Foto: mediotejo.net

O querido mês de agosto chegou ao fim, e com ele se findam as férias, os mergulhos e grande parte dos bailaricos. Mas na região do Médio Tejo há muito mais para descobrir. Pólos de convívio, de tradição e cultura não faltam por estas bandas. Exemplo disso são as muitas feiras e mercados tradicionais que perduram ao longo de décadas e que, ainda hoje, atraem dezenas, e até mesmo centenas!, de visitantes. Em Mouriscas, todos os domingos de manhã são dias de mercado semanal. As ruas enchem-se de carros, gente, bancas e barracas. É adepto deste tipo de comércio? Ou prefere outras superfícies comerciais? O mediotejo.net foi enfeirar, como se diz por aí, e tentar saber o que traz tanta gente ao mercado de Mouriscas!

A manhã começa bem cedo, e seguindo a Estrada Nacional 358, bem como a Estrada Nacional 3, facilmente se encontra uma das pontas do mercado. A rua que passa junto à Escola Básica de 1º ciclo é cortada, e aí já se encontram vendedores de produtos hortícolas, com verduras, legumes e tubérculos prontos a comer e ainda com plantas para cultivar na horta, separadas em cuvetes.

“Quanto leva pela batata doce?”. “Estou a levar 5 euros o quilo, minha senhora”, responde João Reis, vendedor de produtos hortícolas que costuma vir com frequência a Mouriscas, pelo menos domingo sim, domingo não.

Ao lado tem como vizinhança a dona Maria dos Anjos, que vende pintos, galinhas poedeiras, patos, galarós de pescoço-pelado, e outras aves de capoeira. Ao contrário de João Reis, que costuma dar outras voltas ao domingo, por outros mercados da região, Maria dos Anjos é presença assídua neste mercado. Em conversa com o mediotejo.net, a vendedora confidenciou que “há muita gente que vem de propósito aos domingos aqui comprar. Já sabem onde nos encontrar, porque mais ou menos, ficamos sempre no mesmo local de um domingo para outro. Mas há quem nos procure, já são clientes fiéis”, disse.

Mais à frente, no largo, já começa outra variedade de produtos. Aqui as montras são abertas, livres de prateleiras. Os modelos esvoaçam por cima das cabeças de quem por ali arregala os olhos às camisolas, túnicas, tops e casacos de última moda. “Ó freguesa, tenho ali peças de ganga bonita! Assentam que nem uma luva!”, apregoa uma das vendedoras. Ali ao lado, a fazer valer a lei da concorrência, há quem grite “5 euros! Juventude! Tudo a 5 euros. Bom e barato!”.

Os pregões ajudam os visitantes do mercado a circular, e funcionam como orientadores geográficos, sabendo assim onde se dirigir conforme o produto publicitado em voz alta.

Outras montras se avizinham, com caixas e caixas de sapatos, sandálias, chinelos, e já se vêem por ali uns quantos pares de botas e botins a anunciar a meia-estação. Experimenta-se mesmo ali, sem grandes cerimónias. Põe-se um cartão por baixo dos pés, e calça-se. Fica bem? Então leva-se na caixa ou num saco de plástico preto.

Foto: mediotejo.net
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Entretanto espreita-se a barraca dos tecidos e atoalhados, panos e toalhas de cozinha. Senhoras, já com certa idade, escolhem os panos em conformidade com as linhas para fazerem os seus bordados. Ainda há quem faça enxoval para as netas e filhas. O caso de São, que costuma vir todos os domingos espreitar as novidades, “comprar umas coisinhas” e depois seguir para a missa, ali ao lado, na Igreja de Mouriscas.

Eis que encontramos a dona Armandina, que vem do concelho vizinho, de Mação, para comprar algumas coisas para a sua mãe. “Umas combinações e roupa interior e coisas de uso diário”, o que traz no saco e faz questão de nos mostrar. Não vem todos os domingos mas faz questão de vir quando precisa comprar alguma coisa e sabe que ali vai encontrar.

Ali ao fundo, depois de passar no largo onde há de tudo um pouco – desde fruta, legumes, enchidos, queijos, bolos e pão caseiro – há quem tenha ali garrafas de sumo, garrafões de água e outros bens alimentares. No lado de lá da igreja, na rua perpendicular à Junta de Freguesia, já cheira bem, isto por volta das 11h30 – 12h00. Cheira ao típico frango assado, que há quem aproveite a vinda ao mercado para levar para o almoço, ou até quem venha buscar de propósito “para desenrascar”.

Cruzamo-nos então com Maria Isilda Branco. Natural de Mouriscas, costuma passar pelo mercado todos os domingos, quando pode, e vem aviar-se com pouca coisa. Neste dia traz uns saquinhos de fruta da época, acabados de comprar numa das bancas. Confessa que “hoje em dia não há grande diferença nos preços em relação aos supermercados, e qualidade dos produtos é quase a mesma coisa”, notando que “o mercado vale pelo convívio, por passearmos pelas ruas e encontrarmos sempre alguém para conversarmos. Traz sempre muita gente e agita a freguesia”, destaca.

