Celeste Caeiro, a mulher dos cravos, recorda momento histórico 50 anos depois. Foto: Exército

Após a cerimónia militar de comemoração do 50º Aniversário do 25 de abril de 1974, foi recriado em Lisboa o momento histórico em que Celeste Caeiro, hoje com 90 anos, distribuiu cravos pelos militares que levaram a efeito a operação para derrubar o antigo Regime, motivando o surgimento da designação “Revolução dos Cravos”.

Filha e neta contactaram o Exército, no sentido de lhe prestar homenagem, e o resultado foi de emoção e alegria, como mostram as fotos disponibilizadas pelo Exército, com centenas de pessoas a assistirem a este momento histórico, enchendo o mesmo local onde, há 50 anos, Celeste ofereceu cravos aos militares que integravam a coluna militar, a caminho do Largo do Carmo, com aplausos durante largos minutos.

A mulher dos cravos

Protagonista central, embora discreta e quase desconhecida, de uma das muitas histórias do 25 de Abril é uma mulher chamada Celeste Caeiro. Tinha 40 anos em 1974 e trabalhava no serviço de limpeza de um restaurante situado no edifício Franjinhas, à rua Braamcamp, em Lisboa.

Esse restaurante, chamado Sir, funcionava no sistema de self-service, uma verdadeira novidade naquele tempo. Tinha sido inaugurado em 25 de abril de 1973 e, portanto, completava um ano de atividade nessa quinta-feira em que os militares resolveram sair à rua para fazer cair o Estado Novo. Para festejar o aniversário da casa, a dona do restaurante pensou em oferecer, nesse dia, uma lembrança a cada cliente que lá fosse: um cravo às senhoras e um porto aos cavalheiros. Mas, por causa da revolução que começara de madrugada, a porta não chegou a abrir e Celeste e as colegas tiveram uma inesperada folga. Os cravos, que se tinham comprado na véspera, deixaram de ser precisos e a patroa, quando mandou as funcionárias para casa, deu a cada uma um molho deles.

Celeste morava no Chiado, num quarto alugado que partilhava com a mãe e a filha. Quando saiu do Sir apanhou o metro para o Rossio e foi depois andando até à rua Garrett. No caminho deparou-se com o aparato dos chaimites que se dirigiam para o quartel do Carmo. Aproximou-se de um deles e perguntou o que se passava. Um dos soldados disse-lhe que aquilo era uma revolução e que iam prender Marcello Caetano, o chefe do Governo. E aproveitou para lhe pedir um cigarrinho. Celeste, que não fumava, respondeu: «Cigarros não tenho, mas, olhe, tenho cravos!» Tirou um do braçado que levava e estendeu-lho. O soldado sorriu e enfiou o cravo, que era vermelho, no cano da espingarda. Os camaradas acharam graça e Celeste deu mais um cravo e outro e outro e foi-os distribuindo até se lhe acabarem, já perto da igreja dos Mártires.

A moda depressa correu por Lisboa fora, o gesto de oferecer cravos repetiu-se em vários sítios e nesse dia as vendedeiras de flores fizeram bom negócio e esgotaram todos os que havia para vender. Ficaram mais vistosos os chaimites, salpicados do vermelho dos cravos que pareciam calar, alegrando-o, um instrumento de opressão agora tornado libertador.

c/António Matias Coelho

A experiência de trabalho nas rádios locais despertaram-no para a importância do exercício de um jornalismo de proximidade, qual espírito irrequieto que se apazigua ao dar voz às histórias das gentes, a dar conta dos seus receios e derrotas, mas também das suas alegrias e vitórias. A vida tem outro sentido a ver e a perguntar, a querer saber, ouvir e informar, levando o microfone até ao último habitante da aldeia que resiste.

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