A Igreja Matriz do Sardoal é um elemento muito relevante no contexto cultural, urbano e social e humano da Vila do Sardoal. Classificada como Imóvel de Interesse Público (edifício e recheio artístico) pelo Decreto n.º 251/70, DG, I Série, n.º 129, de 3-06-1970, esta Igreja, também conhecida por Igreja de São Tiago e São Mateus (por ser dedicada a São Tiago e São Mateus) é um magnífico exemplar de Arquitetura Religiosa.

Foi fundada no fim do século XIV, mas foi objeto de intervenções nos séculos seguintes, sendo que o templo atual reflete essas sucessivas intervenções. Este aspeto conferir-lhe-á uma das suas características de maior destaque, a profusão de estilos e a paralela, ou consequente, riqueza artística.

De indiscutível valor arquitetónico e artístico, atestado pela sua classificação como Imóvel de Interesse Público, este templo destaca-se no contexto da malha urbana da vila. Pela sua localização, implementação topográfica e, pela sua imponência arquitetónica, pode ser considerada um elemento determinante na imagem urbana, mas também na organização atual e histórica da malha urbana do Sardoal. A História da Vila do Sardoal não pode ser “contada” sem se “contar” a História da Igreja Matriz do Sardoal.

Não há dados concretos, documentos ou outros, que nos possam dar a certeza, com rigor, quanto à origem da Paróquia de S. Tiago e S. Mateus de Sardoal e determinar a data da fundação da Igreja Matriz.

Segundo Manuel Luís Gonçalves, nas suas pesquisas, já existia em 1393 uma carta de D. João I, de 23 de Outubro desse ano, guardada no Arquivo Municipal de Sardoal, em que se determinava que os moradores do Sardoal não fossem constrangidos a assistir à festividade do Corpo de Deus, em Abrantes, visto que a solenizavam com pompa na sua Igreja do Sardoal.

Por essa altura, o orago da Paróquia era apenas S. Mateus e a primitiva Matriz, situava-se em frente à atual Igreja da Misericórdia, de que em meados do século XVIII ainda existiam vestígios.

A Paróquia de S. Tiago e S. Mateus apenas foi criada no reinado de D. Afonso V. Este Rei assume o governo em 1446, reinando até 1481.

SRD2No exterior, o seu portal de arco quebrado possui nos capitéis dos seus colunelos, duas figuras régias, visto que as mesmas se encontram coroadas e, teoricamente, há quem afirme tratar-se do Rei D. Dinis e sua esposa, a Rainha Santa Isabel, na verdade, esta foi a soberana a dar a primeira Carta de Privilégio ao Sardoal, em 1313.

Tem ainda uma rosácea ao estilo flamejante, em pedra calcária, de um excelente recorte técnico, como se de uma filigrana se tratasse.

SRD3No interior, percorre-se, através da sua arte, o imaginário do Gótico até ao Séc. XX. Esta igreja, de três naves e transepto de cruz latina tem a particularidade de possuir dois tipos de retábulos, no mesmo conjunto. Em pedra, ao estilo da Renascença, em transição para o Maneirismo e em talha, indo desde o Barroco ao Neoclássico.

As paredes dos templos precisam de elementos de comunicação, uma cenografia auxiliar dirigida aos fiéis numa ação solitária ou comunitária. O retábulo é um mural de arquitetura com recetáculos para a Eucaristia, as relíquias e as imagens, uma arquitetura dentro da arquitetura que a completa, reforça ou modifica, inclusive a transforma.

O retábulo tem maior destaque na capela-mor, onde faz sobressair as capelas laterais que se dispunham em retábulos para irmandades, particulares ou devoções populares.

A igreja Matriz é constituída por quatro capelas, sendo uma delas a capela-mor e por oito retábulos em talha dourada, dos quais se destaca o retábulo.

SRD5É característica deste retábulo um vocabulário decorativo onde predominam conchas, volutas entrelaçadas, parras de uva, folhas de acanto, flores de Liz, colunas pseudo-salomónicas, Putis e anjos músicos. Figuram ainda um badalquino, sanefas, fragmentos de arcos e outros motivos arquitetónicos. No interior da igreja a talha dourada é uma das manifestações artísticas mais relevantes, conferindo imponência aos retábulos, surgindo frequentemente associada ao azulejo, à pintura e à escultura, impondo uma nova dimensão ao espaço. A amplitude atingida por esta conjugação de expressões resulta muitas vezes, em estruturas de grande complexidade, tanto iconográfica como artística, cujo brilho dourado lhe dá especial relevância.

A nível azulejar temos dois magníficos conjuntos azulejares que retratam duas passagens da vida de São Tiago, Surge-nos aqui o nome de Gabriel del Barco, nascido em Siguenza em 1649, cuja derradeira obra foi o revestimento da capela-mor desta igreja. Segundo José Meco, Gabriel del Barco terá interrompido os trabalhos do Sardoal por razões desconhecidas, segundo o autor por ter regressado a Espanha ou por ter falecido. Tendo então os mesmos sido completados por Manuel dos Santos, seu discípulo. O mesmo afirma ainda que os painéis são reveladores do estilo do mesmo.

SRD7Outra investigadora, Maria do Rosário Salema de Carvalho, afirma que os painéis são mesmo de Manuel dos Santos.

Ornamentando o primitivo retábulo da Igreja Matriz, datadas do início do século XVI, estavam sete pinturas a óleo sobre madeira de carvalho, que representam o busto de Cristo, S. Pedro, S. Paulo, a Virgem da Anunciação, o Arcanjo S. Gabriel, S. João Baptista e S. Mateus; Designadas como Tábuas do Mestre do Sardoal foram pintadas por Vicente Gil e Manuel Vicente, que deixaram no Sardoal uma das mais importantes heranças culturais e artísticas do concelho.

Este retábulo é de características narrativas, o que é comum nesta época, onde a maioria da população era analfabeta e toda a arte religiosa tinha funções didáticas e catequéticas, não sendo aqui exceção.

Esta importante obra, parte integrante do retábulo-mor primitivo, que segundo Francisco Valente, teria sido executado pelo mestre Olivier de Gand, infelizmente não chegou até aos nossos dias. Faria parte do mesmo também um conjunto escultórico flamengo que se encontra atualmente no arco cruzeiro e uma escultura de menores dimensões, representativa do doador, atualmente num nicho, do lado da epístola. Esta imponente obra terá sido encomenda de D. Francisco de Almeida, na intenção e de D. Jorge de Almeida, Bispo de Coimbra, homem de grande cultura, mecenas das Artes e protetor dos artistas.

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A Igreja Matriz de Sardoal é o fator aglutinante da vivência cultural e religiosa da vila, a sua imponência é reveladora da importância desta localidade no contexto regional.

O percurso eclético desta igreja permite-nos viajar no tempo e compreender a importância da preservação da memória coletiva desta população, para perpetuar o passado e melhor compreender o presente.

Texto de: Maria Rocha e João Soares

Fotografias de: Paulo Sousa

A experiência de trabalho nas rádios locais despertaram-no para a importância do exercício de um jornalismo de proximidade, qual espírito irrequieto que se apazigua ao dar voz às histórias das gentes, a dar conta dos seus receios e derrotas, mas também das suas alegrias e vitórias. A vida tem outro sentido a ver e a perguntar, a querer saber, ouvir e informar, levando o microfone até ao último habitante da aldeia que resiste.

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