Há ainda quem aproveite para comprar uma ou duas flores de plástico, ou faça um arranjo. Diz a vendedora que muita gente compra as flores para colocarem nas campas dos entes falecidos, por durarem mais tempo no cemitério. De todas as cores, formas, réplicas perfeitas das flores naturais, desde peónias, girassóis, rosas e malmequeres, gerberas e outras tantas.

E cá vamos, percorrendo as restantes ruas, naquele que parece ser o trajeto escolhido pela maioria, e por isso deixamo-nos ir arrastando pela pequena multidão. Passamos pelo ‘Rei da Faca’, com todo um arsenal de instrumentos de cutelaria exposto, com facas, facalhões, tesouras e cutelos, entre outros utensílios de cozinha.

Já no fim da rua, antes de subirmos de regresso, pela rua da Igreja, temos malas e malotes, de todos os tamanhos e cores. Ouve-se o pregão, alto e bom som, “ó juventude, tudo a 10, à escolha. Vá lá a ver, que ele está a dar. Não é dar, mas é quase!”.

Foto: mediotejo.net
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Por entre esta agitação, conversas cruzadas, discussão de preços e pregões, há quem prefira expôr simplesmente os produtos, e esperar pelo visitante interessado. Desta vez, a montra de cestaria e outros trabalhos em palhinha, está ali à beira da estrada, junto ao entroncamento com a Estrada Nacional 3.

À vinda, ainda encontramos quem venda plásticos, desde alguidares, baldes, cestos e outros recipientes. Do outro lado da estrada, bem carregadinha, está a carrinha do vendedor de melancias. Diz ele que é “docinha, docinha” e  por 5 euros vende duas grande ou três pequenas. Sem grandes complicações, sem balanças. Conta feita.

feirantes_foto_mediotejo.net

E o que diz o feirante? Ainda vale a pena vir vender para Mouriscas?

Maria dos Anjos, com a banca das aves de capoeira, teve alguma clientela ao longo da manhã. Diz que são “quase sempre os mesmos”. Ainda assim, comparando com outros anos, diz que “isto está de rastos, vende-se muito pouco. Mas temos que aguentar”.

Uma forma de combater a crise, que chegou aos mercados tradicionais com o aumento da oferta e preços aliciantes das grandes superfícies, é tornar-se mais disponível e agarrar os clientes que ali vão com frequência. Por isso, tem no cartaz atrás de si o nome e o contacto, para quem quiser telefonar e reservar durante a semana. Depois é só ir até Mouriscas e levantar a encomenda.

Maria dos Anjos refere que “há pessoas que ainda vêm com confiança na qualidade”. Mas isto acontece com pessoas de “mais idade, porque os novos não vêm. Esses vão para os hipermercados e centros comerciais”.

Uma prova de que este comércio de proximidade e local vive do convívio e da fidelização de clientes, é que, conta a vendedora, “aqui há tempos houve mudanças no mercado, e tive de mudar de sítio conforme os outros feirantes, e as pessoas procuram-nos. As pessoas já têm muitos anos de contacto connosco e costumam comprar aqui, estando satisfeitas, procuram-nos novamente”.

“Se não encontrarem naquela semana, procuram na outra. E depois, por conversa e passa-a-palavra, vêem conhecidos e perguntam ‘Olha, onde é que está este ou aquele?’, e acabam por se informar umas às outras”, conclui.

Já José Reis, o vendedor de hortícolas, diz que este tipo de mercado é “à confiança”. As pessoas “pedem para guardar os sacos e as encomendas, e à vinda vêm buscar”. O feirante também diz que este tipo de comércio “está mau”, mas “vai-se correndo e sobrevivendo”, “andando de mercado em mercado”. “Aqui tenho boa clientela”, salientou.

Traz na sua carrinha produtos que sabe que “têm saída”, e aproveita as alturas das feiras e das romarias para tentar aumentar a oferta.

“Temos de fazer por isso, é o nosso ganha-pão”, concluiu.

No último domingo de agosto, o tradicional mercado de domingo dá lugar a uma feira, que se diferencia pelo maior número de feirantes instalados, e por sua vez, maior número de visitantes esperados.

Agora já sabe. Se não conhece, vá dar uma espreitadela. E tente perceber, como nós, a força da tradição, da cultura e do convívio aos domingos de manhã, em Mouriscas.

Deixamos algumas imagens da nossa visita ao mercado. Venha descobrir connosco!

Joana Rita Santos

Formada em Jornalismo, faz da vida uma compilação de pequenos prazeres, onde não falta a escrita, a leitura, a fotografia, a música. Viciada no verbo Ir, nada supera o gozo de partir à descoberta das terras, das gentes, dos trilhos e da natureza... também por isto continua a crer no jornalismo de proximidade. Já esteve mais longe de forrar as paredes de casa com estantes de livros. Não troca a paz da consciência tranquila e a gargalhada dos seus por nada deste mundo.

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