize. Tem de haver da parte dos professores e dos conselhos de turma um grande trabalho no sentido de monitorizar essas mentorias para ver se estão a ser seguidas e a ter efeito”.

O diretor fala também em “grandes diferenças na própria organização e gestão”, designadamente junto dos alunos da D. Miguel de Almeida “para que sintam que a escola também é deles. Dar-lhe algum sentido de pertença para melhorarem a relação com a escola”. O responsável apontou ainda diferenças “na recolha da opinião dos pais” sobre o Plano e sobre a sua execução.

Escola Dr. Solano de Abreu, Abrantes. Créditos. mediotejo.net

Os tradicionais três períodos dão lugar a dois semestres. Jorge Costa explica que para as escolas do Agrupamento a avaliação semestral “tem vantagens” deixando de ser por períodos letivos. Recorde-se que o Agrupamento nº1 de Abrantes iniciou no ano letivo que agora terminou um novo modelo de avaliação, avaliando de forma contínua as competências dos alunos, não dando notas nos testes mas através de descritores.

Para além disso, “o tempo, como é maior em cada um dos semestres, não existe o efeito que acontece com os períodos, mais no ensino básico. Normalmente, no fim do segundo período, ou por excesso de confiança ou por desmotivação os alunos desleixam-se. Sendo por semestres está aberto até ao final a possibilidade de ter sucesso. No nosso modelo, este conceito de semestre ajuda, uma vez que o aluno vai tendo sempre a possibilidade de ir melhorando”.

Escola com dois semestres, pausas letivas e férias diferentes

Sendo certo que o Agrupamento não tem a liberdade de mexer no calendário escolar – e o próximo ano letivo arranca de 14 a 17 de setembro até 30 de junho de 2021 – isto é, o ano começa e acaba no mesmo dia para todas as escolas, mas as pausas letivas não são exatamente as mesmas.

No caso do Agrupamento nº1 de Abrantes o primeiro semestre inicia a 14 de setembro e termina a 8 de fevereiro de 2021, com o segundo semestre a arrancar no dia 15 de fevereiro até 30 de junho no próximo ano. Havendo várias interrupções das atividades educativas e letivas que não coincidem com as férias dos alunos com regime de três períodos letivos.

“O número de dias de aulas é o mesmo. Mas no caso da Páscoa não coincide exatamente com o calendário agora aprovado e no caso do Natal temos menos férias que o calendário escolar. Depois é compensado porque fazemos uma interrupção a meio para fazer uma avaliação no período e há uma interrupção no final de janeiro para fazer a avaliação do primeiro semestre”, explica Jorge Costa.

A legislação que estabelece os Planos de Inovação, que entrou em vigor a 1 de setembro de 2019, obriga a um aumento de autonomia. “A gestão flexível do currículo tem de ser mais de 25%. Até 25% é o que está nas escolas sem Plano”.

Novo modelo de avaliação para manter

Quanto ao novo modelo de avaliação implementado no ano letivo que terminou “está a ser aprofundado agora” diz acrescentando que o Plano contempla esse aprofundamento do trabalho feito.

O diretor do Agrupamento de Escolas nº1 de Abrantes, Jorge Costa. Créditos: David Belém Pereira

Em jeito de balanço, Jorge Costa considera que “o modelo de avaliação funcionou” embora com ”algumas falhas”. A Escola focou-se “demasiado nos conhecimentos e nos conteúdos e faltava encontrar um caminho para avaliarmos as competências. Faltava o perfil do aluno à saída da escolaridade obrigatória”.

A portaria estabelece que os Planos de Inovação tenham em conta o Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória, o cumprimento das Aprendizagens Essenciais e os demais documentos curriculares.

Por isso, em relação à avaliação o Agrupamento introduziu um novo elemento de avaliação, “um domínio que é transversal a todas as disciplinas relacionado com a aquisição de competências”.

Por outro lado, “os grupos disciplinares detetaram alguns aspetos de descritores que tinham feito para as disciplinas e agora vão corrigi-los. Sem termos posto a mão na massa não conseguiríamos perceber o que era bom e mau. Estamos a tentar melhorar mas pensamos que é um caminho importante na forma de avaliar e ajuda muito também na aprendizagem”. Portanto, o modelo de avaliação “é para manter”.

Assim, os alunos terão notas no final do primeiro e do segundo semestre com uma “avaliação qualitativa a meio” explica Jorge Costa.

Cidadania, princípios éticos e valores humanistas

Entre os objetivos destaca-se a promoção da educação da cidadania, valorizando o sentido crítico dos alunos e a sua participação na vida diária da escola. Jorge Costa considera “muito importante” ir além do fazer. “O que importa mais é os alunos aprenderam a ser. É a diferença entre fazer humano e ser humano. A Escola tem de dar ao aluno também esta dimensão para que se tornem pessoas melhores, tudo o resto vem a seguir”.

O Ministério da Educação definiu vários temas de trabalho obrigatórios para os vários anos onde encontramos Direitos Humanos, Igualdade de Género, Desenvolvimento Sustentável Educação Ambiental Participação Democrática ou Sexualidade.

Jorge Costa explica que “os temas foram escolhidos em função da importância, das idades e também em função daquilo que aparece nos programas lecionados de algumas disciplinas”.

No Agrupamento de Escolas nº1 acreditasse que “não é possível resolver problemas novos que a sociedade e a educação hoje enfrentam, com soluções velhas. As novas soluções pensadas, estruturadas num quadro de reflexão constante, são o caminho que o Agrupamento pretende percorrer para desenvolver nos seus alunos a capacidade de compreender as razões por detrás das coisas, ler sonhar, falar e encontrar soluções por si próprio e, ao mesmo tempo, passar-lhes princípios éticos e valores humanistas que lhes permitam ser homens e mulheres livres”.

Escola Dr. Solano de Abreu, Abrantes. Créditos. mediotejo.net

Escola à distância prejudica alunos mais desfavorecidos

Quanto à forma como decorreu o terceiro período com aulas à distância, com os alunos em confinamento, Jorge Costa transmite a ideia que “o ensino à distância prejudica os alunos mais desfavorecidos, mesmo com todo o esforço feito, nomeadamente do Município em facultar equipamentos”, designadamente computadores e internet.

Para Jorge Costa “a diferença não é ter acesso à internet, nem ter um tablet ou um computador. Alguns alunos mesmo com os equipamentos estão atrás de outros pelo contexto familiar que têm e isso agrava-se no ensino à distância”.

Diz que o acompanhamento em casa é fundamental para o progresso das aprendizagens no aluno. “Se a criança tiver alguém em casa que a motiva e de algum modo vai monitorizando o trabalho, com o ensino à distância mantém alguma regularidade e consegue ter uma aprendizagem significativa. Os alunos mais desfavorecidos ficam ainda mais para trás. Não conseguimos chegar a todos os alunos. Não foi bom, mas foi o possível” no contexto de pandemia.

Atualmente os professores trabalham num plano de organização para o próximo ano letivo segundo algumas orientações da Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares e respeitando o Plano de Inovação.

“Contempla três modelos: presencial, misto e o não presencial. Se tudo correr bem vamos iniciar o ano com o modelo presencial para todos os alunos. À medida que o ano vai correndo se houver necessidade em alguma turma, em alguma escola ou em todo o Agrupamento pode-se passar para regime misto ou não presencial. Os horários vão ser feitos já a contemplar estas três formas para facilmente sairmos de uma e entrarmos noutra” assegura o diretor.

Além do Agrupamento de Escolas nº1 de Abrantes, segundo o Centro de Formação de Escolas A23, têm Planos de Inovação aprovados também as escolas de Alcanena e Vila Nova da Barquinha, e ainda o Agrupamento de Escolas de Sardoal. Aguardam aprovação para 2020/2021 o Agrupamento de Escolas Artur Gonçalves e o Agrupamento de Escolas Gil Paes, ambos em Torres Novas.

Paula Mourato

A sua formação é jurídica mas, por sorte, o jornalismo caiu-lhe no colo há mais de 20 anos e nunca mais o largou. É normal ser do contra, talvez também por isso tenha um caminho feito ao contrário: iniciação no nacional, quem sabe terminar no regional. Começou na rádio TSF, depois passou para o Diário de Notícias, uma década mais tarde apostou na economia de Macau como ponte de Portugal para a China. Após uma vida inteira na capital, regressou em 2015 a Abrantes. Gosta de viver no campo, quer para a filha a qualidade de vida da ruralidade e se for possível dedicar-se a contar histórias.

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